“ Os males nao cessarão para os humanos antes que a raça dos puros e autênticos filosofos chegue ao poder, ou antes que os chefes das Cidades, por uma divina graça, ponham-se a filosofar verdadeiramente ” (Platao carta sétima, 326 b).
Esta afirmaçao de Platao deve ser compreendida com base na teoria do conhecimento, e lembrando que o conhecimento para Platao tem fins morais.
Todo o projecto político platónico foi traçado a partir da convicçao de que a Cidade-Estado ideal deveria ser obrigatoriamente governada por alguém dotada de uma rigorosa formação filosofica.
O Homem sem temeridade motiva-se a ir mais além. Entra em desafios com confiança e não se preocupa com o pior, o medo pode ser constante, mas o impulso o leva adiante.
Coragem é a Confiança que o homem tem em momentos de temor ou situações difíceis, é o que faz viver lutando e enfrentando os problemas e as barreiras que colocam o medo. É a força positiva para combater momentos tenebrosos da Vida.
A coragem é o uso da razão, a despeito do prazer. Coragem, é ser coerente com seus príncipios, a despeito do prazer e da dor.
Esta pequena frase, foi-me inspirada por uma Mulher muito simples e dotada de uma grande humildade, a quem dedico este artigo, Lúcia Inácio, uma camponesa anónima da etnia sena com título de Rainha, nascida e residente no interiror do Distrito de Mopeia na localidade de Chimbazo. Uma Mulher com quem tive a oportunidade de trocar experiências, e dela colher os seus actos de coragem, jamais vistos ou reportados, de uma Mulher camponesa, muito menos por Mulheres com altos cargos no poder político em Moçambique.
Depois de uma longa ausência nas páginas do Magazine Independente, regresso aos poucos com a minha enorme vontade de escrever, tentando contribuir com uma gota neste grande oceano, que é Moçambique, um País que ainda não é para todos e muito menos para as Mulheres rurais que no seu dia a dia ainda transportam o fardo de uma vida primitiva que não se ajusta as exigências do novo milénio, uma realidade bem diferente da nossa, Mulheres urbanizadas, letradas , académicas e com certo poder nos corredores do poder político que pouco fazem para que estas nossas irmãs atingiam, gradualmente, a ” terra prometida.”
Lúcia Inácio, Mulher de coragem acentuada viveu 3 momentos amargos da nossa historia: o colonialismo, a ditadura do partido unico e guerra civil. Mesmo assim não deixou de lutar pelos seus ideais, resistindo com coerência e frontalidade à tudo aquilo que passou numa sociedade ainda “remota” no interior do Distrito de Mopeia.
A ajuda aos Distritos como polo de desenvolvimento, seria uma aposta certa e justa para o desenvolvimento das Mulheres rurais, ao inves da distribuiçao “gratuita” entre os camaradas.
Não seria este apoio, uma boa forma de criar e promover a equidade do Gênero a partir da nossa sociedade tradicional?
Os vulgo 10 milhões de meticais, com todas as suas vicissitudes, ainda estão à quem do desejo no que concerne ao empoderamento da Mulher rural para que esta, possa na realidade competir ao lado do Homem na sociedade tradicional.
A mulher rural por si só, já enfrenta dificuldades no ambito cultural, socio –economico. A falta de estrategias dinámicas, falta de imparcialidade, partidarização na distruibiçao destes recursos do Estado de forma equitativa, colocam a Mulher rural numa vivência e convivência do século passado, ainda bem longe do novo milénio.
Quantas Mulheres a título de exemplo com capacidade de liderança fazem parte dos ditos Conselhos Consultivos?
Lúcia Inácio, é uma mulher de coragem é oposicionista com suas convicções num meio “imprópio”! Ela, dificilmente terá a ajuda do Estado, por via dos que decidem, para que ela se torne ainda mais forte e um exemplo a seguir pelas aldeias espalhadas pelo País.
Estamos perante mais um 7 de Abril. O desejo de consenso, e a não partidarização das festividades alusivas à Mulher Moçambicana continua a ser o nosso apelo neste contexto multipartidário.
Neste mês em que se comemora mais um dia alusivo a Mulher Moçambicana, temos orgulho de sermos um dos poucos Países, senão o único do Mundo, que honra a Mulher com um feriado Nacional. Neste momento é natural fazermos reflexões, de forma mais diversas, tendo como ponto focal chamar a atenção a sociedade e a quem de direito sobre as enormes dificuldades e desigualdades que a Mulher Moçambicana ainda enfrenta neste novo Milénio. E também, porque não, reconhecer e elevar algumas delas, aquelas anónimas, esquecidas, marginalizadas e excluídas, como exemplos a oferecer a nossa sociedade heterogenea?
Depois de ter tido o privilégio de recordar algumas figuras femininas de âmbito Nacional que fizeram parte dos objectivos da luta de libertação Nacional tais como a Dra. Joana Simeão (uma das poucas, senão a única mulher de raça negra, na altura, académica) e a professora Celina Simango, outra exemplo endelével da historia recente do nosso país, no contexto actual, recordamos no ano passado a Ministra do Trabalho Helena Taipo pelos seus actos notóricos de coragem e de um raro brilho no Executivo de Emilio Guebuza.
Neste 7 Abril elegemos uma simples Mulher que vem de uma das camadas mais desfavorecidas do País real, a zona rural, onde pelas estatísticas, reside mais de 50% da Mulher Moçambicana que, muitas vezes continuam a carregar o maior fardo no seu dia a dia e é representada. Uma Mulher, muitas vezes traida em conferências internacionais por Mulheres de salto alto que carregam em suas mãos pastas de couro, vestidas de marcas como George Armani, e perfumadas com marcas francesas, portadoras de relógios das melhores marcas internacionais, ornamentadas de Ouro e munidas de pesados envelopes de ajudas de custos provenientes do erario público moçambicano. As verdadeiras camponesas, Mulheres que na verdade minimizam a pobreza no seu dia a dia, essas, nunca se fazem presente nessas conferências, contrariamente com o que acontence com alguns países da America Latina e Asia que contemplam nas suas listas, para as conferencias internacionais as camponesas como porta-vozes reais dos problemas que a Mulher enfrenta no campo.
Do anonimato
Lucia Inácio, mãe de 5 filhos, casada com o régulo Chimbazo, não sabe dizer em que ano nasceu, apenas sabe dizer que se tornou Mulher quando se afundou um batelão com tropa Portuguesa nos anos 60, vindo da Província de Sofala, quando faziam a travessia no rio Zambeze.
O primeiro encontro com seu marido, foi quando foi visitar o seu tio Cofe Nkolomola na zona de Chimbazo.
Recorda-se que se casou no tempo de Caetano (suas palavras) com Marcelino, régulo Chimbazo.
Sua primeira filha nasce na vila de Mopeia, recorda com alegria a limpeza do hospital e a boa dieta que recebeu após ter dado a luz, de ter sido tratada com carinho por “Muzungo” (branco). Andou na escola de Caetano, penso que se refere a Marcelo Caetano (Presidende do Conselho de Ministros após a queda de Salazar), onde ferquentou até a segunda classe do ensino primário.
Em 1975 com a chegada da Frelimo, recorda-se com tristeza das machambas do povo, a obrigatoriedade em viver nas Aldeias Comunais, deixando para trás os seus pertences privados. Lúcia participou no cultivo de milho e arroz entre outros cereais nas zonas baixas do Distrito de Mopeia, nas ditas machambas do povo. Tudo o que se cultivava, segundo ela, entregavam a Frelimo, e estes prometiam que, com a venda dos produtos, o dinheiro voltaria para o povo, para compra de tratores, carros, bicicletas, charruas, capulanas entre outros produtos de primeira necessidade que existiam nas cantinas espalhadas pelas areas rurais. Devido a falta de cumprimento das promessas pelo regime monopartidário da Frelimo, ela e muitas outras camponesas abandonaram o projecto em finais de 1977.
Recorda-se ainda de que na altura dormiam nas bichas para comprar capulanas e muitas vezes saiam sem uma para se cobrirem e que que só as filhas e mulheres dos secretários da Frelimo é que se beneficiavam dos bens essenciais naquele pequeno mundo onde nasceu e cresceu.
Lucia começa a sentir aí a mudança do regime, não entende, mas consegue ver a diferença entre o regime colonial e a forma autoritária compulsiva da governaçao da Frelimo depois 1975.
Conta que, a partir dos finais dos anos 70 e 80, as mulheres ja não tinham capulanas nem roupas para se vestirem, tinham que ir ao mato e cortar um tipo de pau que se chama musassa para fazer de roupa que davam o nome de mutcheka que durava cerca 2 semanas para cobrir o corpo. Como não tivessem nada para se cobrir, ficavam em casa e eram os homens que iam ao mato cortar para elas se cobrirem mais 2 semanas.
Nao tinham direito ao privado, não podiam ser donas de nada, era crime condenável uma mulher possuir algum bem, recorda Lucia.
Continua...
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