Notável pela discrição foi a visita, na semana passada, a Maputo, do antigo sub-secretário norte-americano para os assuntos africanos, Chester Crocker. Da sua missão, pouco ou nada transpareceu.
Apesar de não haver confirmação oficial, em Moçambique a deslocação foi largamente entendida como tendo sido desejada pelo Presidente norte-americano, Barack Obama, para pressionar Maputo no sentido de uma solução pacífica para o conflito que opõe o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), ao maior partido de oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO).
Para além de se encontrar com o Presidente Armando Guebuza, Crocker falou ainda com os mediadadores moçambicanos no conflito, entre os quais Dom Dinis Sengulane, bispo anglicano da Diocese dos Libombos e presidente do Observatório Eleitoral - uma parceria de oito organizações da sociedade civil moçambicana. A DW África falou com Dom Dinis sobre esta visita.
DW África: Qual foi o resultado do encontro com o ex-diplomata norte-americano Chester Crocker?
Dinis Sengulane (DS): Foi um encontro que tivemos, eu e o professor Lourenço do Rosário, por causa do nosso envolvimento na busca de reconciliação entre nós moçambicanos. Achamos que as nossas conversas nos deram um maior ímpeto naquilo que estamos fazendo.
DW África: Chester Crocker também se encontrou com elementos do Governo moçambicano ou da RENAMO?
DS: Eu sei que se encontrou com o chefe de Estado. Não tenho informação de se ter encontrado com a liderança da RENAMO. Acho que não foi por falta de vontade da parte dele, mas talvez da própria logística. As condições podem não ter sido tão favoráveis que permitissem um encontro com eles.
DW África: Na sua opinião, seria uma vantagem uma maior pressão da comunidade internacional, mais aberta e mais pública, ou, pelo contrário, ela seria contraproducente?
DS: Eu acho que isso não ajudaria muito. Acho que esse é um problema que os moçambicanos devem resolver, devem fazer pressão de várias maneiras. O envolvimento da comunidade internacional devia ser cuidadosamente medido. Reconheço que Moçambique não é uma ilha e está sempre aberto a cooperar com outras instituições de boa vontade nacionais e internacionais.
Mas acho que um envolvimento direto como quem diz: "nós vamos aí mostrar-vos como é que se resolvem os problemas", pode não ser prudente neste momento. Mas aquilo a que se chama "lóbis", isso sim, pode ser feito silenciosamente e ajuda mais do que aqueles que vêm com muito barulho.
DW África: Poderá dizer-se que esta viagem de Crocker a Maputo é indicativa de uma pressão crescente da comunidade internacional para que se encontre rapidamente uma solução pacífica para o conflito?
DS: Moçambique é um país que tem muitos amigos. Não me admira nada que, ouvindo dos problemas que estamos enfrentando, haja intervenientes, não diretos na solução, mas, pelo menos, pessoas que podem intervir com os intervenientes nacionais.
DW África: Como está envolvido neste processo de negociações de paz, pode-nos dizer como avançam as negociações diretas entre a RENAMO e o Governo?
DS: As negociações não foram, por assim dizer, postas de lado. Nunca foram abandonadas. Só que existem impasses infelizes, que eu considero desnecessários, e que fazem com que o processo negocial seja muito lento. A própria maneira como foi concebida este processo, foi como não se tratasse de um assunto urgente. Um encontro que só se realiza às segundas-feiras fazia sentido na altura em que não havia derramamento de sangue.
Mas quando as pessoas morrem, negócios nas cidades ficam prejudicados, a educação e a saúde são afetadas, dizer às vítimas, aos enlutados das pessoas que foram mortas, ou à pessoa cujo camião está a apodrecer porque não pode fazer a viagem, dizer-lhe que "aqueles que vão resolver o teu problema vão reunir-se na segunda-feira", não revela o nível de urgência que alguns de nós achamos que este assunto merece.
DW África: Nessa perspetiva como vê a continuação do processo? Está otimista?
DS: Não sou otimista, nem pessimista, sou um realista. Há pessoas que acham que a solução tem que ser militar. E estão a procurar fazer mais barulho do que a voz do diálogo.
O meu realismo leva-me a dizer que precisamos de insistir muito, porque é capaz de haver obstáculos que devem ser removidos. São obstáculos desnecessários. É desnecessária toda esta intervenção de caráter militar, porque o processo do diálogo estava bem encaminhado.
Fonte: Deusche Welle - 28.11.2013
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