quinta-feira, janeiro 29, 2015

Investigador: Crise política cria dupla administração territorial no centro

O investigador Victor Igreja, docente da Universidade de Queensland, da Austrália, considerou que a tensão política entre a Renamo e o Governo  está a gerar um fenómeno de dupla administração territorial no centro do país.
Victor Igreja conduziu um trabalho de pesquisa com as comunidades da região da Gorongosa, palco de intensos confrontos entre o braço armado da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) e as forças de defesa e segurança do país, durante a recente crise militar, que se encontra suspensa desde o início de Setembro.
Ainda que de forma informal, o investigador entende que a região está a viver um fenómeno de dupla administração territorial, dado o aquartelamento dos homens da Renamo no local, que se encontra cercado pelas forças governamentais.
"Voltamos à realidade de 1992, em que há praticamente dupla administração", afirmou o académico, citado pelo diário electrónico MediaFax, referindo-se ao período final da guerra civil.
Esta situação, sublinhou, está a fomentar o aumento da criminalidade na região e o ressurgimento dos "homens catana", que, não pertencendo às forças governamentais ou da Renamo, se aproveitam da existência de um hiato administrativo para cometerem crimes nos dois lados da barricada.
"Os malfeitores aproveitam-se das oportunidades que têm no terreno. Eles têm conhecimento de que ninguém transpõe o perímetro de segurança do outro [exército e braço armado da Renamo]. Estamos perante o mesmo cenário de 1992", insistiu o docente.
Depois das eleições de 15 de Outubro, Moçambique atravessa novamente um período de instabilidade política, com a Renamo a não reconhecer legitimidade ao actual Presidente, Filipe Nyusi, eleito pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), no poder desde 1975.
Os deputados e membros das assembleias provinciais que a Renamo elegeu ainda não tomaram posse, enquanto o líder do partido, Afonso Dhlakama, ameaça criar a região autónoma do centro e do norte, nas províncias em que obteve mais votos do que Filipe Nyusi, uma proposta rejeitada pelo executivo e pela Frelimo.
Em Maputo, as delegações da Renamo e do Governo continuam a negociar a implementação do acordo de cessação de hostilidades, mas a desmilitarização do braço armado do partido e a sua integração nas forças de defesa e segurança do país permanece por concretizar.
O impasse, segundo o investigador, está a provocar um ambiente de tensão entre as comunidades, afectando os serviços educativos e de saúde locais e gerando uma vaga de deslocados, muitos dos quais refugiados nas matas com medo do ressurgimento dos conflitos armados.
Victor Igreja considera por isso urgente a intervenção do Presidente moçambicano e avisa que a sociedade não vai "tolerar o seu silêncio" por muito mais tempo.
"Neste momento, a única resposta sensata é um frente-a-frente entre as lideranças do Governo e da Renamo para se ultrapassar a crise prevalecente", afirmou o docente, considerando que o "ponto principal da agenda" deste encontro deve ser a "inclusão das forças armadas da Renamo no aparelho do Estado".


Fonte: LUSA – 29.01.2015

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