CRÓNICA
Por: Gento Roque Cheleca Jr., em Bruxelas
Não pode haver mexidas frutíferas quando o que se pretende mudar são as “moscas” e não a “lixeira”. Numa sociedade de esperanças adiadas, de um futuro melhor mutilado, a remodelação governamental anunciada não passará de uma bênção para os distraídos terem agenda quando o essencial é contornar a hemorragia da partidarização do Estado. Excerto de uma conversa com os meus sobrinhos.
É a segunda vez no espaço de dois anos que intervenho contra as “mexidas” do senhor Presidente da República, Armando Emílio Guebuza. A primeira foi quando da exoneração de Ivo Garrido do Ministério da Saúde, e permutou José Pacheco do Ministério do Interior para o da Agricultura, actualmente em exercício. Nessa altura, Moçambique já era um laboratório de ensaio político para acomodar os interesses da Nomenclatura dominante. Ficou claro que o país estava a ser governado por um piloto automático descomandado.
A verdade é que, com a saída prematura do Dr. Ivo Garrido do pelouro da Saúde, os hospitais do país entraram em jejum prolongado mormente no que toca à qualidade. O pelouro da Agricultura, que já vinha deficitária no consulado de Joaquim Chissano, tem sido um autêntico túmulo de projectos falidos como a “Revolução Verde”, etc.
Sem que houvesse manifestações populares, que por duas vezes obrigaram o governo a reunir-se de emergência em Conselho de Ministros, o PR voltou a mexer no seu executivo, uma semana depois da realização em Pemba do X Congresso do partido Frelimo.
Congresso que, na minha perspectiva histórica, fecha as portas aos camaradas de Nachingueia (cuja idade já se encontrano poente) de chegarem ao poleiro ao mesmo tempo que fortalece as guarnições da actual direcção do partido.
A troca de Aires Ali por Alberto Vaquina, como primeiro-ministro, levanta sérias dúvidas sobre a “santidade política” de quem inequivocamente tem vindo a afirmar publicamente o desejo de “arrumar as botas”. Mas não o fará, na minha maneira de ver, sem que antes estejam efectivamente capitalizadas as garantias de que mesmo na “reforma” continuará a governar a nação moçambicana.
Analisando superficialmente a película da governação do antigo primeiro-ministro, Aires Ali, pode-se concluir que a Frelimo reforçou-se interna e externamente.
Conseguiu, aquilo que é frequente em países marxistas-leninistas, partidarizar o Estado e aniquilar a oposição; externamente reatou o enlace entre o partido e os países berços do comunismo.
Portanto, Aires Ali é a vergôntea preferida da actual Nomenclatura da Frelimo, tanto é que a sua exoneração não passa de uma jogada dos bastidores para entreter os incautos e fabricar agenda para a opinião pública quando na verdade a intenção é outra. A exoneração de Ali deixa transparecer que este será o candidato da Frelimo nas eleições de 2014 e talvez o próximo presidente da República se a oposição continuar a nos brindar com a desorganização organizada.
De resto, tem sido hábito o partido Frelimo lançar os seus candidatos à presidência da República dois anos antes das eleições e nos próximos dias se não houver inconveniência esta hipótese será confirmada pela Comissão Política.
Alguns analistas questionam o arcabouço político de Alberto Vaquina.
Pessoalmente, sem exagero nenhum, nunca tive a menor dúvida que Vaquina receberia das chefias da Frelimo um prémio pela excelente gestão dos negócios da Nomenclatura na província de Tete.
Se existe algo que a Frelimo é coerente e implacável na sua actuação é na recompensa de quem a obedece. O então governador de Tete, Alberto Vaquina, soube ler e interpretar correctamente a epístola marxista-leninista da Frelimo. Por um lado, tapava os ouvidos aos gritos da população da Cateme e, por outro, abria os olhos aos interesses do seu partido.
Havia fortes probabilidades de ser Felismino Tocoli o substituto de Aires Ali, mas este revelou cansaço na véspera da distribuição dos nacos. A imprensa em Nampula o acusou de ter fornicado com a esposa do seu subalterno. Apesar de a poligamia ser um acto normal na Frelimo, a ser verdade a consumação do acto, Tocoli não escapou à balança dos que no seu partido são contra este tipo de práticas. Ao contrário de outras actividades, salvo por força maior, na política a aposentação de um dirigente pode acontecer na adolescência da sua profissão.
Após anunciada a mexida governamental um grupo de amigos quis saber de mim o significado da nomeação de FIM – Francisco Itai Meque, antigo governador da província da Zambézia, ao cargo de vice-ministro da Educação. De facto, aquando da minha passagem pelos blogues, vaticinei que FIM não terminaria o mandato como governador daquela província. Eram frequentes os actos de arrogância e de abuso de linguagem contra os seus subalternos e a difícil convivência política com a oposição.
FIM não conseguiu tirar a Zambézia da sonolência económica, não foi capaz de reactivar as bobinas adormecidas da província que em tempos foi celeiro do país.
Inclusive, permitiu que a oposição (MDM) ganhasse as eleições intercalares em Quelimane. Na verdade, eu não sei se FIM governou a Zambézia ou se a pobreza que convive com a maioria dos zambezianos governou FIM?
Espanta-me pois que o presidente da República tenha escolhido exactamente este governante para o cargo de vice-ministro da Educação. É verdade que cabe ao treinador da equipa escolher os seus pupilos, mas também é legítimo que os adeptos protestem. Porque são estes, os adeptos, que motivam a equipa e a alimentam económica e financeiramente. E o meu protesto é este. Se FIM não foi capaz de tirar a Zambézia da penúria que fará agora que é vice-ministro de um ministério em avançado estado de coma?
Não é nada pessoal quer para um quer para outro exemplo. Contudo, vejo com agrado os trabalhos que estão a ser realizados por Jorge Ferrão, reitor da Universidade Lúrio (UniLúrio). Este sim merecia, na minha opinião, ocupar o cargo de ministro ou vice-ministro da Educação. É um profissional de mão cheia e exemplar, sabe transformar as dificuldades em desafios e as vence em K.O.
Recentemente estive em Nampula, de férias, ali pude ver de perto e com alegria as conquistas alcançadas pela UniLúrio. O que me habituei a ver nas universidades europeias, nomeadamente, a organização, o trabalho, a disciplina, a objectividade, a ciência e o conhecimento, a qualidade, o requinte, a beleza, a arte e o património, etc., tive o prazer de ver e em dose dupla na UniLúrio. Por ser um sucesso colectivo, colectivamente endereço os meus fervorosos cumprimentos à UniLúrio. Penso que por hoje já não tenho mais espaço para continuar a falar da remodelação governamental e da exclusão da oposição neste e noutros governos, que acontece poucos dias depois do Acordo Geral de Paz.
Ainda assim, que me perdoe o editor do Wamphula Fax por tornar mais longa esta crónica. Quero então dizer isto. Que as próximas mexidas no governo sejam contempladas à juventude do país. O país está grávido de jovens cientistas, economistas, historiadores, poetas, engenheiros, escritores, etc., capazes de dinamizar com rapidez a economia do país e estancar a hemorragia da corrupção, da pobreza, do crime, etc. É altura de injectar sangue novo no governo, de projectar o país nas grandes competições da vida. Só assim é que Moçambique será melhor para todos.
“Kochikuro” (Obrigado).
Fonte: WAMPHULA FAX – 11.10.2012
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