quinta-feira, fevereiro 10, 2011

Ricon de malas aviadas?

Por: Noé Nhantumbo, Beira

Linha de Sena, Linha Beira-Machipanda parece esconderem algo mais…

A controvérsia aberta entre indianos e moçambicanos sobre a eficiência e o cumprimento dos contractos relativos a reabilitação da linha de Sena e a exploração da linha Beira-Machipanda, na Região Centro do País, merecem a atenção de todos devido a sua importância para a economia nacional e não só.

Partindo de decisões essencialmente forçadas pelo Banco Mundial (BM) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), optou-se pela privatização da operação ferro-portuária no País e isso tem se revelado um erro pois de tal negócio não se tem logrado os dividendos esperados. Queixava-se o anterior PCA dos CFM, Eng. Rui Fonseca, que a maioria dos concessionários não estava cumprindo nem pagando o que deles se esperava. O negócio é bom e foi oferecido por uma bagatela aos actuais concessionários. Decerto que muito dinheiro trocou de mãos ao longo do processo e agora que novas comadres, que prometem muitos fundos se apresentam no horizonte, há que através de alguma justificação afastar este ou aquele concessionário. Dá para perceber que se está jogando relativamente escuro senão vejamos: 49% do capital da concessionária pertence exactamente aos CFM. Que fez este parceiro para salvaguardar o contracto ao longo destes anos todos?

O que até tem sido dito pelos responsáveis e figuras moçambicanas ligadas ao assunto são pedaços e retalhos que não permitem compreender a natureza e a dimensão do problema. Se é sobejamente conhecida a incapacidade dos concessionários em cumprir com as cláusulas contratuais porque não simplesmente rescindir o contrato como fizeram os tanzanianos com a mesma companhia? Dirão que é preciso dar tempo e precaver aspectos legais para não permitir que algum buraco nos procedimentos acabe por prejudicar os interesses do País. Certo. Mas será somente isso?

Alguma teoria de conspiração aponta para haver “gato escondido” nesta história que já se arrasta faz tempo.

Se de acordo com o PCA dos CFM a concessionária já acumula 15 meses de atraso que mais resta fazer? Continuar a espera que aquela empresa se decida a cumprir?

Havia que assinar um contrato e a escolha foi a RICON mas se esta é incapaz de fazer o que foi combinado porque tanta hesitação em dizer basta, retirem-se, acabou o negócio, continuamos todos amigos, mas os moçambicanos precisam de ter estas duas linhas operacionais e produzindo dividendos importantes para a solução dos diversos problemas existente.

Hoje e numa perspectiva de mais uma vez se conseguirem contrapartidas excelentes e porque uma nova realidade se apresenta com as “descobertas” do nosso “ouro negro” os indianos parecem condenados a levar um pontapé no traseiro.

Numa equação que envolve somas avultadas de dinheiro e em que os negociadores de ontem não são os mesmos de hoje é preciso olhar com atenção para o quadro actual se quisermos entender alguma coisa do que acontecerá nos tempos mais próximos e toda a estrutura ferro-portuária moçambicana.

Deseja-se e é sobretudo vital que exista capacidade dos intervenientes em todo processo negocial de agir com responsabilidade e consequência. Da parte moçambicana, nomeadamente CFM e Ministério dos Transportes e Comunicações, importa que se analise todo o dossier com profundidade e competência, que se observem todas implicações legais e possíveis problemas que uma decisão de rescisão possa acarretar para o País.

Não se pode cair em armadilhas legais e levantar a possibilidade de deteriorar as relações de cooperação com um actor importante na esfera económica e financeira internacional que é a Índia.

É preciso, com base em factos irrefutáveis, provar que a RICON não cumpriu e só por isso é que se está rescindindo o contrato.

É certamente claro para os indianos que o dossier está ficando mal parado para eles desde o surgimento de gigantes como a Vale do Rio Doce e agora a Rio Tinto. Que estas companhias pretendam controlar e determinar toda a estrutura de preços relativos ao transporte do carvão para o Porto da Beira parece óbvio. Que isso possa constituir um motivo de peso para que exerçam pressão no governo moçambicano não é de duvidar. Aquela escolha de Lula em se despedir da presidência nos brindando com uma última visita não deve ser colocada fora do baralho. Se a Boeing utiliza a Casa Branca para vender aviões à China não é estranhar que a Vale utilize Brasília para fomentar os seus negócios no mundo.

Para os moçambicanos e especialmente para os que residem nas áreas de influência destes dois grandes empreendimentos o mais importante é que está a frente deste assunto não se esqueça de acautelar os seus interesses.

É preciso aprender a lição dos mega-projectos que pouco ou nada deixam no país senão poluição ambiental, buracos. Os poucos projectos no âmbito da responsabilidade social são uma ninharia que não merece ser considerada contrapartida quando avaliados os lucros das corporações envolvidas em mega negócios no país.

Parte significativa de tudo o que seja produzido e transportado deve significativamente beneficiar os moçambicanos.

Não queremos continuar a receber amendoins e tremoços enquanto os accionistas desta ou aquela corporação internacional se banqueteiam.

Tecnicamente a decisão de rescindir o contrato com a RICON já há a muito deveria ter sido tomada.

Mas como está se tornando claro o dossier é complicado e apresenta cenários que podem acabar por prejudicar Moçambique. Como vai reagir a Índia a esta decisão e como vai ser a tal cooperação Sul-Sul a partir daí? A escolha não é fácil e mesmo aquela visita do PR e os USD prometidos pela Índia não superam a avalanche político-diplomática e financeira de Brasília. Joga-se duro e vamos esperar para ver quem ganha. De uma coisa estamos certos é que o dossier foi tratado de forma caseira e pouco profissional desde o princípio. Da mesma que se retalhavam interesses públicos noutras esferas houve pressa em cumprir orientações ou recomendações e também se aproveitou amealhar alguns benefícios. Agora que a sopa está “queimada” todos os interlocutores de ontem vão dizer que não sabem de nada ou que já tinham dito que os indianos não tinham capacidade de realizar as obras. Um déjà?

Tanto a linha de Sena como a de Machipanda com os moçambicanos nos CFM funcionava e com lucros…

Fonte: O AUTARCA – 08.02.2011

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