Decide ministro Pacheco em plena Assembleia da República
Deputado Luís Boavida defende Procurador Geral da República e considera inconstitucional o actual enquadramento da Polícia de Investigação Criminal
(Maputo) O Procurador Geral da República(PGR), Joaquim Madeira, levantou, na Assembleia da República, a semana passada, no seu informe anual à nação, preocupações em relação à subordinação actual da Policia de Investigação Criminal (PIC) ao Ministério do Interior.
A Procuradoria Geral da República que a Constituição define como “garante da legalidade” quer que a PIC tenha dupla subordinação. Joaquim Madeira disse-o sem rodeios. Lançou sérios avisos à navegação. Disse que há necessidade da PIC subordinar-se ao Ministério Público(MP) em termos funcionais e operativos na fase de instrução preparatória, ainda que Joaquim Madeira concorde que continue a haver subordinação ao Ministério do Interior mas apenas em termos de enquadramento orgânico.
O debate estava no vácuo, a aguardar resposta de alguém do MINT com capacidade para o fazer. Ontem, nas interpelações ao Governo, no Parlamento, o deputado Luís Boavida, eleito para o mais alto órgão legislativo do País pelas listas da Renamo-UE, quis que esta questão fosse aclarada.
O titular da pasta do Interior no Governo dirigido pela dupla Guebuza-Luísa Diogo, o agronómo José Pacheco, de viva voz e para que ninguém duvide, não esteve para conversas e disse de sua justiça na casa que produziu a Constituição da República: “É ponto assente que a PIC deve permanecer no Ministério do Interior”. Nem mais uma palavra.Tom firme. Ficou determinado. Ponto final nas discussões. Deputados para quê?
O ministro Pacheco sustentou a sua tese, alegando suporte constitucional. Disse que a PIC “é parte integrante do serviço público, do governo”.
O deputado da oposição Luís Boavida, um dos obreiros do novo texto Constitucional não se ficou e insurgiu-se contra a posição de Pacheco. Ele considerou de intromissão política no funcionamento da justiça a “sentença” de José Pacheco e passou a defender com unhas e dentes a tese do PGR Joaquim Madeira. “O argumento do Procurador Geral foi com base no artigo 236 da Constituição da República, e o sr. ministro está à procura de suporte nos artigos 254 e 255 que nada referem sobre isso”, disse Baovida.
Onde Pacheco “entrou no mato”
O artigo 236 da Constituição diz: “ Ao Ministério Público compete representar o Estado junto dos tribunais e defender os interesses que a Lei determina, controlar a legalidade, os prazos das detenções, dirigir a instrução preparatória dos processos-crimes, exercer a acção penal e assegurar a defesa jurídica de menores, ausentes e incapazes” (N.A.: o sublinhado é nosso). Acontece que para o Ministério Público exercer esses preceitos constitucionais entende-se que quem deve colher matéria para tal é a PIC e, consequentemente, deve agir em conformidade com a perspectiva do Ministério Público, daí entender-se ser pertinente, funcionalmente, que seja o Ministério Público a dirigir e orientar as acções a serem desenvolvidas pela PIC.
Após esta demonstração, mais clara que a água da fonte da Namaacha, Boavida recomendou ao ministro do Interior, em tempo de retórica, que ele “não evoque a Constituição para nos confundir. Essa mentira é por conveniência política”. Para exemplificar o que ele entende ser a “conveniência política” de Pacheco, exemplo, o deputado pela Renamo citou o “processo autónomo” do “Caso Carlos Cardoso”, em que o principal arguido não preso (já foi indiciado), Nyimpine Chissano, continua em liberdade.
Restou a Boavida, por parte da sua bancada, apenas o consolo de uma salva de palmas. Da parte da bancada do partido da maioria parlamentar, Frelimo – afinal era o governo Frelimo que estava no pódio a ser inquirido – o silêncio foi nota dominante.
Boavida tinha acabado de ser por demais clarividente. A lógica segundo a qual Moçambique é um “Estado de Direito”, como tudo indica, é um debate adiado. E nem sempre parece que Moçambique é de facto um País em que “ninguém está acima da Lei”.
Joaquim Madeira bem pode pregar no deserto e os deputados bem podem continuar a sonhar que têm algum peso no contexto do ordenamento e da legalidade. Ontem ficou provado que isto é tudo uma grande ficção (ou uma grande fixação!...)...
Ao PGR, fica o consolo da solidariedade do deputado Luís Boavida. É que Pacheco foi demasiado realista: “É ponto assente que a PIC deverá permanecer no Ministério do Interior, autónoma e capacitada de meios”. Rezam os manuais da democracia erguida na Grécia Antiga, que a separação dos poderes executivo, judicial e legislativo, é a receita para a construção de um Estado de Direito, mas isso é lá pela Grécia...
(Luís Nhachote)
Fonte: Canal de Mocambique (2006-04-21 07:07:00)
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