terça-feira, fevereiro 27, 2007

Voto de confiança em Filipe Couto!

Por Edwin Hounou

O Presidente da República, Armando Guebuza, indicou, a 23 de Fevereiro de 2007, o padre Filipe Couto, antigo reitor da Universidade Católica de Moçambique, UCM, ultimamente, assessor do ministro da Educação e Cultura, Aires Aly, para dirigir a Universidade Eduardo Mondlane, UEM, em substituição de Brazão Mazula, no cargo desde 1995.
Achamos salutar a decisão presidencial em ter procurado uma individualidade fora dos quadros da UEM para introduzir as mudanças requeridas à instituição.
Couto não tem, à partida, compromissos conhecidos nem alianças internas confirmadas, então, está de mãos livres para trabalhar.
Endereçamos nosso voto de confiança condicionado a Couto. Temos que esperar por cerca de 10 meses para ver qual vai ser seu desempenho. Até lá, não faremos qualquer juizo de valor. Seguiremos, escrupulosamente, o princípio segundo o qual ‘a prática é o critério da verdade’.
Couto tem credenciais intelectuais e de gestão universitária suficientes para conferir a UEM outro visual. Enquanto reitor da UCM teve a coragem de levar a faculdade de agronomia para Cuamba, em Niassa, onde muitos têm medo até de ouvir falar. Há informações que sugerem que lá se formam técnicos com o saber fazer assumido.
A faculdade de medicina, na Beira, tem seus estudantes em unidades sanitárias, de onde se pode inferir que sairão médicos à altura das necessidades. Dizem as fontes que tal estratégia foi desenhada por Couto. Não temos motivos para duvidar das suas capacidades.
Apelamos ao novo reitor para re-estruturar, com profundidade, a UEM e terminar com a percepção de que se transformou em nicho do partido no poder onde dominam a corrupção, promiscuidade, compadrio e intolerância política.
São conhecidos casos de dois docentes, membros do Parlamento pela bancada da Renamo, que foram afastados das suas funções na UEM, enquanto seus colegas têm um tratamento diferenciado, por professarem a ideologia corrente nos corredores oficiais e grandes palácios.
O sofisma de Mazula era de que, sendo da oposição, não teriam tempo para se ocupar da academia. Mas, membros da Frelimo acumulam funções, estudam fora do País, por largos anos e com salários em dia. Um é vereador, outro, vice-director do STAE.
Mazula diz que isso não perturba a academia. Couto tem a missão de dar a volta a este pensamento estereotipado instalado na UEM.
A UEM é uma academia, nela devem ser discutidas ideias e técnicas mais avançadas da Humanidade, não um campo de batalha onde partidos políticos rivais se digladiam pela hegemonia política da instituição.
A universidade é um laboratório de ideias modernas e não uma célula de partidos onde os discordantes são condenados ao ostracismo ou atirados à fogueira, como mandavam os princípios da santa inquisição.
Encorajamos a Couto a iniciar o combate para reverter a imagem da UEM, desarticulando-a das influências partidárias. Esperamos que Couto jus faça a confiança nele depositada pelo Presidente.
A Tribuna Fax (2007-02-27)

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Padre Filipe Couto

O homem do Presidente em frente da UEM

(Maputo) O Presidente da República, Armando Guebuza, nomeou o Padre Filipe Couto para o cargo de Reitor da Universidade Eduardo Mondlane. O acto do Presidente da República insere-se no âmbito das suas competências consagradas no Artigo 160 da Constituição da República. O estatuto da Universidade Eduardo Mondlane diz que compete ao Conselho Universitário recomendar ao PR três individualidades a serem consideradas para o cargo de Reitor. Neste caso, o Presidente não atendeu a nenhum dos nomes recomendados.
Esclarecimentos disponíveis indicam que a competência do Presidente da República insere-se “na direcção da acção governava”, para se concluir que o Reitor deverá ser da confiança do Presidente da República em virtude de participar na acção ou no sistema global de governação do país. O Artigo 160 da Constituição começa assim, no domínio do Governo.
É dessa disposição Constitucional que se afere que a competência fixada não está subordinada a qualquer condição. É prerrogativa do Presidente da República nomear alguém da sua confiança para o cargo de Reitor da UEM.
Mas os esclarecimentos sobreeste acto do Presidente da República não se esgotam aqui, gostaríamos de receber, para publicar, outras interpretações daqueles dispositivos legais.
Enquanto isso, recordemos o que pensa o Padre Couto sobre a academia e os intelectuais, numa transcrição de parte da entrevista que concedeu, anotransacto, à jornalista Paola Roletta para o Savana.
Acha possível uma academia independente?
Depende muito daquilo que se entende com a palavra independente. Na prática, eu não creio, porque todos nós estamos ligados a certos interesses, os nossos próprios ou daqueles que nos suportam, família, grupo de pertença, religião, partido.
A academia deve respeitar o bem comum, dar voz a todas as partes da sociedade ou não?
Deve-se procurar o bem comum, porém o bem comum nunca é claro nas sociedades. Vamos pegar Moçambique, por exemplo. O que é um bem comum para Moçambique neste momento? Um poderia dizer que o bem comum é que todos tenham boa saúde, outro diria que todos tenham boa saúde, outro diria que todos possam ir à escola, outro que todos tenham emprego... Não há verdadeiramente ciência que faz com que todos estejam de acordo com ela. A universidade sempre foi protegida por pessoas ou por sociedades. Na idade medieval eram reis ou príncipes que ajudavam a universidade.
O que deve fazer um académico?
É conseguir ser honesto e dizer, por mais que eu queira ser intelectual independente, eu tenho que procurar a protecção daqueles que eu acho que estão na linha, que eu gosto, que eu quero. Talvez quando tinha trinta anos pensava que podiaexistir um intelectual livre, mas não é assim. Nós estamos sempre condicionados por aqueles que nos dão o pão de cada dia. Deve—e procurar coligação com as pessoas que estão na minha linha. A verdade numa pessoa humana é relativa, quer dizer ninguém consegue ter toda a verdade. Por isso eu acho que é preciso ter uma academia capaz de raciocinar e dizer com quem é que eu vou trabalhar neste momento, qual é a posição que eu vou tomar na minha pesquisa. Um jornalista que quer fazer jornalismo em Moçambique, que vem de uma faculdade de jornalistas, qual é a posição que vai tomar no contexto de Moçambique, com a história de Moçambique, na SADC, na África, depois com o mundo global.
Mas o intelectual, o homem da academia, é considerado o farol no caminho para com a perfeição que todos nós fazemos na nossa vida, não é isso?
É. sim. Talvez eu não esteja a satisfazer com a minha resposta, porque não lhe estou a dar uma resposta clara, sim ou não. Não lhe vou dizer que a academia pode ser livre e imparcial, mas, sim, que ela deve procurar ser imparcial, porque a verdade é sempre limitada. Mesmo assim, deve procurar servir a sociedade, a maioria, especialmente quando as questões afectam o bem comum, quando são questões muito relevantes. Há países onde já não é preciso falar de bem comum.
Qual é então o papel do intelectual em Moçambique?
Eu queria leválo um pouco à honestidade e dizer assim, podes ler tudo aquilo que queres, mas procura dizer coisas muito claras que indicam as pessoas, especialmente a maioria, como ir para frente. Procura ser farol. Estamos a falar de HIV, por exemplo, um intelectual deveria falar se ele sabe, se ele descobriu quais são as causas do HIV/SIDA, devia falar de uma maneira tal que todos possam compreender.
Mas quando o tal intelectual se confronta contra uma espécie de muro, onde se confunde a cultura com os hábitos, como é que deve actuar?
Esforçar-se a falar de forma que as pessoas não deixem de o ouvir, que não fiquem cansadas. Deve falar de uma maneira tal que as pessoas quando ouvirem, ficam a pensar, mesmo se não concordam muito, omeçam a dizer, bom, custa, mas é um argumento aceitável.(Redacção)

Taipo demite chefe de Recursos Humanos da DPTM

O chefe dos Recursos Humanos na Direcção Provincial do Trabalho de Maputo (DPTM), Albino Luís Imina, foi afastado do cargo, hoje, pela ministra do Trabalho, Helena Taipo, em virtude da violação das medidas tomadas última sexta-feira por aquela governante, que consistiam no desconto de um dia a cerca de 26 trabalhadores que chegaram atrasados ao local de trabalho.
Esta manhã, a ministra deslocou-se àquela direcção para avaliar o ponto de situação, ao que constatou que Albino Imina ordenara aos funcionários que assinassem sobre a falta marcada sexta-feira, gesto que o considerou de insubordinação.
Com efeito, Helena Taipo recomendou as direcções nacionais do pelouro a trabalharem sectorialmente com a Direcção Provincial de Trabalho, uma vez que se acredita estar a enfrentar uma crise profunda.

O País online (2007/02/26)

domingo, fevereiro 25, 2007

Ministério público conta com novos magistrados

O Ministério Público conta a partir, desta sexta-feira, com mais sete magistrados que tomaram posse na cidade de Maputo, elevando-se para 168 o número de magistrados o que equivale a um para cada 107 mil pessoas.

Os novos magistrados irão trabalhar nos distritos de Angonia, Gorongosa, Morrumbene, Manhiça, Monapo, Nacala Porto e ainda no Tribunal da Machava no município da Matola. Com estes sete novos quadros o Ministério Público espera minimizar a falta de quadros nos distritos. Do total dos magistrados 10 trabalham a nível central, 88 estão nas capitais provinciais e 70 nos distritos. Os novos procuradores garantiram estar prontos para as novas tarefas, mas estão cientes das dificuldades que os esperam.

Estes reconhecem também que a justiça moçambicana tem recebido de tempos em tempo adjectivos pouco abonatórios por parte dos cidadãos, principalmente por causa do fenómeno que da pelo nome de corrupção. Mas consideram injusto considerar esse mal o único que afecta o seu sector.

A cerimonia de posse foi dirigida pelo procurador geral da Republica que aproveitou a ocasião para repetir a sua já celebre frase: ninguém esta acima da lei.

O País online (24/02/2007)

Uma vítima mas tantos merecendo mesmo destino

Tomás Mandlate esteve rigorosamente dois anos como Ministro da Agricultura dos cinco que era suposto cumprir. Manuel Muchanga, da Renamo, considera que foi uma atitude legítima e acrescenta que outros Ministros como o da Educação e Cultura deviam ter o mesmo destino.

Para o partido independente de Moçambique através do seu presidente Yacub Sibindi, pode ter sido um erro de Armando Guebuza exonerar Tomás Mandlate pois a letargia que parece afectar aquele Ministério pode estar na própria maquina e não no seu timoneiro.

Mas o agora ex-ministro da Agricultura não é caso único de inoperância, neste governo. Virgínia Matabele, ministra da Mulher e Coordenação da Acção Social há muito que está desaparecida e não se conhecem grandes decisões do seu pelouro.

O mau olhado parece acompanhar Virgínia Matabele. No último congresso da Frelimo caiu da Comissão Política para o Comité Central.

Igualmente apagado tem estado Luciano de Castro, ministério para a Coordenação da Acção Ambiental que parece talhado para ofuscar os seus líderes. Na expectativa está igualmente José Pacheco onde os dois primeiros anos não correram tão a avaliar pelo recrudescer do crime.

O Pais online (24-02-07)

Nota:
Descordo que o Ministro de Educacão, Aires Aly, merecesse uma tal exoneracão, embora concorde que ele faca alguns erros como aquele de querer introduzir o mandarim nas nossas escolas antes de ver a questão das nossas línguas maternas, Aires é dinâmico. A Renamo precisa de preparar um indivíduo que ultrapasse ao Aires. O comentário do Sibindy nem vale a pena porque é o mais infeliz. Matabele e de Castro até deviam ser eles mesmos a pedirem exoneracão. O Pacheco não será exonerado porque é flexível em andar de urna em urna eleitoral com escolta policial, para quê, ele e a Frelimo que sabem. Ele devia ser julgado por esta violacão da lei eleitoral.

Ministra pune funcionários “indisciplinados”

A ministra do Trabalho, Helena Taipo, ordenou um desconto de todo o dia de sexta-feira do mês corrente aos funcionários da Direcção Provincial do Trabalho de Maputo devido ao incumprimento do horário de entrada ao serviço.
O castigo, que se estende ao director, resultou de uma visita relâmpago efectuado pela governante àquela instituição com o fim de se inteirar do funcionamento da instituição em relação ao atendimento público.
Dos cerca de 28 funcionários no activo na sede daquela representação do Ministério, apenas dois se fizeram à hora ao posto de trabalho, nomeadamente o chefe dos Recursos Humanos e um servente. Helena Taipo permaneceu durante 30 minutos na varanda à espera da chegada de outros funcionários, situação que não aconteceu até à retirada das instalações.

O País online (24/02/2007)

sábado, fevereiro 24, 2007

Moçambique noutra perspectiva

— a opinião do historiador Elikia M’bokolo

O Professor Elikia M’Bokolo, um historiador de origem congolesa, rege cadeiras em várias universidades estrangeiras, e é director de investigação no Centro de Estudos Africanos da Escola de Altos Estudos de Ciências Sociais, autor de uma história de África em vários volumes e dirige o programa “Mémoire d’un Continent” na Rádio France Internacional.

A Revista Latitudes – Cahiers Lusophones publicou recentemente uma longa entrevista com ele, conduzida por Feliciano de Mira e D. Lacerda, da qual se extraíram as passagens que se seguem, e foram seleccionadas na base da sua relevância para a região da África Austral, especificamente para a África do Sul e Moçambique, e sobretudo por serem uma outra visão de problemas permanentemente em debate entre nós.

O Papel da História

Como historiador, M’Bokolo respondeu à pergunta sobre qual podia ser o papel dos historiadores face aos problemas africanos, dizendo que tem uma visão optimista da história, e mais do que isso, considera-a ao serviço do progresso: “Os meus mestres, os meus referentes em história, como Marc Bloch, consideram que a história é uma ciência que ajuda o homem a ir para a frente.”

“Fazer história é também fazer um certo uso da história. O nosso papel deve contribuir para fazer avançar o continente africano. Trata-se de dar aos africanos confiança neles próprios, e de dar continuidade ao processo de descolonização. É uma ciência que pode ajudar os africanos a conhecer o seu próprio passado. Hoje, os jovens de 18 a 20 anos representam mais de metade da população de África, mas eles não conhecem África, senão desde 1990”.

“Acabo de lançar o primeiro livro da colecção África em todos os seus estados, que é uma tentativa para pensar os problemas do desenvolvimento num longo período de África como quadro de referência. A maioria das pessoas da Costa do Marfim, no Congo, etc., vive sobre as fronteiras, mas a ideia territorial actual não é definitiva. Hoje, no contexto da globalização e de reorganização de África, este quadro territorial a que nos agarramos, talvez não seja o melhor.”

A África do Sul como potência regional

“África do Sul aparece como o país que tem o discurso mais positivo e os meios para realizar a sua política”.

O Professor M’Bokolo considera a África do Sul uma potência regional no contexto do continente e da África sub-sariana, porque “tem uma economia que, no quadro da leitura económica do mundo, parece responder aos critérios da verdade. Tem estabilidade política, uma vida política regulada, com eleições nas datas previstas. Tem alguns problemas sobretudo de corrupção, mas não são muito importantes. Possui igualmente um exército que é um dos mais poderosos do continente africano. A sua história militar remonta à herança Anglo-Boer e do apartheid. O exército permitiu combater a insegurança interna e externa, mas interveio também em Moçambique, no Zimbabwe e Angola”.

“Ao contrário de muitos outros países em África, o exército (da África do Sul) é equipado pela indústria sul-africana (…) A sua diplomacia também é antiga, porque desde os tempos do apartheid que já existiam aberturas para alguns países africanos. Nelson Mandela, que se retirou da vida política, continua a ter um discurso influente, e Tabo Mbeki soube retomar a iniciativa e utilizar em seu benefício o discurso do renascimento africano. Isto porque, depois a morte de Nyerere, de Houphouet-Boigny e outros, faltam em África grandes chefes com um discurso positivo. Sob este ponto de vista penso que não é apenas uma potência regional; e se houver um assento para a África no Conselho de Segurança, há fortes probabilidades que seja para ela.”

A região, o FMI e Banco Mundial e o fosso entre ricos e pobres Segundo M’Bokolo, a África Austral é a sub-região do continente mais bem sucedida em termos de comunidade política e económica, comparando-se favoravelmente com outras que mal funcionam como a CEDEAO (África Ocidental) ou a União do Magreb. No entanto, apesar da sua estabilidade, ele acha que é questionável que a África Austral seja um polo de desenvolvimento, e um dos seus Estados membros, o Zimbabwe, é o exemplo mais evidente dessa vulnerabilidade. (...) “Num país como o Zimbabwe, existem problemas de gestão económica e outros que são consequência da geografia, da seca e dos riscos devidos aos problemas alimentares”.

Por outro lado, ele pensa que a economia globalizada coloca desafios difíceis e a África do Sul, como Estado, corre o risco de ser “o lugar da polarização desta economia sub-regional com a economia mundial”.

Sobre Moçambique, diz-se surpreendido por o país ser apresentado como referência, porque “a imagem que tenho de Moçambique é de um país pobre, do ponto de vista de recursos materiais. No plano dos recursos humanos tem feito um grande esforço desde a independência para formar quadros, mas ainda não chegámos ao circulo virtuoso em que os recursos humanos são suficientemente fortes para produzirem uma economia moderna, que levaria ao ciclo de uma economia do conhecimento”.

Diz que a economia moçambicana é extremamente dependente dos investidores estrangeiros, principalmente sul-africanos, e critica os critérios da sua avaliação.

“O FMI e o Banco Mundial baseiam-se em critérios macro-económicos para dizer que tal país vai bem em relação a um outro, para avaliar o orçamento, os preços, o mercado, etc.. Mas hoje sabemos que essa não é a regra. O desemprego é muito grande em Moçambique; a insegurança não desapareceu completamente. Mas observa-se algo muito positivo: o optimismo das pessoas, que estudam muito. Os cursos nocturnos no ensino superior são um sucesso.

Todavia, tem-se a impressão de que a juventude moçambicana não vê uma perspectiva de futuro, o que é perturbador. O fosso entre ricos e pobres acentuou-se muito. As formas ostensivas da riqueza são hoje maiores do que há quinze anos; alguns gostam de exibir o que têm e dão a impressão de que estão hoje mais ricos do que eram em 1993. Pelo contrário, os outros são tão pobres e tão numerosos! Tudo isto põe problemas inquietantes, que não permitem fazer de Moçambique um modelo”.

Estado Unitário ou federal?

Quando os entrevistadores lhe perguntam se concorda com os que dizem que Moçambique, sendo um país multi-identitário, devia ser um estado federal, M’Bokolo evoca o seu conhecimento directo:

“Moçambique é um destes países do Oceano Índico muito problemáticos. Recordo-me que, em 1993, numa conferência nacional sobre cultura, em Maputo, a questão da moçambicanidade levantou muitas questões. Será que este conceito corresponde à realidade?

Para alguns, que poderemos considerar como integristas culturais, Moçambique seria um país africano, negro e bantu. Isto põe muitos problemas. Será que a africanidade é uma identidade suficientemente forte?

A bantuidade, o facto de falar determinadas línguas, é uma identidade suficientemente forte para definir um povo? Junto com outros, tentei demonstrar que há uma pluralidade muito grande inscrita numa história muito longa. Não foi a colonização que introduziu a pluralidade”.

O historiador diz que em Moçambique não se pode falar de negros e brancos porque há outras componentes, que esta pluralidade é uma coisa boa para Moçambique, e que se devia explorá-la em vez de a ver como elemento negativo.

“Houve uma altura em que se manifestou uma significativa xenofobia contra os indianos. Na Universidade Eduardo Mondlane, assistiu-se a formas de xenofobia e racismo. E fomos muitos a dizer que se tratava de um desvio muito perigoso e em contradição com a aposta democrática de Moçambique. A democracia não é uma questão de raça ou etnia; em democracia não existem macrogrupos, mas sim indivíduos nos lugares onde vivem”.

Sobre o federalismo, afirma que nos países africanos pode ser boa uma estrutura federal que desloque algumas alavancas do poder para a base como garantia de democracia e que num Estado ainda recente e frágil, excessivo centralismo pode ser mau: “Moçambique visto de Maputo é absurdo”,

diz M’Bokolo, sublinhando que um poder significativo nas regiões pode ser bom, desde que não caia em critérios de exclusão étnica, “como uma zambezianidade na província da Zambézia por exemplo, onde a cidadania seria só para a gente da Zambézia. Tratando-se de uma cidadania nacional, as pessoas exercem-na no local onde vivem”. E conclui: “Muitos países africanos ainda não conseguiram organizar este federalismo. O da Nigéria tende a caminhar para o exclusivismo étnico”.

Oposição e Democracia

A propósito dos maus resultados eleitorais da RENAMO, nas eleições de 1994, 1999 e 2004, depois de uma posição de força nas negociações que conduziram ao Acordo de Paz, e das consequências disto para a estabilidade do Estado e para a democracia, M’Bokolo diz que, “após os Acordos de Paz, esperava-se que Moçambique se quisesse soltar da coleira do partido único, e que as grandes formações políticas moçambicanas fossem suficientemente fortes para dialogar uma com a outra, e depois se passasse a uma verdadeira alternância política, permitindo à RENAMO e à antiga oposição não armada participarem no poder, ou talvez, exercerem o poder. As primeiras eleições multipartidárias permitiram à RENAMO ter uma forte participação. Depois, parece-me que surgiram vários factores, falo a partir do vivido. Primeiro, no interior da FRELIMO, havia muita gente que não achava que a FRELIMO devia deixar o poder”. M’Bokolo acrescenta que “existe uma espécie de discurso nacional em Moçambique, onde as pessoas consideram que o único partido legítimo é a FRELIMO de Mondlane e Machel que fizeram a guerra, etc.. Isto leva a desacreditar completamente os outros, sobretudo a RENAMO. A FRELIMO hoje está dividida em diversos grupos e esferas de influência, e a RENAMO atravessa dificuldades ainda maiores: está fraccionada em tendências e, ao contrário da FRELIMO, não conseguiu dotar-se de uma verdadeira elite intelectual (…) não conseguiu, desde 1993, agregar à sua elite politico-militar intelectuais que permitam credibilizar mais a RENAMO e dotá-la de um discurso e de um programa que correspondam ao Moçambique de hoje no lugar daquele que já tem 15 ou 20
anos”.

Sublinha ainda que “do lado da FRELIMO, estamos a ver esta elite a emergir, apesar dos velhos dinossauros marxistas lá continuarem a não querer mudar nada. Deste ponto de vista existe um verdadeiro perigo de Moçambique continuar um país de partido único. Isto é tanto mais grave quanto a oposição não-armada nunca conseguiu emergir. Talvez o factor étnico tenha aqui um papel. Como a oposição não está associada ao poder, falta-lhe material para se organizar e falta-lhe enquadramento.

Poderia haver individualidades fora das formações políticas, com prestígio suficiente para abalar o frente a frente RENAMO-FRELIMO, como professores universitários ou personalidades religiosas, mas isto ainda não se verificou. A tradição frelimista e marxista do intelectual orgânico sem dúvida continua a ter peso”.

Os intelectuais moçambicanos
Sobre a intelectualidade em Moçambique, M’Bololo diz: “Discuti muito com intelectuais em Moçambique para saber se existiam mesmo intelectuais moçambicanos”, diz M’Bokolo. “Um intelectual assume uma liberdade de análise, de abordagem, de tom e de palavra. Esta postura ainda não se institucionalizou na sociedade moçambicana. Conhecemos romancistas, artistas, universitários muito talentosos, mas são todos pessoas que continuaram técnicos, especialistas na sua área. Era preciso que pudessem exprimir-se sobre os grandes problemas do país e dizerem certas verdades, por exemplo, que um Estado frelimista não pode persistir e mostrar os perigos disso! Que é possível fazer?

Ainda não chegámos aí. Temos técnicos do saber e da cultura mas ainda não há uma intelligentsia em tanto que tal. Entretanto em países como o Senegal, o Quénia, o Gana e a Nigária, vemos intelectuais a debaterem os interesses do país, a tomar posições e a fazer avançar a sua resolução”.

No que diz respeito às Ciências Sociais em Moçambique, M’Bokolo diz ter acompanhado a chamada crise da UFICS (Unidade de Formação e Investigação em Ciências Sociais) da
Universidade Eduardo Mondlane, em 2000/2001, cujo desfecho acabou por reduzi-la a um
departamento da Faculdade de Letras da UEM.

Sobre este assunto, ele diz: “As ciências sociais em Moçambique têm uma história apaixonante porque estiveram misturadas com a luta de libertação. Em vez de se regozijar com isso, a FRELIMOcompreendeu que as ciências sociais podem ser subversivas.

Atemorizou-se e quis controlá-las e mesmo suprimir o seu ensino. As pessoas na Universidade bateram-se para lhes restituir o seu papel de ciência e de uma autonomia verdadeira. Os debates em torno do Centro de Estudos Africanos e da UFICS mostraram que o medo persiste, quando Moçambique tem a oportunidade de ter ciências sociais piloto, que ultrapassam a simples sociologia, a antropologia e o direito.

Mas estas disciplinas estão ligadas à história, à filosofia e põem a par os estudos no terreno e as discussões mais abstractas. Ora, nos países emergentes, a vantagem seria ter ciências sociais a um nível mais elevado, como em França e em certas universidades de excelência nos Estados Unidos, onde há uma mistura de especulação e de pesquisa no terreno e também entre os investigadores que são quer teóricos, quer empenhados na prática social.”

Que ele tinha a UFICS em grande estima reflecte-se no apelo para que ela seja autonomizada: “Pela sua história particular, Moçambique (e talvez Angola e a Guiné-Bissau) é um país onde se podia autonomizar a UFICS e fazer dela uma universidade de pleno direito, mais do que um Departamento da faculdade de Letras. Nesse caso estou quase certo que podia rivalizar com as melhores universidades da África do Sul. Para isso, é preciso que a FRELIMO renuncie ao atavismo de querer controlar a produção das ciências sociais – essa velha herança do marxismo estaliniano – e que, por outro lado, os universitários moçambicanos se assumam como intelectuais para quererem libertar-se do partido e do Estado e tornarem-se autónomos. Sem isso, o país manter-se-á num academismo bastante tradicional. África e Moçambique não precisam de um academismo que repete o que se faz em todo o lado, precisam sim de algo mais ambicioso, de inovar nas ciências sociais e empurrar o país para a frente”.

A sua visão para que Moçambique e a África, em geral, saiam da actual encruzilhada é um pelo “aos mediadores culturais e sociais, às elites e aos dirigentes africanos” para que se deixem de especular sobre a cooperação, negligenciando as questões da sociedade real. “Tudo separa as personalidades e a gente do poder que passam o tempo nos 4x4 e em casas climatizadas, assistindo às televisões mundiais, e um povo que se desenrasca sozinho. E se esta situação se mantiver, pode temer-se que a África atravesse o século XXI sem avançar um dedo”.

Edição de Maria de Lourdes Torcato (Extraído e traduzido de Latitudes –
Cahiers Lusophones nº 25)

SAVANA Maputo 230207

Brazão

Fernando Lima(*)

Está para breve a saída do reitor da mais antiga universidade pública moçambicana. Para o bem e para o mal, Brazão Mazula moldou os destinos da Universidade Eduardo Mondlane (UEM) durante mais de uma década.Longe vão os tempos do ex-sacerdote doutorado no Brasil que conduziu com notável sucesso as primeiras eleições multipartidárias moçambicanas.
Foi com uma auréola de cultura, sabedoria e espírito de tolerância que Mazula chegou à academia, dominada desde a independência pelo mesmo inequívoco sinal político.
Foi provavelmente um presente envenenado o que lhe ofereceram. Mazula ofuscava as figuras de proa do regime, não exibia cartão partidário, nunca se eclipsou da órbita do catolicismo e poderia ser claramente um candidato presidencial independente.
O presente envenenado transformou-se em casca de banana. Embora não estejam ainda hoje claramente definidos todos os contornos das várias contestações estudantis, muito do que foi feito tinha como objectivo o desgaste de Mazula. Maquiavelismos orquestrados pelas mesmas forças que levaram o homem de paz e consensos à reitoria.
O resto, com o decorrer dos tempos, foram tiros nos pés e o inexorável jogo da aranha e da sua teia pegajosa.
Académico que leva a sério o imperativo de publicar, certamente que Mazula não nos deixará de brindar com as suas próprias reflexões sobre a UFICS(Unidade de Formação e Investigação em Ciências Sociais), uma mancha indelével no percurso da UEM, só comparável com o encerramento unilateral da Faculdade de Direito nos anos 70.
Como se a direita revanchista, humilhada no encerramento da Faculdade de Direito se vingasse na UFICS, eliminando um foco de pensamento independente, depois dos sucessivos lampejos intelectuais desde 1975 na Faculdade de Economia, no Centro de Estudos Africanos, no nado morto que foi a Faculdade de Marxismo e que não era suposta de seguir a cartilha ortodoxa dos “mestres” despachados a partir da RDA.
Perdida a honra, o resto são jogos de poder e baixa política. Exonerações arbitrárias, favores a académicos e estudantes, um saco azul disponível para jornais e jornalistas, jogos de cintura para contornar auditorias e inquéritos a fundos mal utilizados, perseguição aos que colocavam reticências em comer à mesa do rei.
Embora tenha sido o punho de Brazão Mazula que exonerou os académicos Eduardo Namburete e Ismael Mussá, este acto de clara intolerância política evidencia os poderosos tentáculos que acabaram por engolir e vitimar o reitor que um dia veio das terras longínquas do Niassa.
Se dúvidas existiam sobre os caminhos aziagos porque corre a democracia minguada de Moçambique, Brazão Mazula e o seu consulado à frente da UEM oferecem-nos inúmeros e multifacetados estudos de caso. Na hora da partida, estou curioso em conhecer o novo Brazão Mazula. O que conheci nos tempos conturbados do Acordo Geral de Paz.

(*) Espinhos da Micaia

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Circuncisão reduz para metade riscos de infecção pelo vírus da Sida

A circuncisão reduz para metade os riscos de infecção pelo vírus da Sida (HIV), segundo resultados, publicados na revista médica britânica The Lancet, de duas experiências efectuadas no Quénia e no Uganda.

Os resultados confirmam os de um estudo semelhante e anterior efectuado na África do Sul.

O estudo que foi levado a cabo em Kisumu, no Quénia, e abrangeu 2.784 homens seronegativos (entre eles 1.391 circuncidados), com idades compreendidas entre os 18 e os 24 anos, concluiu que o risco de contrair o vírus pelos homens circuncidados era reduzido em pelo menos 53 por cento.

O segundo estudo, no qual participaram 4.996 homens com idades compreendidas entre os 15 e os 49 anos, e que foi efectuado em Rakai, no Uganda, demonstrou uma redução do risco de infecção em pelo menos 51 por cento dos circuncidados.

Durante os dois estudos, 65 e 69 participantes terão sido infectados com o vírus: 22 circuncidados e 43 não circuncidados no Uganda; 22 circuncidados e 47 não circuncidados no Quénia, segundo dados comunicados pelo Instituto Nacional das Alergias e Doenças Infecciosas (NIAID), nos Estados Unidos, que participou no financiamento dos estudos.

Um estudo precedente, efectuado entre 2002 e 2005 na África do Sul, pela Agência Nacional de Investigação sobre a Sida (ANRS), em França, e que abrangeu 3.274 homens, havia demonstrado que a circuncisão reduzia em 60 por cento o risco de infecção masculina.

"Os três ensaios (Ó) fornecem agora a prova que o risco de contrair HIV é reduzido em cerca de metade pela circuncisão masculina", afirmam Marie-Louise Newell e Till Barnighausen (Universidade de KwaZulu-Natal na África do Sul, Harvard School of Public Health).

"No entanto, a circuncisão masculina não dá uma protecção a 100 por cento e os preservativos continuam a ser uma parte importante na prevenção do vírus da sida", pode ler- se na revista The Lancet.

Calcula-se que a circuncisão pode evitar 35.000 novas infecções em 2007, em cerca de 2,5 milhões de homens da província sul-africana KwaZulu-Natal, onde a incidência de infecção pelo HIV é muito elevada, e a taxa de circuncisão é até agora muito baixa.

É necessário agora que haja uma grande prudência nas políticas que encorajem a circuncisão. Pensar estar protegido pode conduzir a uma redução da utilização do preservativo, e a um maior número de riscos, alertam os especialistas.

A necessidade de assegurar a circuncisão em boas condições higiénicas foi também um alerta lançado pelos especialistas.

O efeito protector da circuncisão pode estar ligado à transformação da mucosa, rica em células imunitárias alvo do HIV, que recobre a glande.

Após a operação, uma camada protectora de células epiteliais, semelhantes às que cobrem a pele, forma-se sobre a mucosa, "o que limita a entrada viral nas células alvo do HIV que se encontram por baixo", afirmam Robert Baley, da Universidade de Chicago, e os seus colegas que participaram no estudo levado a cabo no Quénia.

Agência LUSA (2007-02-23)

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Prospectiva

Afonso dos Santos(*)

Pode parecer, por vezes, que há, nesta escrita, uma insistência em alguns temas, que acabam por tornar-se repetitivos. Mas enquanto os mesmos problemas subsistirem repetitivamente, enquanto persistir teimosamente a política de colocar as mordomias para algumas minorias sociais acima dos interesses da nação e das necessidades da população, então não há outro caminho a seguir que não seja insistir sobre os mesmos temas, sempre e sempre, até que mude a situação vigente e persistente.

Um desses temas é a questão: o que é que os académicos, de quem tanto se fala, andam a fazer? Curiosamente, parece haver académicos aos montes, mas raramente se fala de intelectuais e da sua responsabilidade social. Esta raridade pode ter a sua lógica, porque parece que os “académicos” se tornaram uma espécie de figuras decorativas do aparelho burocrático dirigente, enquanto os intelectuais são geralmente praticantes do pensamento crítico e produtores de ideias novas e férteis. Em suma, são uns indesejáveis. Mas aquilo a que se tem assistido é a uma angustiante colagem ao discurso do poder político, até ao nível mais anedótico. Um dos grupos profissionais que constitui a camada social dos intelectuais são os jornalistas.

Veja-se agora um exemplo: numas comemorações políticas recentes, um funcionário do protocolo, anunciando o que se ia seguir, usou a pomposa e ridícula expressão “sessão gastronómica”, para substituir a modesta palavra “refeição”, ou “almoço”, ou, mais solenemente, “banquete”. Pois bem, em face disso, uns jornalistas que faziam a reportagem da cerimónia, não usaram, daí em diante, nenhum outro vocábulo que não fosse “gastronomia”.

Mas será que a febre da subserviência e a ânsia de alguma promoçãozinha os endoideceu de vez? E será por causa desse delírio seguidista que não conseguem sentir um mínimo de vergonha? Por este caminho, que ideias é possível gerar sobre o futuro? É aqui que aparece a prospectiva.

E o que é a prospectiva? É uma ciência, “que tem como objecto de estudo o futuro, nomeadamente as razões que aceleram a evolução do mundo moderno (progresso das comunicações, multiplicação do poder técnico). (...) ela consiste em ver longe – e globalmente – para modificar em profundidade qualquer projecto de acção. (...) A prospectiva deveria ser antes de mais uma ciência ao serviço dos governantes.” (Dictionnaire de la Philosophie, Didier Julia, Librairie Larrouse, Paris, 1964).

A prospectiva, como ciência particular, foi criada pelo filósofo Gaston Berger. Ser uma ciência ao serviço dos governantes não significa que os cientistas estão ao serviço da política. Até pelo contrário: significa que, em vez de serem serventes do poder, que repetem o que os governantes dizem, põem os governantes a falarem – e sobretudo a fazerem – de maneira diferente, porque estes recebem dos cientistas informação e saber. Se quiserem, claro!

Aliás, a prospectiva, geralmente, é praticada por institutos criados por iniciativa privada (associações ou grupos de empresários, grupos de imprensa), que vendem os seus serviços a quem fizer encomendas, sejam organismos estatais, sejam entidades privadas.

O livro “Como viveremos em 1980”, de vários autores, contém muita matéria sobre a prospectiva. Nele, Louis Armand, outro dos fundadores dessa ciência, alerta: “Uma comissão composta por personalidades indiscutíveis, mas com muito pouco tempo, poderá sem dúvida ‘prever’, mas nunca fazer prospectiva. (...) Seria necessário um organismo permanente trabalhando sempre, uma equipa composta por especialistas e por eruditos. Uma espécie de conselho de aperfeiçoamento do humanismo, da civilização”.

A prospectiva não tem nada a ver com a elaboração de planos político-económicos de longo prazo que estabelecem objectivos e metas. Isso são decisões, e não predições, sobre o futuro.

Um grupo de prospectiva pode funcionar, por hipótese, do seguinte modo: a cada um dos membros do grupo solicita-se que escreva quais são, na sua opinião, os principais problemas que Moçambique poderá enfrentar no futuro (serão na área da política, da economia, da ecologia, da educação?). Mas é preciso concretizar cada problema. Será a falta de água potável? Será a concorrência com os países da região? Será a ignorância galopante e a falta de cultura da geração das mensagens de celular?

Juntando as respostas dos diferentes elementos do grupo, faz-se a verificação sobre quais são as mais frequentes e passa-se a trabalhar sobre elas, tomando como base a seguinte questão: Quais as decisões que é preciso tomar no presente, para agir sobre o futuro, evitando problemas já hoje predizíveis? Seguem-se algumas questões talvez prospectivas. Quais serão os efeitos futuros da formação dum número excessivo de licenciados?

Por outras palavras: o mercado de trabalho vai ter capacidade e necessidade de absorver a quantidade de licenciados que estão actualmente a ser formados? Para que servem todas essas instituições do ensino superior que estão a ser criadas? Que qualidade de ensino será possível assegurar? Qual é a qualidade do corpo docente dessas instituições? Quais são todas as possíveis consequências futuras da extracção desenfreada dos recursos florestais? Qual será o processo social por meio do qual se desenvolverão e consolidarão novos grupos ou classes sociais, com espírito patriótico e sentido de responsabilidade, que serão capazes de criar uma alternativa política, a qual, em vez de vender, defenda os recursos naturais do país e, em vez de desbaratar, preserve e amplie o património cultural e a sabedoria do povo moçambicano? E como é que se poderá acelerar esse processo? Talvez através da prospectiva!
(*)Savana

Ilha de Moçambique : Município não paga água

A empresa Águas da Ilha de Moçambique está em “guerra” com o Conselho Municipal da mesma região, tudo por causa de uma dívida acumulada, resultante do consumo de água, nos últimos três anos, estimada em mais de 62 mil meticais, valor que tende a subir mensalmente, e que supostamente a edilidade não se mostra disponível a pagar.

Esta dívida, segundo apurou o “Notícias”, resulta do consumo de água pelos diferentes sectores da edilidade, nomeadamente da urbanização, para garantir a manutenção dos jardins públicos, do mercado novo, e do edifício onde funciona a edilidade, no período que vai desde meados de 2003 a esta parte.

Várias foram as vezes que a empresa Águas da Ilha de Moçambique efectuou cortes no abastecimento do precioso líquido aos locais e instalações acima citadas, mas, segundo dados da empresa, a edilidade orientou os seus técnicos no sentido de restabelecerem o fornecimento, gesto que viola as normas previstas passível de multas.

A directora da empresa Águas, Arina Molumo, confirmou os factos, e acrescentando que a dívida é referente ao consumo, não pago, num período de três anos, como pelo, restabelecimento do abastecimento de água de forma ilegal, fixado em 1.600 meticais até o momento.

Arina Molumo precisou que as autoridades municipais enviaram, em Setembro último, os seus emissários para negociar as modalidades de amortização faseada da sua dívida, proposta prontamente aceite pela direcção daquela empresa encarregue de fornecer água à ilha.

“Porque nós privilegiamos o diálogo com qualquer dos nossos clientes, e oferecemos várias modalidades de amortização das respectivas dívida e foi o que fizemos com o Conselho Municipal”, explicou.

A nossa interlocutora lamentou, contudo, o facto de até ao momento a edilidade, sob gestão da Renamo, não ter esboçado qualquer gesto que simbolize a sua vontade de honrar os compromissos assumidos para amortização da dívida.

Estas afirmações são consubstanciadas pelo facto da edilidade da Ilha de Moçambique, através do vereador de Administração e Finanças, Abdul Rahimo Satar, ter dito ao Governador de Nampula, Felismino Tocoli, que a empresa de águas local estava a perseguir o Conselho Municipal, usando mecanismos antidemocráticos, ou seja o levantamento de dívidas passadas, referentes ao consumo de água.

O vereador chegou a afirmar que a dívida não era apenas do seu mandato, mas do mandato anterior dirigido por Abdul Satar Naimo, da Frelimo, e que por conseguinte, não via razões para que fossem imputadas à edilidade, pois, isso visava pura e simplesmente denegrir a imagem da oposição.

No entanto, Arina Molumo, disse que a empresa Águas da Ilha de Moçambique não vai abdicar de cobrar os valores devidos pela edilidade, e já tem previsto um encontro com o governador da província, para em conjunto encontrarem uma solução que visa obter garantias para o pagamento do valor em dívida.

Segundo Molumo, o mesmo é necessário para ajudar a cumprir algumas obrigações com fornecedores de produtos para o tratamento da água, assim como o pagamento de salários aos seus funcionários.

Salientar que a edilidade da Ilha de Moçambique não paga salários aos seus funcionários incluindo o presidente desde o ano passado, alegadamente pela incapacidade de gerar receitas, o que terá valido uma censura por parte do governador de Nampula que instou os órgãos autárquicos a serem mais criativos na procura de soluções para ultrapassar as suas dificuldades financeiras.

Notícias, 2007-02-22

PACODE censura Oposição Construtiva

O PARTIDO do Congresso Democrático (PACODE) não vê com bons olhos os projectos desenhados pela coligação PIMO/Oposição Construtiva, indicando que muitas promessas feitas são só “para inglês ver”.

Depois de muito silêncio Vasco Campira Momboya, presidente do PACODE acabou abrindo a boca para explicar as causas da sua saída daquela coligação. Explicou que decidiu afastar-se daquela união precisamente por não haver clareza quanto aos objectivos que se pretendem alcançar.

“Qualquer partido político aspira o poder. Na coligação fala-se de reconstrução das lojas destruídas pela guerra. Da construção de escolas, estradas, pontes etc. Fala-se do combate a pobreza absoluta. Afinal qual é a agenda”?, questionou Momboya, acrescentando que pelo que sabe da política essa não é tarefa dos partidos políticos.

O presidente do PACODE disse que mesma na Europa,onde a democracia está desenvolvida e consolidada, os partidos nunca se envolvem na construção de estradas, escolas e pontes.
“Os partidos politicos fiscalizam a actividade do Governo. Apontam os erros e apresentam soluções”, frisou.

A fonte indicou ainda que os partidos políticos, sobretudo em África, estão à procura de financiamento para melhor se posicionarem no cenário político e não para executar agendas à responsabilidade do Governo.

Ao se pronunciar nestes termos, Vasco Momboya manifestava as suas reservas quanto a proveniência dos fundos com os quais a coligação PIMO/oposição construtiva pretende levar a efeito as suas agendas.

“Não quero acusar a ninguém, mas conheço as dificuldades por que passam os partidos políticos para a sua insercção. Não tem dinheiro. De onde vem o financiamento do PIMO”?, questionou Vasco Momboya.

Referiu que, por duvidar da proveninência de tais financiamentos decidiu de livre e espontânea vontade afastar-se da coligação para que o seu nome bem como o do partido que dirige não sejam um dia associados ao mal.

Disse que não precisou de escrever a coligação sobre as razões da sua saída nem sequer comunicar oficialmente para evitar possíveis aliciamentos.

“Durante muito tempo analisei a génese da coligação econclui que não me devia imiscuir em assuntos de natureza duvidosa. Não estava seguro naquele projecto e sai”, disse, salientando que não está arrependido pela posição que tomou.

Salvaguardou que entre ele e Yá-qub Sibindy não há crise de espécie alguma, apenas decidiu afastar-se do projecto da coligação por não concordar com a sua filosofia.

“Mas Sibindy continua a ser um grande amigo meu. Só não comungamos dos mesmos ideais
na concepção da coligação” salientou.

CRISE NO CPDM DEVE ACABAR

Num outro desenvolvimento, o presidente do PACODE afirmou que depois de abandonar aquela coligação decidiu juntar-se ao Centro de Promoção da Democracia Multipartidária (CPDM) – um fórum de partidos políticos que visa promover a união, o diálogo e debate de questões da vida nacional.

Porém,segundo a mesma fonte, o CPDM está agora a braços com uma crise derivada da falta de entedimento entre alguns dos seus membros. Lamentou por este facto acontecer numa altura em que o CPDM caminhava rumo a uma coesão que o conduzisse a participar nos próximos pleitos eleitorais.

“A crise deve ser saneada da nossa organização. Temos projectos sérios por realizar e não podemos perder tempo com coisas mesquinhas”, afirmou Vasco Momboya implorando as partes divergentes a sentarem à mesma mesa na procura de soluções para a crise.

Mesmo sem ir ao detalhe,a nossa fonte indicou que a crise deriva do facto de existirem duas alas, sendo uma encabeçada por Raul Domingos, do PDD e outra por André Balate, do PARENA.

“Talvez não interesse tanto chamar para aqui os pontos divergentes. Importa, isso sim, chamar as partes a se entender dentro daquilo que são os acordos estabelecidos. É que enquanto nos digladiamos, os nossos adversários vão somando pontos e os resultados disso serão vistos nas eleições”, potenciou a fonte.

Notícias, 2007-02-22

Oposição Construtiva fala da sua experiência no exterior

O PRESIDENTE do Bloco da Oposição Construtiva, Ya-qub Sibindy, disse ao nosso jornal que quadros desta coligação vão realizar uma digressão por diversas países da região, Brasil, China e Suécia, com o propósito de divulgarem a experiência do chamado modelo de “orientação construtiva”.

“Para explicarmos a génese desde novo modelo de orientação política, quadros da nossa organização vão visitar, brevemente, alguns países da região, nomeadamente Zimbabwe, Malawi, Zâmbia, assim como a China, Brasil e Suécia”.

Segundo explicou, o que marca a diferença entre os partidos da “orientação construtiva” e outras linhas políticas, “é o facto de nós não esperarmos alcançar o poder para participarmos no desenvolvimento do nosso país. A nossa filosofia é apresentar realizações para daí angariarmos simpatias dos eleitores e, por via disso, chegarmos ao poder”.

Num outro desenvolvimento, o nosso entrevistado informou ao nosso jornal a realização em Julho próximo, do I Congresso da coligação. Trata-se de um encontro que servirá para a definição de estratégias conducentes à participação do Bloco nas eleições provinciais agendadas para o ano corrente, autárquicas de 2008 e legislativas e presidenciais do ano seguinte.

Segundo Ya-qub Sibindy, enquanto o ano de 2005 foi dedicado à procura de espaço no cenário político nacional, 2006 foi o ano de legalização da coligação, sendo que no ano em curso a prioridade é estruturar a organização.

“É neste congresso onde serão definidas as tarefas de cada órgão e pretendemos deixar claro que independentemente da indicação dos deputados e ministros sombra, o espaço estará aberto para todos os moçambicanos que quiserem deixar as suas contribuições poderem fazê-lo livremente”, disse Ya-qub Sibindy.

O nosso entrevistado disse serem prioridades do grupo a formação dos seus quadros a todos os níveis em matéria de estratégia eleitoral, criação da comissão logística e de angariação de fundos para as eleições provinciais e autárquicas. O Bloco espera ainda formar gabinetes centrais e provinciais de eleições, a concepção e produção de material de propaganda eleitoral, capacitação de fiscais do processo eleitoral e outras actividades.

Notícias, 2007-02-22

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Governo prevê quadro preocupante na bacia do Zambeze

A situação de cheias na bacia do Zambeze poderá atingir "um quadro preocupante" nas próximas duas ou três semanas, admitiu no domingo o Instituto Nacional de Gestão de Calamidades de Moçambique (INGC).

Mais de 85 mil pessoas foram desalojadas pelas inundações que afectam há algumas semanas aquela região do centro de Moçambique e destruíram também milhares de hectares cultivados.

Num balanço de um encontro realizado no domingo na Beira, capital da província de Sofala, também fustigada pelas intempéries, o ministro da Administração Estatal, Lucas Chomera, os governadores das quatro províncias do centro moçambicano e os responsáveis do INGC previram para as próximas semanas um agravamento do cenário de cheias naquela região do país.

Já no domingo, o Governo havia anunciado que se mantinha o "alerta vermelho" no vale do Zambeze, apesar de ter declarado o fim das operações de resgate de pessoas ameaçadas pelas águas.

Na origem dessa situação, está "a contínua subida dos níveis hidrométricos nas estações de Mutarara, em Tete, Caia e Marromeu, em Sofala", na sequência de um novo pico de cheias superior ao que aconteceu em 2001 na bacia do Zambeze.

O plano de intervenção concebido pelo Governo moçambicano prevê que 285 mil pessoas sejam afectadas pelas cheias, das quais 142 mil deverão passar pelos centros de acomodação.

Com o deteriorar da situação, o Governo viu-se forçado a aumentar o fundo do Plano de Contingência para mais de três milhões de euros.

Notícias Lusófonas (20/02/2007)

FALTA DA PONTE CONDICIONA DESENVOLVIMENTO DE LUNGA

Distrito de Mossuril

A falta da ponte sobre rio Monapo, está a condicionar o desenvolvimento social e económico do posto administrativo de Lunga, distrito de Mossuril, província de Nampula.
O governo distrital diz que estudos preliminares efectuados apontam para cerca de 250 mil dólares o valor necessário para financiar a construção da ponte de betão que desabou há mais de uma década devido a força das aguas.
A nossa reportagem apurou que várias iniciativas visando promover o desenvolvimento sócio económico de Lunga, com uma população estimada em 24 mil habitantes, levadas a cabo por diferentes parceiros do governo, não têm alcançado os objectivos preconizados, devido a dificuldades de acesso.
Neste momento a ligação rodoviária com Lunga, a partir da sede distrital de Mossuril, é feita por uma via alternativa que obriga os automobilistas a ter que passar pelo distrito vizinho de Monapo, um percurso de cerca de cem quilómetros contra menos de cinquenta quilómetros em relação à via normal que se encontra obstruída neste momento devido ao desabamento da ponte, provocada pelas intempéries influenciadas pelo ciclone “Nadia”.
Em Lunga falta quase tudo, menos os produtos agrícolas que são abundantes, pois, a região é potencial produtora, razão porque é apelidada de celeiro dos distritos de Mossuril e da Ilha de Moçambique, aos quais, entre muitos cereais, fornece milho, mapira, além de hortícolas, incluindo gado ovino, caprino e bovino para o consumo das populações.
Contudo, as populações lamentam- se da falta de unidades sanitárias, concretamente de serviços de maternidade o que obriga as parturientes a fazer longas e antecipadas viagens para a sede distrital de Mossuril ou cidade da Ilha de Moçambique, onde vão aguardar pelo momento do parto.
Lamentam-se, igualmente, da falta de projectos sociais desenvolvidos por organizações não governamentais nacionais e estrangeiras viradas para a elevação da qualidade de vida das populações locais, através de microprojectos para a geração de emprego de da renda das famílias.
Os distritos que circundam Lunga, nomeadamente Ilha de Moçambique, Monapo e a própria sede distrital de Mossuril e alguns postos administrativos, beneficiam todos eles de fornecimento de energia eléctrica produzida na Cahora Bassa. A exclusão de Lunga do beneficio daquele produto, segundo apuramos, deriva das dificuldades de acesso, pois, no tempo chuvoso, fica isolado do resto da província em face da subida do caudal do rio Monapo.

WAMPHULA FAX - 20.02.2007

terça-feira, fevereiro 06, 2007

O perigo amarelo

Espinhos da Micaia

Por Fernando Lima

O chinês mais popular do meu bairro era um cobrador da água e electricidade, quando os dois serviços pertenciam à municipalidade da cidade.
Era alto e desengonçado e, se a memória não me falha, chamava-se Lee Tat Kan. O chinês da minha estória iria ficar ligado à história do "cinema" colonial com o seu protagonismo numa "burrada" que tinha por título "O Zé do Burro". O nosso amigo Lee era no filme, não o Bruce, mas o "perigo amarelo" que a "agit-prop" colonial agitava quando pretendiam colar o movimento de libertação à cínica agenda dos interesses sino-soviéticos para África.
O nosso Lee, à data da independência foi para Portugal, provavelmente convencido que os seus parentes da China continental, vinham por aí a todo o gaz fazer uma nova colonização de Moçambique. Há uns anos, quando me perguntou pela saúde de Moçambique num bar do Bairro Alto em Lisboa disse-lhe que não havia paraíso comunista em Moçambique. Fez um sorriso amarelo. Só podia.
Trinta anos depois, o "perigo amarelo" parece um tema recorrente em África.
A punjante economia chinesa precisa de matérias primas, tem rios de dinheiro para as depauperadas finanças públicas africanas e não faz perguntas embaraçosas em matérias ambientais e dos direitos do homem.
As "nomemklaturas" do continente rejubilam e agradecem.
A caricatura, porque é isso mesmo, caricatura, não tem que ser necessariamente verdadeira. O investimento directo estrangeiro está na ordem do dia e os governos do continente procuram negociar com os seus parceiros internacionais negócios vantajosos. Em princípio, para todas as partes envolvidas.
Um boa estrada, que cumpra os parâmetros estabelecidos nos cadernos de encargos, é tão boa feita por italianos, sul-africanos ou chineses. Colocar à partida reticências porque o engenheiro é chinês é pura e simplesmente preconceito.
Quem vai à loja de ferragens deve estar preparado para escolher entre a quinquilharia que os empresários moçambicanos vão buscar à China e o mesmo tipo de material que outros ou os mesmos empresários moçambicanos importam de outras paragens ou de fábricas chinesas com outros padrões de qualidade.
O problema não está portanto nos chineses, mas no que as contrapartes definirem qual é o papel e o espaço chinês nas suas economias.
Os golpes de "kung fu" que são aplicados aos trabalhadores moçambicanos ferem tanto a sua auto-estima como os insultos de um colonialista português ou as "sepulturas" vivas infligidas por empresários sul-africanos aos moçambicanos que trabalham nas estâncias turísticas de Inhambane. Agressão é agressão. O roubo de recursos marinhos não muda de nome porque é praticado por "camaradas "chineses". Os ataques à floresta moçambicana não são pilhagem se forem feitos por nigerianos e tanzanianos para passarem ao corrente autismo só porque um bando de corruptos acolitados na "nomenklatura" e sempre com a boca cheia de patriotismo estão prontos a hipotecar o país a herdar pelas gerações futuras. Parece haver uma estranha amnésia para a defesa do interesse nacional que faz parte da ementa do nosso dia a dia político. Como acontece com os torcionários do "apartheid", os mesmos que assassinaram Ruth First e os seus companheiros no "campo quatro" e se transformaram em respeitáveis parceiros de negócios em Maputo e Luanda.
Não há perigo amarelo como pensava o bom do Lee Tat Kan.
Mas há falta de muitas outras coisas para que o país não se transforme, em definitivo, numa enorme coutada.
De papel timbrado e despacho em Boletim da República.
SAVANA - 02.02.2007

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Partido Frelimo partidariza Eduardo Chivambo Mondlane

Com festa de arromba

Maputo (Canal de Moçambique) - No seu já habitual esforço de tornar a sua formação política hegemónica e absolutista no cenário político moçambicano, o presidente da República e também do partido Frelimo, Armando Guebuza, ensaiou no passado dia 3 de Fevereiro aquilo a que certas correntes de opinião já denominam de “uma etapa de adulteração da história recente de Moçambique”. No meio de pompa e circunstância, com comida e bebida pelo meio, Armando Guebuza inaugurou o novo busto de Eduardo Chivambo Mondlane em frente a sede do Comité Central do partido Frelimo. O anterior havia sido inaugurado por Joaquim Chissano, numa outra profecia de fé…

Eduardo Mondlane nunca foi membro do Partido Frelimo. Foi o primeiro presidente da Frente de Libertação de Moçambique, de que foram membros também milhares de compatriotas moçambicanos, muitos deles mandados fuzilar quando a frente foi extinta para dar lugar ao Partido Frelimo de orientação marxista-leninista, fundado em 1977, doze anos depois da sua morte. Eduardo Mondlane foi o primeiro presidente da Frente de Libertação de Moçambique, frente de luta anti-colonial resultante da fusão de três movimentos. Nessa altura não havia o partido que se constituiu usurpando o acrónimo da frente (FRELIMO) – conseguido por Fanuel Malhuza. Apenas uma parte dos membros da Frente viria a aderir ao partido a cuja constituição se seguiria um período de miséria absoluta ao mesmo tempo que se assistia ao enriquecimento de poucos de uma «numenklatura» auto-proclamada.

A Frente de Libertação de Moçambique foi extinta no 3.º Congresso que também criou o Partido Frelimo, assumidamente Marxista-Leninista. Tal facto dá-se com Samora Moisés Machel no poder e quando faziam também parte do Bureau Político do Comité Central outros dois assumidos marxistas-leninistas que viriam mais tarde a chegar à presidência do mesmo partido e do Estado, respectivamente Joaquim Chissano e Armando Guebuza.

Aliás, é ideia corrente de que uma das vocações principais do partido Frelimo nos primórdios da sua fundação foi perseguir e assassinar outros companheiros de Mondlane que se recusaram a aderir aos ideias marxistas-leninistas e à ideia de ditadura que o partido único preconizava sob os auspícios de Machel e seus correligionários ainda vivos. O caso mais visível foi o do Reverendo Urias Simango, vice-presidente de Mondlane na Frente de Libertação de Moçambique, fuzilado extra-judicialmente às mãos do partido Frelimo algures no Niassa, num crime a que até hoje as mais diversas comunidades internacionais continuam a fazer vista grossa em atitude de que sobressai a sempre uma sempre activa Amnistia Internacional, neste caso completamente surda e cega como o comprova a sua mudez.

Certas correntes de opinião interpretam a atitude de Guebuza de endeusar Samora, primeiro, e agora Mondlane, como tentativa de buscar a sua legitimidade na história num momento em que começa a tornar-se visível que a principal ideia da governação do actual chefe de Estado, «o combate contra a pobreza absoluta», está a mostrar sinais de total fracasso ao mesmo tempo que ele próprio começa a aparecer aos olhos da opinião pública enfraquecido pelas pedras que lhe tem atirado os seus próprios correligionários, hoje clara e progressivamente a tirarem-lhe o tapete e a descobrir-lhe os podres como o comprovam as histórias que estão a animar hoje o bate-boca político um pouco por todo o país e abrem espaço para uma oposição mais actuante.

Como nota de referência, dizer ainda que Armando Guebuza chegou a ser secretário de Eduardo Mondlane, figura ontem resgatada em esforço partidarizante e com sinais de desespero de causa.

A ideia de busca de legitimidade justifica que o actual presidente da República adultere os manuais de história e assuma como do seu partido uma figura que nunca teve cartão de membro do partido Frelimo. Assim se pode resumir o acto de recorrência a que se assistiu no sábado em mais um aniversário da morte de Eduardo Chivambo Mondlane – não na sede da Frelimo como sempre se tentou fazer crer – mas, sim, em casa da americana Bety King, em Dar-es-Salaam, capital da Tanzânia, a 3 de Fevereiro de 1969. (vsff «Canal de Moçambique» n.º1, de 07 de Fevereiro de 2006).

Canal de Mocambique (Celso Manguana) 2007-02-04