A Beira, segunda maior cidade de Moçambique, prepara-se para substituir 900 nomes da sua toponímia ligados ao período colonial por "heróis nacionais", num processo controverso envolvendo partidos políticos e sugestões da população, num local tido como bastião da oposição.
Em declarações à Lusa, Estefan Mataveia, chefe da bancada do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) na Assembleia Municipal da Beira (AMB), partido no poder na autarquia, disse que o Conselho Municipal prepara a reformulação dos nomes de 700 avenidas, ruas, praças, prédios e largos e de 200 "impasses" (vias reduzidas a caminhos devido a ocupações desordenadas).
"Na nossa cidade há muitas avenidas e edifícios e até praças que ostentam nomes coloniais e a geração jovem não conhece a sua história", observou Mataveia, considerando que já não fazem sentido atendendo ao passado recente do país.
O processo de reformulação da toponímia iniciou-se com a auscultação popular em Outubro e encerrou a 30 de Novembro, após um prolongamento de 30 dias, a pedido do Conselho Municipal, para alargar o debate a mais interessados.
Nos próximos dias deverá ser feita a verificação dos nomes consensuais, que serão submetidos à AMB e depois enviados para o Conselho de Ministros.
Um dos nomes previsíveis e que suscitou polémica nos debates de auscultação, disse Estefan Mataveia, é o de Uria Simango, pai do edil da Beira e presidente do MDM, Daviz Simango, e um dos fundadores da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), supostamente fuzilado por alegada traição ao partido.
"Atendendo a que, aquando da independência, no país vigorava o regime único, mono partidário, e que a agora a Beira está a ser governada pelo MDM, a população quis saber como iria ser" e se alguns nomes continuam a ser vistos como "reaccionários", assinalou Matavela.
Em simultâneo com as auscultações às populações, decorreram reuniões separadas com membros do MDM e Frelimo, os únicos partidos representados na AMB, uma vez que a Renamo (Resistência Nacional Moçambicana) boicotou as últimas autárquicas, incluindo na Beira, o principal bastião do maior partido de oposição em Moçambique.
António Domingos, chefe da bancada da Frelimo na AMB, também considera importante a substituição dos nomes da cidade da Beira, considerando que a nova toponímia deve obedecer em primeiro lugar à "unidade nacional", uma das "bandeiras" do partido no Governo em Moçambique desde a independência, em 1975.
"Aqui não entra política, temos que saber de facto o que uma pessoa fez na vida do povo moçambicano, o que fez na vida do desporto, o que fez na vida do campo cultural. E porque não um combatente da luta de libertação nacional [dirigida pela Frelimo]?", questionou António Domingos, defendendo que os nomes devem ser consensuais.
Para o deputado municipal, os nomes portugueses, incluindo militares do exército, devem ser substituídos por "heróis moçambicanos", contribuindo para que a nova geração conheça os sacrifícios da independência de Moçambique.
"Mouzinho de Albuquerque, pela história, porque foi atribuído o nome dele a uma rua da Beira? Foi ele que deportou Gungunhana [último monarca de Gaza e resistente do colonialismo], o nosso herói, para Portugal. Há sentido de ainda o manter?", prosseguiu.
Contudo, a Frelimo não vê, por exemplo, sentido que André Matsangaissa, fundador da Renamo e morto durante a guerra civil com o Governo da Frelimo, continue a ter também o seu nome numa praça da Beira, caso único em todo o país, insistindo que a toponímia não deve ser politizada.
A auscultação foi dirigida à população dos postos administrativos da Munhava central, Inhamizua, Nhangau e Chiveve, que perfazem a totalidade dos 26 bairros da cidade da Beira.
Fonte: LUSA - 07.12.2015
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