sábado, outubro 09, 2010

Pobreza, caminhos e futuro

Por Jeremias Langa

No entanto, a realidade dos números do INE é inversamente proporcional às metas, aos discursos e às acções desenvolvidas: em termos nacionais, a pobreza estagnou – não baixou, mas também não aumentou mas o número de moçambicanos vivendo abaixo da considerada linha de pobreza subiu de 9 milhões para 11,8 milhões; 

A 3ª Avaliação Nacional de Pobreza em Moçambique, do Instituto Nacional de Estatística, vulgo Inquérito ao Orçamento Familiar (IOF), correspondente a 2008-2009, trouxe-nos a inquietante conclusão de que, afinal, ao contrário dos discursos, não estamos a fragilizar a pobreza. Mais ainda: que em termos globais, a pobreza ou aumentou, ou na pior das hipóteses, manteve-se estável, nos últimos seis/sete anos.
É uma conclusão inquietante, primeiro porque a meta oficial do Governo era reduzir a pobreza até 45% em 2009. No entanto, os dados nacionais apontam que ela estagnou entre 2002/2003 e 2008/2009 e em 2009 estava nos 54,7%. Segundo, porque nunca o combate à pobreza esteve tão no topo da agenda, neste país, como na governação do Presidente Guebuza.
Na verdade, nos últimos seis anos, o combate à pobreza passou a agenda nacional, com planos específicos - os famosos PARPA´s 1 e 2 -, e inegáveis acções como a eleição dos distritos como pôlos de desenvolvimento, a descentralização administrativa e financeira, maior enfoque aos distritos por parte do Chefe de Estado através das suas Presidências Abertas e mais recentemente também às localidades e, como cereja no bolo, a institucionalização do Fundo de Desenvolvimento Distrital, vulgos “7 mIlhões”.
No entanto, a realidade dos números do INE é inversamente proporcional às metas, aos discursos e às acções desenvolvidas: em termos nacionais, a pobreza estagnou – não baixou, mas também não aumentou (os 0,6% de agravamento constantes do inquérito são estatisticamente pouco significativos e situam-se na margem de erro deste tipo de estudos), mas o número de moçambicanos vivendo abaixo da considerada linha de pobreza subiu de 9 milhões para 11,8 milhões; o índice de desigualdades sociais manteve-se inalterável, o que quer dizer que a tão ansiada redistribuição da renda não está a acontecer – os ricos continuam (mais) ricos e os pobres (mais) pobres, reflectindo a tensão profunda entre acumulação e distribuição e confirmando, de alguma forma, que os padrões económicos que geram riqueza para a minoria geram pobreza para a maioria.
Mais: nota-se um moderado aumento da pobreza rural de 55,3% em 2002/2003 para 56,9% em 2008/2009, num contexto em que o distrito é o pôlo de desenvolvimento e o Chefe de Estado presta particular atenção ao campo. Por outro lado, a pobreza urbana mantém-se num patamar muito alto, apesar da surpreendente melhoria (passou de 51,5% em 2002/2003 para 49,6%em 2008/2009).
Em termos regionais, a zona centro regista um aumento médio de 14% de incidência de pobreza, resultante do agravamento do padrão de consumo em três das quatro províncias (Zambézia à cabeça e ainda Sofala e Manica), dados perturbadores para a estabilidade futura do país, porque podem ser politicamente aproveitados por pessoas mal-intencionadas para projectar a ideia de que os 9 milhões de moçambicanos naquela região estão a ser excluídos de forma deliberada.
O ministro da Planificação e Desenvolvimento procurou desvalorizar estes dados do INE. Em 2002/2003, quando os dados 2ª Avaliação Nacional da Pobreza mostravam, então, redução da pobreza em 15,3%, o Governo celebrou-os merecidamente como uma conquista sua. Agora que os dados não são favoráveis, temos de ter a humildade de saber olhá-los com a mesma credibilidade que lhes creditámos em 2002/2003 e, mais importante que tudo, a partir destes dados, tentarmos revisitar as nossas próprias estratégias. Agora, o que não podemos é fazer é prevalecer as nossas ideias pré-concebidas sobre os dados estatísticos, sem apresentarmos contrapormos com argumentos sólidos. Para isso, não vale a pena fazermos estatística nem ter o INE a funcionar. Usamos a funcionar as nossas próprias sensibilidades para a tomada de decisões.
Em abono da verdade, os dados do IOF, tal como os acontecimentos de 1 e 2 de Setembro, convocam-nos, com urgência, a um repensar das nossas próprias convicções, a fazermos uma reflexão profunda e a interrogarmo-nos sobre a nossa própria acção neste desiderato de combate à pobreza. Neste momento, de repente, perguntas que, noutras circunstâncias, seriam fúteis, tornaram-se relevante: por que é marginal a eficácia do crescimento económico em reduzir a pobreza? A nossa economia cresce a um ritmo médio de 6/8%, nos últimos anos, mas o índice de pobreza de consumo diminui muito pouco.
Mas há mais perguntas: estamos a fazer bem o combate à pobreza? A usar os instrumentos certos e a alocar os recursos adequados? E a nossa é a única forma de o fazer? Será a estratégia política de virarmo-nos para as zonas rurais que não está a resultar, ou antes é a forma como essa estratégia está a ser implementada? Se um dos maiores problemas que as populações rurais tinham para fazer o “take-off” era a dificuldade de acesso aos recursos financeiros, por que os 7 milhões, em seis anos, não permitiram a redução da pobreza no campo e mantiveram tudo praticamente na mesma, como sugerem os dados do IOF?
No caso da pobreza urbana, que entrou na onda, agora, a estratégia de replicar a experiência da terapia rural, dando 7 milhões às cidades, como se fez com os distritos rurais, é suficiente para resolver o problema? Por acaso, se teve em conta as especificidades típicas dos centros urbanos e se interrogou por que os 7 milhões não geram o efeito desejado no campo? Por que o empreendedorismo, tão exaltado, repetido e recomendado a muitos jovens desempregados neste país, só produz os mesmos nomes como empreendedores de referência nas mais diversificadas áreas?
Como disse, e bem, o Prof. Dr. Jorge Ferrão, magnífico reitor da UniLúrio, o país não tem mais tempo para errar. O primeiro passo para isso, acrescentamos nós, é pararmos e pensar o país que queremos e como o queremos ...

Fonte: O País online - 09.10.2010

2 comentários:

Danilo Sergio Pallar Lemos disse...

Morei em Inhaminga na província de Sofala, de 96 a 99 realmente lá naquelas regiões, se ve a carencia.
Mas Moçambique é lindo e uma Nação muito amiga.
www.vivendoteologia.blogspot.com

Anónimo disse...

O maior esforço que está ser feito pelo partido no poder é de nunca perder as eleiçoes. A Frelimo aceita perder tudo, menos as eleiçoes, dai que a riqueza que país produz nao usada para reproduzir mas sim para manter o controlo das forças opostas. E todo dinheiro que nao usado para o investimento pende a provocar inflaçao. Portando, no lugar de querer se manter no poder por governar bem, prefere se manter no poder enfraquecendo os opositores.