A talhe de foice
Por Machado da Graça
Celebrou-se, recentemente, o Dia Contra a Corrupção e o Centro de Integridade Pública assinalou o momento com várias publicações, incluindo um cartaz que, muito apropriadamente, afirmava que “corrupção é porcaria”, ilustrado com a imagem de dois porcos com ar bastante corrupto.
E creio que o tema foi bastante bem escolhido, para abanar um pouco algumas ideias feitas que se começam a consolidar por aí e que tendem a encarar a corrupção como coisa quase normal.
Frases como “corrupção não é só aqui, há em todo o lado” e outras do mesmo tipo tendem a diminuir a culpa dos corruptos, diluindo-a num processo mais geral e internacional.
Ora eu creio que esse espírito de deixar os corruptos andar deve ser fortemente combatido.
Devemos ter consciência de que aqueles que metem as mãos sujas nos cofres do Estado, para roubar o que é de nós todos, são como porcos a chafurdar nas suas pocilgas. São sanguessugas repugnantes a chupar o nosso sangue.
E não nos deixemos enganar pela sua aparência.
Eles podem aparecer vestidos com roupas elegantes, bons sapatos e circulando em carros de luxo a caminho das suas enormes mansões. Com ar de serem os mais respeitáveis dos cidadãos.
Mas se formos a ver bem de perto, o aspecto dessa gente não é nada diferente do de muitos dos condenados que estão encarcerados nas nossas prisões. Porque muitos desses ricaços fazem exactamente o mesmo que fizeram os bandidos encarcerados: roubaram o que não era deles. E esses roubos, em muitos casos, provocam desgraças sociais muito mais graves do que as causadas pelos pequenos malfeitores.
Se um funcionário do Ministério da Saúde desvia fundos daquele ministério, pode estar a provocar a impossibilidade de se comprarem medicamentos ou equipamentos necessários para salvar vidas humanas.
Se alguém ligado às Obras Públicas desvia fundos destinados à construção de uma ponte ou de uma barragem, a qualidade destas obras pode ser posta em causa e vir a provocar desastres de enorme dimensão.
Portanto, ao olharmos para as mãos de um corrupto, não as devemos ver limpas e com as unhas tratadas na manicura. Devemos ver a lama e o sangue que as cobre, pingando para cima das suas calças bem alinhadas e dos seus sapatos do mais fino cabedal.
Antes as mãos sujas, pelo trabalho, de um honesto operário do que as mãos enganosamente limpas dos corruptos.
Os responsáveis superiores do nosso Estado já gozam de grandes regalias e mordomias, que podem ser consideradas legais, embora, muitas vezes, sejam exageradamente ilegítimas. O recente caso da reabilitação da casa de Eduardo Mulembwe é um exemplo claro desse tipo de exagero.
Mas, aparentemente, para muitos deles essas mordomias não são consideradas suficientes e apenas abrem o apetite para novas riquezas, estas já claramente ilegais e criminosas.
Tudo isto alimentado, na maior parte dos casos, pela impunidade que reina, reforçada pela rede de cumplicidades que se estende, de forma generalizada, com os corruptos encobrindo-se uns aos outros, cada um na sua área de acção e influência.
É por isso que todos temos que olhar para o fenómeno da corrupção com grande nojo, com toda a repugnância.
Para que os corruptos não se sintam socialmente aceites. Para que sintam que nós os consideramos ao mesmo nível que os porcos nas pocilgas.
Sujos e malcheirosos.
Fonte: Savana (18.12.2009)
Reflectindo: Boa contribuicão esta de Machado da Graça no combate à corrupção. A outra iniciativa bastante boa é esta difundida pelo Oxalá aqui. Com o caso de ADM é ou não é que podemos saber quem tem mãos limpas de roubalheira?
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