Ou quando os Comícios servem de «Cover-ups»...
Canal de Opinião: por Noé Nhantumbo
Beira (Canal de Moçambique) - A tentativa de fazer da figura de comício um meio privilegiado de comunicação com os cidadãos, uma vez chamados de povo, outras vezes de massas populares, desvirtua a democracia e torna-a um espectáculo medíocre. No lugar de manifestação e auscultação genuína dos anseios dos cidadãos ficamos com um exercício de falsa auscultação, onde se apresentam queixas razoáveis no entender dos que dirigem os comícios e se recebem as respostas consideradas convenientes.
Nada é mais claro do o título numa situação de governo democrático.
As malhas tecidas pelo governo, a sua acção concreta, as suas opções, nada deve colocá-lo numa situação de entidade inquestionável e logo longe da responsabilização.
O comício popular tão querido dos socialistas é a maneira mais refinada de ultrajar a democracia e tirar sentido ao direito do cidadão de saber o que faz quem o governa, como são utilizados os fundos públicos, como é que o governo do país procede em seu nome nos fóruns internacionais. Quando o método é o comício fica sempre um vazio no capítulo das respostas. Por um lado ninguém se atreve a fazer pronunciamentos significativos que questionem a ordem do dia numa reunião desse tipo. Por outro lado, os cidadãos organizados pelas estruturas omnipresentes dos partidos não tem a coragem suficiente para se colocarem no pódio e lá desferirem ataques demolidores contra aqueles que estão dirigindo tais encontros.
O direito de conhecer que os cidadãos em princípio possuem e que é um dos fundamentos da democracia, não se realiza pela via do comício e é por saberem disso que os governantes oligárquicos optam sempre por esta forma de comunicação de massas.
Ninguém nega a necessidade e existência de arranjos que pela sua natureza e sensibilidade devem ser ou permanecer secretos. Mas isso não significa que comissões parlamentares especificas não tenham o direito e obrigação de receber informação atempada sobre tais operações ou assuntos. Um governo democrático não pode em nenhuma circunstância colocar-se numa situação de independência absoluta para com os outros órgãos do poder.
O fundamento da democracia repousa na responsabilização e na obrigação que os titulares dos diferentes órgãos públicos tem de responder aos cidadãos pelas vias estabelecidas.
As acções dos governantes não podem nem devem aparecer encobertas num manto de secretismo de justificações que nunca colam. É mentira e inaceitável quando nos dizem que não devemos saber quanto é que pagaram a firma de advogados que aconselhou o governo no negócio da Hidroeléctrica de Cabora Bassa. Assim como é inaceitável que o Parlamento não saiba como são negociados os recursos minerais deste país.
Não é por acaso que em São Tome se criou uma entidade responsável por negociar e comunicar os resultados a volta do dossier petróleo.
A democracia é algo concreto que obedece a regras e a procedimentos controláveis.
Anunciar num comício que Cabora Bassa é nossa é uma coisa relativamente simples. Mas os moçambicanos não são tão ingénuos que não queiram saber como foi feito tal transferência, quais são as contrapartidas, modalidades de pagamento, a estrutura de accionistas, o modelo de gestão concebido, tudo isso e mais.
Não basta dizer que assinamos um contrato de exploração do carvão de Moatize com a Vale do Rio Doce e depois se fecharem em copas. Como governo tem a obrigação de informar ao Parlamento quais foram os contornos do negócio e o que o país vai efectivamente receber em termos de contrapartidas financeiras. Há que saber como anda o assunto das areias pesadas de Moma e de Chibuto. O tempo em que selavam contratos com a União Soviética de pesca ou de exploração pedras preciosas e ninguém chegava a saber o que tinha sido feito e como, não é propriamente este.
Passam trinta e três anos de independência. Demasiado tempo para que se continue com a prática socialista do comício como instrumento privilegiado de debate que como sabemos não é. Não se pode negar que o meio é adequado para comunicar com populações pouco letradas. Mas não se deve esgotar o tema por aí e ficar a coberto disso para realizar actos fora do escrutínio democrático estabelecido.
Está sendo negada aos moçambicanos a oportunidade de debater os seus problemas e de sugerirem soluções. As chamadas organizações da sociedade civil seguem uma linha de orientação e de acção que as afasta dos cidadãos. Tornam-se ninhos úteis para a comunicação dos anseios dos governantes e nunca se as encontra debatendo em profundidade os desvios que vemos anualmente anunciados pelo Tribunal Administrativo. A qualidade de serviços de policiamento que possuímos é tratada de maneira leve. As discrepâncias entre o que a lei diz e a prática no que se refere a compra e venda de talhões urbanos para a construção são ignorados. Milhões de hectares de terra repousam nas mãos de uns poucos cidadãos e quando surge a oportunidade, vemos os mesmos estabelecendo parcerias para a construção de refinarias de petróleo.
Essa maneira de gerir os assuntos nacionais, essa maneira de governar o bem comum, a nação, está longe dos critérios democráticos que nos dizem de boca cheia que abraçam.
As decisões marcadamente top-down, a ausência efectiva de debates visando construir consensos e sentido de pertença, estão se tornando em verdadeiros constrangimentos neste país.
Os cover-ups valem por si mas nunca substituem a verdade.
Embora nem sempre digerível e de aceitação fácil, a verdade deve ser um objectivo e critério de avaliação do que os governantes fazem. O que lhes parece serem saídas porque proporcionam lucros e mais poderes podem estar a ser os becos sem saída de amanhã.
Ninguém é perfeito e os nossos governantes também não são super-homens. Reconhecê-lo não faz mal a ninguém.
Simplicidade, humildade, austeridade, capacidade de mostrar coerência e uso criterioso dos bens públicos que lhes estão confiados, moralidade pública e privada de alto nível são o que os cidadãos pretendem ver dos seus governantes.
Canal de Opinião: por Noé Nhantumbo
Beira (Canal de Moçambique) - A tentativa de fazer da figura de comício um meio privilegiado de comunicação com os cidadãos, uma vez chamados de povo, outras vezes de massas populares, desvirtua a democracia e torna-a um espectáculo medíocre. No lugar de manifestação e auscultação genuína dos anseios dos cidadãos ficamos com um exercício de falsa auscultação, onde se apresentam queixas razoáveis no entender dos que dirigem os comícios e se recebem as respostas consideradas convenientes.
Nada é mais claro do o título numa situação de governo democrático.
As malhas tecidas pelo governo, a sua acção concreta, as suas opções, nada deve colocá-lo numa situação de entidade inquestionável e logo longe da responsabilização.
O comício popular tão querido dos socialistas é a maneira mais refinada de ultrajar a democracia e tirar sentido ao direito do cidadão de saber o que faz quem o governa, como são utilizados os fundos públicos, como é que o governo do país procede em seu nome nos fóruns internacionais. Quando o método é o comício fica sempre um vazio no capítulo das respostas. Por um lado ninguém se atreve a fazer pronunciamentos significativos que questionem a ordem do dia numa reunião desse tipo. Por outro lado, os cidadãos organizados pelas estruturas omnipresentes dos partidos não tem a coragem suficiente para se colocarem no pódio e lá desferirem ataques demolidores contra aqueles que estão dirigindo tais encontros.
O direito de conhecer que os cidadãos em princípio possuem e que é um dos fundamentos da democracia, não se realiza pela via do comício e é por saberem disso que os governantes oligárquicos optam sempre por esta forma de comunicação de massas.
Ninguém nega a necessidade e existência de arranjos que pela sua natureza e sensibilidade devem ser ou permanecer secretos. Mas isso não significa que comissões parlamentares especificas não tenham o direito e obrigação de receber informação atempada sobre tais operações ou assuntos. Um governo democrático não pode em nenhuma circunstância colocar-se numa situação de independência absoluta para com os outros órgãos do poder.
O fundamento da democracia repousa na responsabilização e na obrigação que os titulares dos diferentes órgãos públicos tem de responder aos cidadãos pelas vias estabelecidas.
As acções dos governantes não podem nem devem aparecer encobertas num manto de secretismo de justificações que nunca colam. É mentira e inaceitável quando nos dizem que não devemos saber quanto é que pagaram a firma de advogados que aconselhou o governo no negócio da Hidroeléctrica de Cabora Bassa. Assim como é inaceitável que o Parlamento não saiba como são negociados os recursos minerais deste país.
Não é por acaso que em São Tome se criou uma entidade responsável por negociar e comunicar os resultados a volta do dossier petróleo.
A democracia é algo concreto que obedece a regras e a procedimentos controláveis.
Anunciar num comício que Cabora Bassa é nossa é uma coisa relativamente simples. Mas os moçambicanos não são tão ingénuos que não queiram saber como foi feito tal transferência, quais são as contrapartidas, modalidades de pagamento, a estrutura de accionistas, o modelo de gestão concebido, tudo isso e mais.
Não basta dizer que assinamos um contrato de exploração do carvão de Moatize com a Vale do Rio Doce e depois se fecharem em copas. Como governo tem a obrigação de informar ao Parlamento quais foram os contornos do negócio e o que o país vai efectivamente receber em termos de contrapartidas financeiras. Há que saber como anda o assunto das areias pesadas de Moma e de Chibuto. O tempo em que selavam contratos com a União Soviética de pesca ou de exploração pedras preciosas e ninguém chegava a saber o que tinha sido feito e como, não é propriamente este.
Passam trinta e três anos de independência. Demasiado tempo para que se continue com a prática socialista do comício como instrumento privilegiado de debate que como sabemos não é. Não se pode negar que o meio é adequado para comunicar com populações pouco letradas. Mas não se deve esgotar o tema por aí e ficar a coberto disso para realizar actos fora do escrutínio democrático estabelecido.
Está sendo negada aos moçambicanos a oportunidade de debater os seus problemas e de sugerirem soluções. As chamadas organizações da sociedade civil seguem uma linha de orientação e de acção que as afasta dos cidadãos. Tornam-se ninhos úteis para a comunicação dos anseios dos governantes e nunca se as encontra debatendo em profundidade os desvios que vemos anualmente anunciados pelo Tribunal Administrativo. A qualidade de serviços de policiamento que possuímos é tratada de maneira leve. As discrepâncias entre o que a lei diz e a prática no que se refere a compra e venda de talhões urbanos para a construção são ignorados. Milhões de hectares de terra repousam nas mãos de uns poucos cidadãos e quando surge a oportunidade, vemos os mesmos estabelecendo parcerias para a construção de refinarias de petróleo.
Essa maneira de gerir os assuntos nacionais, essa maneira de governar o bem comum, a nação, está longe dos critérios democráticos que nos dizem de boca cheia que abraçam.
As decisões marcadamente top-down, a ausência efectiva de debates visando construir consensos e sentido de pertença, estão se tornando em verdadeiros constrangimentos neste país.
Os cover-ups valem por si mas nunca substituem a verdade.
Embora nem sempre digerível e de aceitação fácil, a verdade deve ser um objectivo e critério de avaliação do que os governantes fazem. O que lhes parece serem saídas porque proporcionam lucros e mais poderes podem estar a ser os becos sem saída de amanhã.
Ninguém é perfeito e os nossos governantes também não são super-homens. Reconhecê-lo não faz mal a ninguém.
Simplicidade, humildade, austeridade, capacidade de mostrar coerência e uso criterioso dos bens públicos que lhes estão confiados, moralidade pública e privada de alto nível são o que os cidadãos pretendem ver dos seus governantes.
A chefia da nação deve ser capaz de mostrar o exemplo e exigir dos seus colaboradores o mais alto nível de desempenho e de condições morais para o exercício de suas funções.
O que os outros fazem no capítulo do rastreio aos seus governantes deve se tornar prática entre nós. Sem uma equipa governamental livre de suspeitas de corrupção e nepotismo, sem governantes limpos não se pode construir uma democracia credível.
Mesmo que tenham o suporte e cobertura do chefe, os governantes devem deixar a arrogância de lado e mostrar que são, afinal, servidores bem pagos de um povo que espera deles desempenho de qualidade e não manobras ou cover-ups. Os moçambicanos não querem continuar a pagar altos salários para ministros-empresários.
As mentiras que enchem páginas dos jornais, as aparições programadas na televisão, vendem uma imagem que não se possui. Esta exploração oficial da mentira atrasa o desenvolvimento do país e lesa os moçambicanos.
Existe uma grosseira interferência na comunicação social pública que é obrigada a difundir posições muitas vezes fora de contexto e mesmo mentiras.
Existe uma comercialização crescente da vida pública, os esquemas persistem em comandar aquilo que se faz na esfera público-governativa. Isso corrói o tecido social, mina o desenvolvimento nacional e impede que os moçambicanos usufruam com dignidade o que fazem por seu país e o que seu país pode fazer eles.
Fonte: Canal de Moçambique (2008-07-01 07:01:00)
O que os outros fazem no capítulo do rastreio aos seus governantes deve se tornar prática entre nós. Sem uma equipa governamental livre de suspeitas de corrupção e nepotismo, sem governantes limpos não se pode construir uma democracia credível.
Mesmo que tenham o suporte e cobertura do chefe, os governantes devem deixar a arrogância de lado e mostrar que são, afinal, servidores bem pagos de um povo que espera deles desempenho de qualidade e não manobras ou cover-ups. Os moçambicanos não querem continuar a pagar altos salários para ministros-empresários.
As mentiras que enchem páginas dos jornais, as aparições programadas na televisão, vendem uma imagem que não se possui. Esta exploração oficial da mentira atrasa o desenvolvimento do país e lesa os moçambicanos.
Existe uma grosseira interferência na comunicação social pública que é obrigada a difundir posições muitas vezes fora de contexto e mesmo mentiras.
Existe uma comercialização crescente da vida pública, os esquemas persistem em comandar aquilo que se faz na esfera público-governativa. Isso corrói o tecido social, mina o desenvolvimento nacional e impede que os moçambicanos usufruam com dignidade o que fazem por seu país e o que seu país pode fazer eles.
Fonte: Canal de Moçambique (2008-07-01 07:01:00)
3 comentários:
Meu irmão, o post é interessante. E o que se diz em relação a Sociedade Civil me atingiu e pode ser verdade, não seria eu funcionário duma dessas OSC.Alias, um estudo recente da FDC se refere a esse facto. Contudo, me tranquiliza o facto de muitas OCS estarem a dspertar e a que nela labuto promove na proxima semana uma conferencia internacional que irá dscutir os desafios e constrangimentos da sociedade Civil. Mas isso ainda é muito pouco, precisamos é que cada um de nós continue a fazer a sua parte, como tu o fazes com este post.
abraço
Meu irmão Jorge, de facto, uma das impotantíssimas coisas é cada um fazer e continuar a sua parte. Li algumas linhas do Notícias sobre o relatório da FDC e eu acho que é isso muito importante. Acredito que se a maioria das OSC for indenpendente, as mudancas na governacão serão notáveis e cada um de nós sentirá membro da sociedade.
Mas e' preciso que a OSC deixe de gatinhar, corra!
Enviar um comentário