Charles Baptista
O ministro da Educação e Cultura, Aires Aly, no seu regresso de uma visita à República Popular da China, disse, para o espanto de muitos cidadãos, que o Governo de Moçambique vai ponderar a possibilidade de se introduzir o ensino no País do mandarim – a língua que se fala na China. Se o Vietname continuar a oferecer-nos arroz, vamos aprender a língua deles em vez de lhes pedirem que nos ensinem como também produzirmos alimentos.
Avançou como razões de fundo o facto de o mandarim ser falado por quase 1,5 bilião de almas e a contribuição que a China tem dado a Moçambique.
Citou como exemplos a construção do Centro Internacional de Conferências Joaquim Chissano, o edifício do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, as obras na Estrada Nacional N1, troço Muxúngwè – Inchope. Esqueceu-se de dizer que a China vai construir a ponte, economicamente inviável, sobre o Rio Rovuma, mahala. Um dia, a Índia constrói um shopping em Lichinga, e teremos de aprender o gujarati.
Somos dos poucos países africanos que 30 anos depois da Independência ainda não introduzimos nas escolas o ensino das línguas nacionais. Não há, até ao presente, um estudo sistematizado das nossas línguas. Há casos em que os netos não se comunicam
com os avós devido à barreira da língua. Milhões de moçambicanos continuam alheios ao manancial estrutural das nossas línguas.
As nossas crianças não falam a extensa e rica língua macua, não há onde aprendê-la. O vigoroso e expressivo shona é falado pelos “ultrapassados”. O doce e empolgante tsonga não goza da melhor sorte.
A morte lenta das nossas línguas deve-se à ausência de políticas claras neste domínio.
Ignorar as nossas línguas é um dos pecados mortais que os sucessivos Governos do nosso País cometem contra o povo: tercializar as nossas línguas. A desculpa oficial que se conhece é de que existem mais de 100 línguas. Não há vontade política em que as nossas línguas sejam valorizadas.
Não sabemos falar nem escrever as nossas línguas, mas vamos ter que aprender o mandarim! A razão do nosso subdesenvolvimento está nas nossas mentes e não na falta de recursos. A nossa pobreza reside mais na falta de orgulho e da visão estereotipada do futuro.
A nossa pobreza absoluta reside nas cabeças das pessoas que não cumprem com as suas obrigações como bons governantes.
Um povo que não conhece o poder e a riqueza da sua cultura não pode ganhar a batalha contra o subdesenvolvimento.
A luta contra a pobreza é, eminentemente cultural. Ela não se circunscreve nos discursos dos gabinetes com ar condicionado e água mineral.
Teria sido uma boa nova dizer que o Governo vai contratar linguistas para nos ajudar a escrever a gramática e os livros do ensino das nossas línguas.
Quem não se conhece não pode conhecer os outros.
Antes do mandarim, paquistanês, iraquiano, filipino, indonésio, afegão, etc., queremos aprender macua, shona e ronga! Parem de brincar com o povo! Onde moram as nossas línguas?
CORREIO DA MANHÃ(Maputo) – 16.12.2005
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