Editorial
Um ano após Joaquim Chissano ter cessado as funções na presidência da República e a há igual período da ascensão de Guebuza ao “trono”, o País navega incerto na direcção do porto, que parece errante, no destino que se pretende atingir desde a independência nacional.
Qual é o plano de Guebuza?Combater a pobreza absoluta, o HIV/ SIDA, burocracismo e a corrupção. Irá ele conseguir atingir o seu objectivo? Talvez sim.
Onde é que peca o Governo de Guebuza a ponto de o mesmo não ser nada relevante comparativamente ao do Chissano.
Simplesmente por dar primazia aos discursos, em detrimento de acções. Irá Guebuza combater a pobreza com discursos? Irá Guebuza, só, capitanear um barco, onde os seus coadjuvantes, hibernados, procuram atingir os propósitos anteriores à sua nomeação?
É aqui onde não há excepção à regra. O Governo de Guebuza entrou num período de hibernação (por exemplo o atendimento público a cidadãos lançado por Alberto Vaquina na Casa dos Bicos parou como iniciou –abruptamente), que esperamos seja um momento de revitalização. De tempo em tempo assistimos o emergir do ministro Garrido, esse, qual o chefe da casa das máquinas, vem desmentir o evidente sinal de um barco encalhado, no rumo que auguraram iriam encetar em direcção à costa, depois o mesmo volta à posição estanque. Portanto, embutidos em receios os passageiros seguem a bordo do barco. Ao presidente Guebuza não lhe falta arrojo nem imaginação.
Enunciou visíveis sinais e métodos capazes de distrair a maioria, primeiro, reacendendo a discussão do herói e não-herói deste País, depois o círculo vicioso do Gwaza Muthini, inaugurações à época de Canhú e o compulsivo alistamento de cidadãos na Frelimo. Ele procura encontrar aquilo que falta no seu Governo: uma plateia delirante. Será a mesma que funcionará como a sua caixa de ressonância, sabido os ministros, governadores, o que é extensivo a comissários do partido, o têm imitado com “sucesso”.
A visão que este Governo pretende trazer é que só é nacionalista aquele que se faz ao seu caminho, ou senão, à “linha correcta” do partido que dirige.
Eis porque um ano depois Guebuza nada trouxe de novo ou em nada veio a acrescentar à visão de Chissano, que se dizia caíra em letargia, permitindo toda a espécie de desordem: assalto aos bancos e ao tesouro, com que lucrou o próprio “establishment”.
O povo moçambicano não estava a espera e nem tinha saudades do amargo período monolítico, em que por regra o partido e o presidente se converteram em religião, a qual a sociedade devia professar, como o seu ópio.
Em nossa óptica, deste Governo que faz questão de reunir os métodos e instrumentos para distrair o povo, se espera sirva de guardião da justiça, no lugar de apertar o cerco às liberdades dos cidadãos. Deste Governo espera-se que venha a recuperar parte ou a totalidade dos 400 milhões de dólares de créditos malparados dos Bancos Austral e ex-BCM. Deste Governo que se diz implacável no combate ao deixa andar espera-se que ponha ao fim à inércia que reina sobre a nossa justiça, onde processos criminais dormitam há vários anos (Casos Beirão, Chivavice Muchangage – ironicamente por este Executivo nomeado para dirigir um dos distritos de Tete, Alcido Ngoenha, registo do Património do estado em nome da Frelimo, assassinato a sangue frio e em série do juiz N’kutumula, sua esposa e cunhado, 40 toneladas de haxixe, Amin-Amin que nos anos 80 roubou quatro biliões ao estado, tentativa de assassinato ao advogado Albano Silva, assassinato do músico Pedro Langa, cinco toneladas de haxixe sem dono na Beira).
Espera-se que este Governo venha imprimir mudanças efectivas, que possam viabilizar a atracção do investimento externo, pois não se entende o motivo porque o processo corre por 116 dias. Em contrapartida, sem investimento, num País com 54 por cento de cidadãos na pobreza absoluta, será vão falar do combate à HIV/SIDA.
Tudo aponta que Guebuza não tem procurado superar a imagem alcançada por Chissano no respeitante a promoção da democracia e boa governação. O clientelismo político tende a ser um instrumento para premiar os seus correligionários (veja-se o caso de Filipe Paúnde, governador de Nampula, tido como facilitador de seus amigos em concursos públicos). E não só, as medidas avançadas no sector da saúde não constituem o prenúncio da xenofobia, num País carente de médicos que possam realizar com sucesso a tarefa que será deixada em aberto pelos especialistas russos?
Resultado das expectativas defraudadas, ganha impulso um amplo movimento constituído por saudosistas de Chissano. São os mesmos que se acercando do Presidente Guebuza o ofuscam, enquanto ele vai embalado na coisa do culto ao poder, ao que Chissano, diferentemente de Samora Machel, em nada se importava.
Em suma: um ano depois da ascensão de Guebuza nos parece que a maior oposição que este Governo enfrenta é a do Chissano, que de resto, dando o dito pelo não dito, continua em força na política activa, contrariamente ao real líder oposicionista, Afonso Dhlakama, que se mostra inflexível e sem faro político para lançar uma visão alternativa às Frelimo de Chissano e Guebuza.
PÚNGUÈ – 07.03.2006
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