quinta-feira, janeiro 18, 2018

PGR moçambicana acusada de inação e mutismo na investigação do assassinato de políticos

As autoridades moçambicanas não investigaram pelo menos 10 homicídios ou tentativas de homicídio com fortes motivações políticas, desde Março de 2015, cujas vítimas foram o constitucionalista Gilles Cistac, o secretário-geral da Renamo, Manuel Bissopo, os altos oficiais da Renamo, o administrador de Tica (Sofala), Jorge Abílio, e, recentemente, o presidente do município de Nampula e membro do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Mahamudo Amurane, de acordo com a organização internacional Human Rights Watch (WHR), que acusa a Procuradora-Geral da República (PGR), Beatriz Buchili, de mutismo em relação ao assunto, que, também, não tem merecido esclarecimento que se espera ao nível do Serviço de Nacional de Investigação Criminal (SERNIC). Nem sequer existe um suspeito.
Beatriz Buchili “ainda não respondeu à carta da Human Rights Watch”, que lhe foi endereçada em Setembro de 2016, sobre “as medidas que o seu gabinete tomara para investigar ou julgar” os casos em alusão. A Polícia, cuja responsabilidade é conduzir investigações criminais, “não concluíra” alguma investigação “nem foi capaz de identificar nenhum suspeito”.
Os casos em alusão dizem respeito, por exemplo, ao chamado bárbaro e cobarde assassinato a tiros de Gilles Cistac, a 03 de Março de 2015, no exterior de um café no centro de Maputo.
A morte de Cistac aconteceu numa altura em que a Renamo, o maior partido da oposição no país, manifestava a sua indignação e total rejeição dos resultados das eleições gerais de 2014, e exigia governar em seis províncias onde reivindica vitória.
Ao contrário do que a Frelimo e vários juristas defendiam, a “Perdiz” alegava que podia lograr tal administração porque a Constituição da República permitia.
Nesse contexto, Cistac – professor catedrático de Direito Constitucional e director-adjunto para a investigação e extensão na Universidade Eduardo Mondlane (UEM), a maior instituição de ensino superior no país – contrariou o discurso oficial, de ocasião, de interesse e disse ao @Verdade, pela primeira vez em exclusivo, em Janeiro de 2015, que a Renamo tinha cobertura constitucional para gerir de forma autónoma as províncias de Sofala, Manica, Tete, Nampula, Zambézia e Niassa, onde conquistou a maioria dos votos nas últimas eleições gerais.
Para o efeito, podia-se evocar o número 04, do artigo 273 da Constituição da República, sobre as “categorias das autarquias locais”, que determina que “a lei pode estabelecer outras categorias autárquica superiores ou inferiores à circunscrição territorial do município ou da povoação”. E em vez de “regiões autónomas”, passariam a se denominadas “províncias autónomas”, que é a designação mais abrange no âmbito da lei em alusão.
Segundo Cistac, apesar de a Constituição determinar que Moçambique se organiza territorialmente em províncias, distritos, postos administrativos, localidades e povoações, a “Perdiz”, quando falava de “região autónoma” referia-se à província.
A notícia correu Moçambique e o mundo como rastilho de pólvora, a contragosto daqueles que tinham entendimento diferente em relação à matéria em questão.
Coincidência ou não, após essas declarações o constitucionalista foi crivado de balas na manhã de 03 de Março de 2015, à saída de um café no cruzamento entre as avenidas Eduardo Mondlane e Mártires da Machava.
Recorde-se que, no ano passado, aquando da apresentação do seu informe anual referente a 2016, a guardiã da legalidade disse, respondendo a uma inquietação da Renamo, sobre a alegada demora e inação da PGR no esclarecimento do assassinato dos membros dos partidos da oposição e académicos no país, que são casos em instrução preparatória, exigem tempo para reunir provas.
Na ocasião, Beatriz Buchili afirmou que qualquer matéria de âmbito processual que seja divulgada viola o segredo de justiça e a presunção de inocência. Com este argumento, ela pedia, indirectamente, aos deputados para que entendessem e transmitem isso a quem representam, o povo.
Os assassinatos não cessaram. Pelo contrário, aumentaram perante uma espiral de silêncio das autoridades governamentais, em particular da Polícia e Justiça.
Segundo a HRW, no seu relatório intitulado «“O Próximo a Morrer”: Abusos das Forças de Segurança do Estado e da Renamo em Moçambique», foi divulgado em Maputo e diz respeito ao período de Novembro de 2015 a Dezembro de 2016, em 07 de Março de 2016, por exemplo, um alto oficial da Renamo na província de Inhambane, Aly Jane, foi encontrado morto após ter desaparecido quatro dias antes. O seu corpo, encontrado perto do Rio Nhanombe, entre os distritos de Maxixe e Homoíne, exibia sinais de violência.
A 08 de Outubro de 2016, “Jeremias Pondeca, membro da Renamo de uma equipa que preparava uma reunião entre o presidente Nyusi e o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, foi morto a tiro durante a sua corrida matinal na principal praia de Maputo, Costa do Sol. A família só teve conhecimento do seu homicídio no dia seguinte, após ter contactado as autoridades para reportar o seu desaparecimento, tendo-lhes sido dito que um cadáver não identificado, com ferimentos de bala, fora levado para a morgue. As investigações policiais preliminares sugerem que quatro homens que seguiam Pondeca de carro se aproximaram da vítima e dispararam dois tiros na cabeça e outro no abdómen, tendo depois fugido”, recorda a HRW.
Desde Outubro de 2015, os homens armados da Renamo foram implicados em homicídios de pessoas ligadas, ou que se acredita estarem ligadas, à Frelimo.
“Em Outubro de 2016, a Frelimo apresentou à Human Rights Watch os nomes de 15 membros que foram alegadamente assassinados, seis que foram alegadamente espancados e seis que foram alegadamente raptados nas províncias de Manica, Sofala, Inhambane e Nampula, entre Fevereiro de 2015 e Setembro de 2016, juntamente com as datas e locais dos alegados incidentes”.
A Frelimo disse que a Renamo era responsável pelos crimes, mas não forneceu qualquer informação que sustentasse a acusação. “A Human Rights Watch investigou seis dos casos, incluindo três dos assassinatos, e concluiu que estas vítimas foram mortas ou atacadas porque a Renamo aparentemente suspeitava que tivessem fornecido informações às forças de defesa e segurança do governo”, indica a organização internacional.

Fonte: @Verdade – 16.01.2018

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