terça-feira, abril 25, 2017

Caso LAM-Embraer: Afinal PGR investiga três arguidos

Paulo Zucula, antigo Ministro de Transportes e Comunicação é o terceiro arguido do caso. Os outros são: Mateus Zimba, antigo director da Sasol e da General Electric Oil & Gás em Moçambique e José Viegas, antigo PCA da LAM.
Os três arguidos têm as contas congeladas a mando da PGR

A Procuradoria Geral da República (PGR) em conexão com o caso de alegada corrupção na aquisição pelas Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) de duas aeronaves à fabricante brasileira Embraer anunciou, quarta-feira, que três arguidos estão a ser investigados.

Esta informação foi avançada pela Procuradora-Geral da República, Beatriz Buchili, na sua Informação Anual à Assembleia da República. Buchili não avan- çou os nomes mas o SAVANA sabe que se trata de Paulo Zucula, antigo ministro dos Transportes e Comunicações (MTC) do consulado Guebuza, José Viegas, antigo PCA das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) e Mateus Zimba, veterinário de formação e ex-director da Sasol Moçambique e, posteriormente, da General Electric Oil & Gás, cargo de que foi afastado após ter sido tornado público o seu envolvimento no “caso Embraer”. Zimba é o Agente “C”, que criou a Xihivelo, empresa usada para a drenagem das “luvas” envolvidas na aquisi- ção das aeronaves.


No relatório sobre as actividades da PGR de 2016, que apresentou à Assembleia da República, Beatriz Buchili declarou que a instituição instaurou um processo a 05 de Julho do ano passado, que se encontra em instrução preparatória, com os três arguidos em liberdade.

Ao que o SAVANA apurou, a Caso LAM-Embraer instrução preparatória está praticamente concluída e, nas próximas semanas, o processo será remetido ao Tribunal. O jornal sabe também que as contas dos três arguidos foram congeladas. Tal como aconteceu no processo das dívidas escondidas, a PGR ordenou a quebra do sigilo bancário para as contas dos três elementos arrolados no caso dos aviões.

Segundo o informe da PGR, uma vez que o caso tem ramificações internacionais, a PGR activou mecanismos de cooperação jurí- dica e judiciária com quatro paí- ses. O SAVANA sabe que os pa- íses são Estados Unidos (país que despoletou o caso), Brasil (onde foram negociados os aviões), Portugal (por onde passaram os USD800 mil) e São Tomé e Príncipe (onde foi criada a Xihivelo). Os procuradores moçambicanos que estão a investigar este processo viajaram para estes países para recolherem mais elementos. O SAVANA apurou também que há um funcionário superior de um dos grandes bancos locais que facilitou a operação de transferência dos montantes e criação de contas, dadas as ramificações dos bancos usados em São Tomé e Príncipe e Portugal com o banco local.

No informe, lê-se que o esquema de corrupção terá envolvido o pagamento de USD800 mil aos três arguidos como condição para a Embraer vender as duas aeronaves à LAM.

Para lograr os seus intentos e perante a impossibilidade de a empresa estrangeira retirar tal valor dos seus cofres, concertou com esta, com vista à sobrefacturação do custo das aeronaves, para que se beneficiasse da diferença resultante do preço real e do constante da factura”, diz a Informação Anual da PGR.

A negociação envolveu a cria- ção no estrangeiro (São Tomé) de uma empresa (Xihivelo) que abriu uma conta bancária por onde se fez a transferência do valor do esquema de corrupção.

“A aquisição das aeronaves foi efectuada com recurso a um empréstimo bancário, concedido por um banco moçambicano (BCI), mediante garantias emitidas pelo Estado”, afirma a informação da PGR.

Documentos da justiça brasileira divulgados no final do ano passado revelam que a Embraer terá pago USD800 mil a gestores da LAM e a um intermediário, também moçambicano, pela venda de duas aeronaves em 2009.
O valor foi depositado numa conta, em São Tomé e Príncipe, de uma sociedade fictícia propositadamente criada para actuar no esquema de corrupção.

O alegado esquema de suborno faz parte de pagamentos ilícitos que a fabricante brasileira terá efectuado em vários países e que obrigaram a Embraer a pagar USD225 milhões à justiça norte- -americana como parte de um acordo judicial para o encerramento do processo.

A justiça norte-americana envolveu-se no caso pelo facto de algumas das contas usadas nos alegados esquemas de corrupção da Embraer estarem domiciliadas em solo americano.

O jornal tentou ouvir a versão de Zucula, mas não foi possível. Fontes próximas explicaram que seria difícil um pronunciamento do ex-ministro ou dos outros dois envolvidos, na actual fase de investigação da PGR.

Fontes ouvidas pelo jornal não excluem a possibilidade da constituição de um quarto arguido no processo.

O nome do ministro poderá vir a ser de novo mencionado no caso das “luvas” pagas na construção do aeroporto de Nacala, a cargo da construtora brasileira Odebrecht. O montante arrolado são USD 900 mil.

No âmbito da operação “lava jato” desencadeada pela justiça brasileira, está também em investigação o favorecimento de uma empresa moçambicana ligada à “nomenklatura” do Partido Frelimo, envolvida no projecto de construção da barragem de Moamba Major a cargo da construtora brasileira Andrade Gutierrez. A empresa em questão envolve Raimundo Pachinuapa e Tobias Dai e participou na construção da última ponte rodoviária sobre o rio Zambeze, junto à cidade de Tete.

O Papel de Zucula, Xihivelo e do Partido Frelimo


Paulo Zucula foi ministro dos Transportes e Comunicações entre Março de 2008 a Setembro de 2013 e foi substituído por Gabriel Muthisse. Zucula foi chamado para o Governo por Armando Guebuza para substituir António Munguambe, que caiu em desgraça no mediático “Caso Aeroportos”, onde foi condenado, em primeira instância, a 20 anos de cadeia por desvio de fundos e mais tarde viu a pena reduzida para quatro anos e cinco meses pelo Tribunal Supremo.

O processo de aquisição dos Embraer 190 foi feito durante a administração de Guebuza/Zucula. Ao que o SAVANA apurou de uma fonte próxima das investigações, Zucula não teve apenas um envolvimento político na qualidade de titular da pasta dos Transportes e Comunicações, mas também material.

O jornal apurou que, durante as audições, Zucula alegou que não agiu por conta e risco próprio no negócio, mas a mando do partido (Frelimo). Porém, não conseguiu apresentar evidências, segundo a mesma fonte. É preciso lembrar que no julgamento do caso Aeroportos, Diodino Cambaza, então PCA da empresa, afirmou na sede do tribunal que autorizou a entrega de 400 mil meticais à Escola do Partido Frelimo na Matola, na pessoa do respectivo director, Arlindo Chilundo.

A versão de que o Partido Frelimo mo foi o beneficiário das “luvas” corrobora informações divulgadas anteriormente por este jornal por fontes familiares com o processo.

0DWHXV=LPED Mateus Lisboa Gentil Zimba, outro arguido no processo, foi director da Sasol (2000-2016) e mais tarde ocupou o mesmo cargo na General Electric Oil & Gás em Moçambi que de Agosto do ano passado até ser afastado em Janeiro de 2017, indiciado de estar envolvido no escândalo da LAM na aquisição dos aviões Embraer.

Zimba, ligado à “Geração 8 de Março” e, posteriormente, diplomado em Medicina Veteriná- ria pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM), com uma passagem de cerca de 10 anos pela logística das Forças Armadas moçambicanas, é o “Agente C”, que serviu de “pivot” para a receptação de USD800 mil em comissões.

Para a concretização da manobra, Zimba criou uma empresa fantasma com sede em São Tomé e Príncipe, aí domiciliando a conta usada para a drenagem dos subornos.

Dados contidos na correspondência trocada entre executivos da Embraer e depositados na Comissão de Mercados, Valores e Mobiliários do Brasil indicam que, no dia 22 de Maio de 2008, documentos anexados no processo da PGR, após três anos de negociações, a companhia aeronáutica brasileira conseguiu formalizar a proposta de venda de duas aeronaves de marca Embraer E190 à LAM, a um pre ço unitário de USD 32 milhões. No dia 11 de Agosto de 2008, o director de vendas da Embraer, Patrice Candaten enviou um correio electrónico para Luiz Fuchs, vice-presidente da companhia brasileira para Europa e Albert Philip Close, ex-gerente para área de defesa da empresa.

No correio em causa, Candaten informa que após a conclusão do negócio com a LAM, apareceu o moçambicano Mateus Zimba, “que não trabalhou nos esforços da venda”, a informar que actuaria como consultor na transacção. “Na mesma oportunidade, Patrice Candaten propôs que eles `criassem alguma margem para comissões` para Mateus Zimba na formação do preço das duas opções subsequentes à venda”, relata o documento.

Após alguns contactos, Fuchs, no dia 13 de Agosto de 2013, enviou um email para Candaten, com cópia a outros funcionários da Embraer, relatando a conversa que teve com Zimba. Na referida conversa, Zimba precisou que embora a companhia brasileira não tivesse previsto contar com um consultor “nós gostaríamos de ter um gesto na entrega do primeiro avião”.

Na mensagem enviada a Candaten, Fuchs informou: “temos (a Embraer) de mostrar algum gesto e talvez o valor mencionado por Albert Close (50 a 80 mil dólares) acomodasse a necessidade”. Fuchs explicou ainda a Zimba como criar uma empresa na qual a companhia aeronáutica brasileira pudesse efectuar “supostos pagamentos de consultoria”. Explicou a Zimba sobre os procedimentos que devia seguir para ter o valor. Zimba foi aconselhado a registar uma empresa com nome, endereço e não ter a sua sede num paraíso fiscal. Fontes familiares ao processo consideram que, dadas as funções formais exercidas por Zimba, só a sua ligação aos serviços de segurança pode justificar um envolvimento tão melindroso, nomeadamente para beneficiar o Partido Frelimo.

De acordo com os documentos, em resposta ao email de Fuchs, José Molina, vice-presidente da cadeia de suprimentos, aprovou a oferta de USD50 mil a Zimba por cada um dos aviões vendidos, com margem para negociar até USD80 mil. Aprovou igualmente que se pagasse entre 2 a 2.5% do preço de venda das duas opções se a LAM exercesse a previsão opcional de comprar outros aviões. Segundo a documentação na posse do SAVANA a partir da investigação oficial efectuada no Brasil e nos Estados Unidos, a 18 de Agosto de 2008, Fuchs escreveu que ofereceu os USD50 mil a Zimba, mas relatou, em seguida, para Patrice Candaten, que percebeu que o antigo director da Sasol não achou nada simpático o valor e estava “esperando uma comissão muito maior”. “...ao ouvir o valor, insinuou que o cliente (LAM) poderia adjudicar o contrato para outra empresa”, sublinhou Fuchs

-RVp9LHJDV No dia 25 de Agosto 2008, José Viegas, então PCA da LAM (cessou em Abril de 2011 e foi substituído por Teodoro Waty), telefonou para Fuchs. Em mensagem electrónica, enviada a 25 de Agosto de 2008, Fuchs narrou para Candaten a conversa que manteve com Viegas. Disse que Viegas “frisou que tinha recebido comentários muito desagradáveis de algumas pessoas sobre a proposta da comissão da Embraer” “José Viegas indicou que algumas pessoas receberam a proposta da Embraer como um insulto e, de certo modo, teria sido menos ofensivo não propor nada, mesmo que isso não fosse aceitável”, narrou Fuchs.

Perante a reacção de Viegas, o director adjunto da Embraer para Europa perguntou ao então PCA da LAM o que ele esperava da Embraer, ao que José Viegas respondeu que naquelas circunstâncias, um milhão de dólares seria razoável.

Luiz Fuchs achou o valor alto, mas depois de negociar, José Viegas “finalmente sugeriu que poderíamos nos safar com USD800 mil” em duas tranches de USD 400 mil.

Na versão brasileira dos factos, Fuchs alertou a Viegas que a Embraer não tinha orçamento para “esse valor de consultoria”. Viegas não se terá sentido incomodado com a posição de Fuchs e sugeriu que o valor podia ser tirado da margem de lucro sobre as duas opções de compra das aeronaves. “Perguntou (Viegas) se o preço da aeronave poderia ser elevado”, sublinhou Fuchs, acrescentando igualmente que Viegas disse que não se sentia à vontade para discutir aquele assunto por telefone.

O contrato de compra das duas aeronaves E190 foi rubricado a 15 de Setembro de 2008 pelo preço unitário de USD32.690, mais um sinal de USD312 mil por um terceiro avião. José Viegas foi um dos três executivos da LAM que assinou o contrato pela companhia de bandeira mo- çambicana. Fontes familiares ao processo disseram ao jornal que, quando Viegas foi contactado sobre as comissões, este informou o responsável pelo MTC que, por sua vez, recebeu instruções da hierarquia do partido Frelimo de como proceder, entrando então em cena o “agente C”. (Redacção)


Fonte: SAVANA – 21.04.2017

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