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segunda-feira, maio 16, 2016

A Segurança de Estado na ribalta - O poder do SISE nas dívidas escondidas

O enredo à volta da misteriosa contratação de uma dívida superior a dois mil milhões de dólares por parte do Governo de Armando Guebuza tem em comum o facto de estarem envolvidas personagens ligadas ao Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), destaca na sua mais recente edição o Indian Ocean Newsletter (ION), uma publicação francesa sobre temas africanos. Segundo a publicação, o papel dos “espiões” do SISE terá sido determinante para persuadir Armando Guebuza a anuir no endividamento clandestino do país, levando ao actual estado periclitante das contas públicas.
Não está claro se a influência dos “SISEs” terá sido apenas meramente persuasiva ou decisiva sobre Guebuza, na resolução que levou ao recurso a avultadas dívidas, ao arrepio das normas e à calada de tudo e todos. “De acordo com informações obtidas pelo Indian Ocean Newsletter em Maputo, foi iniciativa de um pequeno círculo de quadros de topo dos serviços de segurança que esteve por detrás da contratação de empréstimos de cerca de 1,4 biliões de dólares e que provocou a ira dos doadores internacionais”, diz a notícia. São os mesmos “securocratas”, adianta a publicação, que impuseram uma linha mais agressiva em relação à Renamo, levando à deterioração da actual situação política.
Porém, esta versão é contrariada por outras fontes locais contactadas pelo SAVANA que interpretam este “apontar de dedos” aos serviços de inteligência do Estado como uma forma de criar uma “cortina de fumo” em torno de Guebuza e seus aliados, agora sob uma formidável pressão da comunidade doadora para que sejam expostos publicamente e, eventualmente, encaminhados à barra dos tribunais.
Nesta versão, os operativos da segurança foram habilmente utilizados por um círculo restrito de funcionários superiores do Executivo, directamente ligados ao antigo Chefe de Estado, garantindo-lhe lealdade e secretismo. Para demonstrar a sua asserção sobre o envolvimento dos espiões do SISE, o Indian Ocean Newsletter diz que a e Ematum e a Mozambique Asset Management (MAM), criadas entre 2012 e 2014, têm ambas o mesmo accionista, que é a Gestão de Investimentos, Participações e Serviços (GIPS). Esta entidade é, por sua vez, detida pela SERSSE, formalmente os serviços sociais do SISE.
O PCA da Ematum, da Proindicus (e da Mozambique Assets Management-MAM), outra empresa que beneficiou dos empréstimos (USD 622 milhões), é António Carlos do Rosário, um antigo professor no ISRI (Instituto Superior de Relações Internacionais, instituição que dá emprego a muitos quadros do SISE e também é conhecida como fonte de recrutamento para a segurança moçambicana.
Segundo a ION, Rosário criou em 2010, em Maputo, uma empresa de consultoria e investimento, a Jociro Internacional, tendo como sócios Ângela Diniz Buque Leão, mulher de José Gregório Leão de Barros, director geral do SISE, desde 2005, quando foi indicado para o lugar por Armando Guebuza, em substitui- ção de José Castiano Zumbire, que morreu em circunstância até hoje não muito bem esclarecidas. Do Rosário tem plenos poderes na Proindicus e na MAM, mas na Ematum, o CEO é agora Felisberto Manuel, um antigo gestor da Emopesca que substituiu em Janeiro a directora executiva Cristina Matavele. Em Moçambique, é comum encontrarem-se funcionários com ligações à segurança de Estado trabalhando nos mais diversos sectores, desde as administrações de distrito e de província, até ao governo central e à diplomacia.

Uma parte destes quadros foi formada em Cuba e na extinta RDA (Repú- blica Democrática Alemã). Segundo a ION, outro sócio da Jociro Internacional é Cipriano Sisino Mutota, que detém também uma participação na TPCO Mulepe, empresa mineira, em sociedade com o empresário italiano Emiliano Finocchi, um residente em Moçambique há várias décadas. Ao que o SAVANA apurou, a Jociro Internacional é uma sociedade por quotas, registada a 14 de Dezembro de 2010 e publicitada através do BR nº 2, III Série de 12 de Janeiro de 2011.
Com um capital social de 10 mil meticais, a Jociro Internacional dedica-se à prestação de serviços nas áreas de auditoria, contabilidade, revisão e certificação de contas; estudos económicos e financeiros; análise de investimentos; serviços de consultoria compreendendo a assessoria fiscal, jurídica, informática, projectos de viabilização, gestão de empresa e áreas afins; propriedade intelectual; compra e venda de equipamentos e serviços; e importação e exportação de equipamento diverso relativo a área de actividades da empresa.
O SAVANA não conseguiu apurar a eventual ligação da Jociro com a Ematum, Proindicus e MAM, mas é claro o vínculo destas últimas três empresas com o GIPS e, implicitamente os serviços de segurança. As fontes do SAVANA garantem que é falacioso falar em sector privado ou investidores privados nas três empresas onde está claro o vínculo de união com os serviços de inteligência. “Mesmo que existam indivíduos mencionados nas escrituras das empresas, isto era apenas para cumprir preceitos legais relacionados com o número de sócios nas sociedades comerciais”, dizem as mesmas fontes.
“Os privados de que se fala não são sócios, mas eventuais comissionistas nas avultadas transacções que foram feitas”, explicam as fontes. Juntando-se ao coro da sociedade civil, figuras gradas ligadas à Frelimo, têm aparecido a pedir “as cabeças dos responsáveis” da criação secretiva das empresas, mas, ao mesmo tempo, têm evitado mencionar os nomes que andam de boca em boca na praça pública: o presidente Guebuza e o antigo ministro das Finanças Manuel Chang.
Coincidência ou não, de acordo com as fontes da ION, Gregório Leão acompanhou, em Abril, Filipe Nyusi nas visitas a Berlim e Bruxelas para assegurar aos investidores e doadores que os empréstimos serão saldados. Na teia de empresas na órbita da segurança de Estado, a GIPS, MAM e Proindicus juntaram-se este ano para constituir a Vipas, uma empresa de segurança especializada na proteção de embaixadas e diplomatas. A Vipas (Vip and Assets Security, S.A.), criada a 20 de Janeiro de 2016, dedica-se igualmente ao acompanhamento de veículos de transporte de valores; transporte expresso de valores; instalação, assistência e monitoria de sistemas eléctricos de segurança. Possui um capital social de 30 milhões de meticais.
A existência de “um pequeno império empresarial” nas mãos dos serviços de inteligência mostra o ressurgimento e os poderes que o sector adquiriu durante a governação Guebuza e o renascimento do modelo das “empresas da seguran- ça”, como aconteceu logo a seguir à independência, no mandato de Jacinto Veloso e cujo maior baluarte foi a Socimo.


Fonte: SAVANA – 06.05.2016

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