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quarta-feira, janeiro 06, 2010

Dialogando - E a descentralização?


Por Mouzinho de Albuquerque

NESTA coluna já há tempos tive a ocasião de abordar este assunto, e porque às vezes é preciso “guerra” ou insistir apelos à serenidade, seriedade e ao bom senso por todo o “mundo”, desde humilde cidadão entre os milhões existentes neste país, até, principalmente aos nossos governantes, na implementação de projectos orientados para o desenvolvimento, volto de novo a “atacá-lo”, porque vamos pagar ou continuaremos a pagar caro a falta desses aspectos na materialização da descentralização administrativa no nosso país.
Volto a “atacar” na perspectiva de que seja certo que nada se perde se os autores e implementadores do grande projecto de descentralização da administração pública na nossa pátria amada comunguem as suas ideias connosco ou com o povo que os elegeu sempre.
Volto à carga, no sentido de que se possa igualmente evitar muita crítica “cerrada”, tendo em conta que quem põe à discussão ou disposição um desafio como este, deve ter a lição bem estudada para executar com rigor o que pretende e, naturalmente, saber escutar e saber aceitar essas críticas desde que fundamentadas, tendo a prudência de descortinar entre o essencial e o acessório e de que na conclusão “cada cabeça dá sua sentença”.
Nalgumas vezes leio com satisfação o êxito que tem sido e a mais-valia que representa para a renovação do nosso processo governativo, essa descentralização. Mas, há momentos em que preocupa-me ter de admitir que o nosso sistema político-partidário possa ter perdido a hipótese de descentralizar mais o nosso país, valorizando e conferindo poder aos responsáveis a vários níveis.
Ou melhor dizendo, há situações que explicam a fraca ou aparente falta de vontade de se implementar essa descentralização. Aliás, olhando para trás, isto é, desde que começou a ser materializada a descentralização da administração pública até hoje em Moçambique, não parece que teremos muito de que nos orgulhar.
Não é salutar saber que num momento em que se deveria consolidar tal processo, ainda haja uma aparente “desvalorização” das capacidades e competências que lhes são conferidos, os quadros do sector público dos níveis provincial e distrital. Este é um país pobre e os bons resultados que se pretendem atingir com essa descentralização passa também pela contenção de despesas públicas.
Sendo assim, a descentralização administrativa não pode permitir que por exemplo, na abertura de um ano lectivo, uma escola, uma estrada, posto de saúde e outras infra-estruturas, numa determinada província ou distrito do nosso país, seja necessária ou forçosamente a presença de um director nacional ou ministro disto ou daquilo.
Não precisamos de desdobrar as brigadas centrais que acabam gastando muito dinheiro em passagens aéreas, alojamento e ajudas de custo, só para fazerem um trabalho que deveria ter sido feito com credibilidade pelo responsável local.
Parece ser estranho que alguns quadros superiores do sector público não estejam aparentemente a compreender a essência deste programa do Governo que tem entre outros objectivos fundamentais a melhoria da qualidade dos serviços prestados pelo sector aos cidadãos, que logicamente passa pela valorização dos quadros a vários níveis nele afectos.
Devemos acabar com a “invasão” dos raios de acção dos directores provinciais, distritais e outras estruturas de base. Que não se “monopolizem” absolutamente as competências, porque isso contraria os objectivos sobre os quais foi adoptado este processo que é o resultado da reforma do sector público.
Tenho a certeza que nós moçambicanos somos capazes de fazer mais e melhor e não permitir que o “joio” se instale nos nossos projectos como este, mas acredito que a descentralização da administração pública no país está sendo “deformada” devido, em algum momento, a aparente perda de capacidade e vontade reformista do executivo. Todos os cidadãos, principalmente os que se preocupam e estão atentos à nossa realidade, concordarão comigo. Aliás, costumo dizer que só não vê quem não quer. O então governador de Nampula, Abdul Razak, disse uma vez que a “intromissão” de decisões centrais era um dos grandes obstáculos da sua governação. Há muitos exemplos que se podem dar sobre a “arrogância” do poder central sobre a base, que mancham a descentralização da administração pública.
Contudo, quero continuar a acreditar que somos capazes de levar avante esta descentralização da administração pública no país, embora vejo mais os partidos políticos servirem os seus interesses em vez de servirem o país, para também contribuírem para a solidificação da democracia.
Ainda bem que daqui a alguns dias teremos um novo Governo que se espera venha a dar outra dinâmica aos projectos de desenvolvimento da Nação, claro, incluindo este de que se está a falar aqui. Queremos sentir todos os dias e em todos os sectores da vida nacional, o “sabor” dos efeitos da descentralização administrativa.

Fonte: Jornal Notícias (07.01.2010)

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