Marco do correio
Por Machado da Graça
Olá Jerónimo
Como vai a tua saúde, amigo? A minha vai bem, felizmente.
Já não sei se posso dizer o mesmo da saúde da Democracia no nosso país.
Senão vejamos.
De acordo com os resultados eleitorais anunciados a FRELIMO obteve muito mais do que dois terços do número total de deputados na nova Assembleia da República.
Isto quer dizer, logo à partida, que pode fazer e desfazer tudo quanto lhe apeteça sem haver nenhuma força que a isso se possa opor.
Nessas circunstâncias, uma das funções de um parlamento, que é a de controlar os actos do Governo, perde completamente o sentido. O próximo Governo vai poder agir sem nenhuma espécie de controlo parlamentar.
Mas há outras e mais graves situações que podem ocorrer a partir de agora: Uma delas é a possível alteração da Constituição.
Há pouco tempo um repórter perguntou a Armando Guebuza se a FRELIMO tencionava mudar a Constituição para lhe permitir um novo mandato.
O Presidente da República respondeu que ele respeitava a Constituição. Logo alguns colegas apressados publicaram que a Constituição não seria alterada e Guebuza não se candidataria de novo.
Ora a resposta dada pode não significar nada disso. A FRELIMO tem, neste momento, a possibilidade constitucional de alterar a Constituição sozinha, sem ter que negociar com nenhum outro partido. E, isto é legal. Portanto, se o fizer, no sentido de permitir a Armando Guebuza um novo mandato (ou dois, ou muitos) e se ele se candidatar, em nenhum momento estará a desrespeitar a Constituição.
Um outro aspecto importante a ter em conta é que muita gente tem pedido a revisão da legislação eleitoral. Só que uma revisão dessa legislação num Parlamento como este que agora vamos ter, só pode significar novas leis cada vez mais favoráveis em benefício de quem as fez, isto é a FRELIMO. As novas leis a serem elaboradas só servirão para dificultar ainda mais a possibilidade de a oposição alguma vez chegar ao poder.
E não posso deixar de citar ainda outro aspecto grave da nova situação.
De acordo com a legislação existente são muitos os órgãos do Estado em que os seus membros são designados de acordo com a proporção dos deputados de cada força política na Assembleia da República.
A partir de agora, nesses órgãos, a FRELIMO vai passar a ter uma presença esmagadora, controlando as suas decisões sem quaisquer limites.
Tudo isto só pode ser motivo de grande preocupação.
Se até aqui as coisas já eram o que eram, a partir de agora o descontrolo dos processos democráticos de governação pode passar a ser completo, transformando a Democracia moçambicana de uma careta, que, em grande parte, já era, numa máscara de cartão pintado, para inglês ver.
Posso estar muito enganado nestas minhas previsões pessimistas?
Posso, mas, infelizmente, não creio que esteja.
A ver vamos.
Um abraço para ti do
Machado da Graça
CORREIO DA MANHÃ – 13.11.2009, in Macua de Mocambique
Nota: Concordo com a visão do Machado da Graça. Quo vadis sociedade civil?
Qualquer maioria absoluta tem estes privilégios! De se sustentar a si própria.
ResponderEliminarPor isso um povo deve estar politizado a ponto de nunca permitir a nenhum partido esse poder!
Tudo pode e tudo pode são as únicas alternativas que existem.
Cuidado!
Cara Ana Paula
ResponderEliminarÉ verdade que este é o privilégio da maioria absoluta. Houve quem não entendeu isto; houve quem pensou que a maioria dos moçambicanos entenderia o problema e votaria com um único objectivo, o de evitar uma maioria absoluta da Frelimo.
Hoje há muitos que não têm como negar que houve aviso ainda em 2006 ou 2007.
Para alguns, a sociedade civil faria pressão em substituicão dos partidos da oposicão, mas para mim, o receio é grande que todas as organizações passem abertamente a apresentarem-se como organizações de massa da Frelimo. E em Moçambique não temos a tradição das organizações pertencentes ao ANC. Aqui a preocupação é tacho e acabou.
Lamentavelmente
ResponderEliminarLinette
ResponderEliminarÉ lamentável, mas também pode ser uma boa experiência. Os próximos cinco anos podem ser uma forja.