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sexta-feira, julho 31, 2009

Deputado por cinco minutos

Por António Bernardo Cuna

Isso mesmo – o velho Chapata, orgulhoso combatente da luta de libertação nacional, foi deputado da Assembleia da República apenas durante cinco minutos.

Cinco minutos que pareceram uma eternidade – decorreu a campanha eleitoral; decorreram as eleições e as pessoas elegeram Chapata como um dos duzentos e cinquenta dignos, abnegados, incansáveis, sofredores e inquestionáveis representantes do povo.

Nos cinco minutos de mandato, Chapata exigiu e conseguiu tudo aquilo que acha que deve rodear um digno representante do povo – um salário compatível, um four by four, uma pistola para a defesa pessoal, ajudas de custo e subsídios compatíveis com o seu estatuto, uma sala de sessões condigna, tratamento vip na nossa maior companhia aérea, condições de trabalho no seu círculo eleitoral e por aí fora.

O velho Chapata conseguiu tudo isto nos primeiros dois minutos do seu mandato como deputado da assembleia da república.
No terceiro minuto, o velho Chapata fez-se ao pódio, onde pronunciou um discurso histórico, tendo apelado ao povo para que continue a consentir sacrifícios, se é que quer uma vida melhor amanhã.

“Mais sacrifícios são necessários meus compatriotas, pois o país continua pobre e a sua economia bem débil” – eis algumas das suas palavras.

Apelou à contenção nas reivindicações salariais dos trabalhadores, frisando que o país não está em condições de satisfazê-las.

No quarto minuto do seu mandato, lá estava o velho Chapata a votar a favor do reajustamento do seu salário, pois entende que o mesmo já está ultrapassado, apresentando-se desajustado em relação ao estatuto de um digno representante do povo.
Ainda no quarto minuto do seu mandato, Chapata decidiu vandalizar o sistema de som da sala da plenária – isto depois de uma discussão feia com um colega barricado na outra trincheira.

Também jogou cadeiras de um lado para o outro.
Segundos depois estava arrependido e pedia ao governo para que dignificasse a casa do povo, através da alocação de mais fundos para a reposição do sistema de som e do mobiliário.

No quinto e último minuto do seu mandato, o orgulhoso Chapata deu muitas voltas pelos corredores da Assembleia da República, numa clara exibição do seu mais recente fato.

Aliás, antes de penetrar nos corredores daquele imponente edifício, Chapata fez uma outra exibição – imaginem que, de casa para o parlamento, foi escoltado por três viaturas – sendo uma da sua esposa, outra do seu filho mais velho e a terceira era pilotada por uma senhora bonitona, que ninguém sabe lá muito bem quem ela é – talvez uma amante.

Para fechar com chave de ouro o seu mandato de cinco minutos, Chapata repetiu que, sendo ele um digno representante do povo, não merecia entrar nos hospitais ou nas clínicas onde entram outras pessoas que não se coadunam com o seu estatuto de abnegado filho e servidor do povo.

Assim sendo, quer uma clínica só para si e seus colegas.
Nos últimos segundos do seu mandato, Chapata aproveitou para alertar que, num futuro não muito distante, de novo estará no parlamento e, nessa altura, fará novas exigências, nomeadamente uma residência, uma avioneta, férias anuais nos cantos mais bonitos do mundo e por aí fora.

Expiraram os cinco minutos e, consequentemente, o mandato de Chapata.
O velho acordou e tentou ver e mexer o que durante o seu mandato de cinco minutos exigiu e conseguiu.
Nada.
Afinal estava a sonhar.
Coitado do Chapata – disse eu.
Só que ele replicou, dizendo que foi bom o facto de ter sido deputado apenas no sonho.
Que tamanha barbaridade sonhei eu – frisou Chapata, que contou-me este sonho depois de eu jurar que não daria com a língua nos dentes.
Mas ........decidi contar-vos já que é bem menor o risco de ele saber que espalhei a história, por se encontrar na sua aldeia em Muidumbe, província de Cabo Delgado, bem juntinho das suas duas obedientes esposas.
Se ele souber, frita-me vivo.
Por isso, amigo ouvinte ou leitor, não conte a mais ninguém esta história.(X)

Fonte: Rádio Mocambique

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