Páginas

quinta-feira, outubro 12, 2006

São punidos

Por Machado da Graça(*)

O DOUTOR Elísio Macamo é uma pessoa pela qual tenho estima a nível pessoal, mas com quem frequentemente discordo. E uma das principais razões de discórdia é o tema da corrupção.

Enquanto eu tenho defendido sempre um combate cerrado contra esse mal social, o doutor Macamo sistematicamente escreve textos a desculpabilizar os corruptos e, num caso extremo,
chegou mesmo a afirmar que, na opinião dele, em Moçambique não existe corrupção.

O Notícias publicou mais um artigo dele sobre este tema, chamado “Da hipocrisia: mais uma vez a corrupção”. Nele o autor, entre várias outras coisas, faz a seguinte comparação entre o que se passa nos países desenvolvidos e entre nós:
“No nosso caso, uma laranja podre significa que todo o saco está podre. No caso deles uma laranja podre significa que uma laranja está podre.”

Referindo-se ainda ao caso da corrupção nos países desenvolvidos ele afirma, a certo ponto: “Quando são apanhados, são punidos”. E creio que aqui ele colocou o dedo na ferida.

A verdade é que em quase todos os países há formas de corrupção. Mas, nos países desenvolvidos que ele cita, e noutros ainda, quando os corruptos são apanhados, são punidos. Ao passo que aqui não são. Aqui continuam, impunemente, os seus actos de corrupção.

E isso leva-nos de novo ao exemplo dos sacos de laranjas. No caso dos outros países, as laranjas saudáveis, que são a maioria e estão organizadas, segregam a laranja podre para fora do seu seio. Não aceitam que ela continue no mesmo saco. Ao passo que cá uma laranja podre continua, muito contente, dentro do saco e as outras laranjas não dão nenhum sinal de se sentirem incomodadas pela sua presença.

Daí que se possa pensar que as outras laranjas também já estejam podres, embora os sintomas possam ainda não ser visíveis. Argumentando, como ele próprio admite, ‘ad hominem’, Elísio Macamo afirma que existe uma
economia política do discurso anti-corrupção que faz da anti-corrupção um ganha pão. Ora, dada a persistente campanha do autor no sentido da desculpabilização dos corruptos, pergunto se o mesmo argumento não poderá ser usado também no sentido contrário.

E, para terminar, um último ponto em que o doutor Macamo é também persistente: nunca, até este momento, pelo menos nos textos que eu li (e são já bastantes), nos deu a sua definição
sobre o que é a corrupção. Passa o tempo a criticar as definições dos outros, mas nunca nos dá a dele, de forma a podermos raciocinar também com essa base.

Agindo desta forma, ele coloca-se numa posição pouco correcta em termos de debate. E, podendo as suas elaboradas teorias impressionar pela elegante linguagem utilizada, não deixam, no entanto, de estar vazias naquilo que é essencial: sabermos afinal qual é o bicho de que estamos todos a falar.

(*)Savana

Sem comentários:

Enviar um comentário