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sábado, junho 09, 2012

DESCENTRALIZAÇÃO EM CONTEXTO DE PARTIDO “DOMINANTE”

O CASO DO MUNICÍPIO DE NACALA PORTO

Por Domingos do Rosário


INTRODUÇÃO

O dia 19 de Novembro de 2008, data da realização das terceiras eleições municipais, marca o regresso do status quo na governação local em Moçambique. Esta data constitui um revés político para a Renamo que, em 2003, tinha marcado a história política do país ao infligir uma primeira derrota eleitoral à Frelimo nos municípios da Beira (em Sofala, no centro do país)[1] e de Angoche, Ilha de Moçambique e Nacala Porto (municípios situados na região costeira de Nampula, habitat de duas velhas elites islâmico-crioulas e portuguesas, onde se desenvolveu um sentimento identitário diferente do das elites sulistas da Frelimo, inteiramente modeladas segundo características do colonialismo português urbano do século XX)[2]
Este artigo tem como objectivo principal mostrar que, num sistema de partido dominante e de municípios de penúria, sem base económica e tributária, o sucesso da governação local depende altamente da vontade do poder central. Numa primeira parte analisaremos o processo político que conduziu à adopção da Lei 2/97 e à realização das primeiras eleições autárquicas de 1998. Mostraremos que os resultados eleitorais obtidos pela Renamo nas eleições de 1994 jogaram um papel determinante para a não implementação da Lei 3/94 e na adopção de uma nova lei sobre as autarquias locais, a Lei 2/97. No município de Nacala Porto, objecto do nosso estudo, a ausência da Renamo do processo eleitoral de 1998 culminou com o surgimento de uma organização da sociedade civil local (OCINA) que, embora tenha sido utilizada pela população para mostrar o seu descontentamento em relação ao Estado-Frelimo, não conseguiu capitalizar este potencial, tendo sido capturada pela rede clientelista instalada no município, o que não lhe permitiu jogar um papel democratizador.
Numa segunda parte analisaremos a gestão municipal da Frelimo durante o primeiro mandato (1998-2003), os factores que, numa eleição competitiva, explicam a vitória da Renamo nas segundas eleições locais e as estratégias que foram depois adoptadas pelo Estado-Frelimo para recuperar, segundo Manuel Tomé, então Secretário-Geral do partido Frelimo, o município “que estava sob gestão ruinosa e danosa por parte de pessoas que não têm instrumentos para fazer política” (Notícias, 13 de Fevereiro de 2009).



[1] Em Marromeu, as eleições locais de 2003 produziram uma coabitação: a Renamo elegeu o Presidente do Conselho Municipal, João Germano, com 50,01 % dos votos, e a Frelimo ganhou uma maioria na Assembleia Municipal, com 50,22% dos votos.
[2] Para um estudo aprofundado da vitória da Renamo nos municípios da região costeira da Província de Nampula, vide: D. M. do Rosário, Les mairies des “autres”: Une analyse politique, sócio--historique et culturelle des trajectoires locales. Les cas d’Angoche, de l’Île de Moçambique et de Nacala Porto, Tese de Doutoramento em Ciência Política, Instituto de Estudos Políticos de Bordeaux, Bordeaux, Abril 2009.


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