“Lamentável” é simplesmente assim como o jornalista e jurista Ericino de
Salema caracteriza a falta de esclarecimento do assassinato, um ano depois. Um
silêncio que, entretanto, não surpreende o jovem jurista.
“Digo sem surpresa porque já são tantos casos de assassinatos neste país
que não têm esclarecimento” diz, deplorando que, passado um ano, não existam
sinais evidentes de que algo esteja a ser feito com vista ao esclarecimento.
Salema ainda não se esqueceu das promessas do ministro do Interior e do
Comandante Geral da Polícia em esclarecer com celeridade o caso, mas não
estranha que, tratando-se de um crime que parece ter motivações políticas, haja
este não esclarecimento, tendo em conta sobretudo que as chefias da polícia e
do ministério em geral são indicadas politicamente para esses cargos. Lembra
também que, antes do assassinato de três de Março de 2015, Gilles Cistac foi
vítima de outro tipo de assassinato, neste caso, de carácter por parte da
“equipa G40”. Por isso, reitera Salema, o acontecimento daquela fatídica manhã
foi apenas o culminar de uma série de assassinatos na esfera pública, incluindo
de pelo menos um (ex) porta- -voz de um partido (Damião José, da Frelimo,
diga-se).
Mesmo sem apontar nomes, Salema recua ao cont cua ao
contexto de efervescência política em que Gilles Cistac foi assassinado, para
afirmar: “as pessoas não têm a dimensão do tipo de danos que criaram, não só à
dignidade humana no geral, mas à própria academia”.
Salema, que foi estudante e tutorando de Gilles Cistac,
recorda de um professor que tinha no prelo cerca de sete obras de direito. “Ele
estava a trabalhar numa série de obras, por exemplo, da área de Direito Administrativo.
Então, só isso foi um grande revés para a academia.
Era um professor devoto, um académico que se dedicava ao
seu ofício quase que em exclusivo, o que é cada vez mais raro hoje em
Moçambique, mesmo no seio daqueles que têm contratos que dizem que estão nas
universidades a tempo inteiro, mas que na prática não estão lá” diz.
Sobre o vazio deixado pelo malogrado no debate académico
e democrático do país, o nosso entrevistado não esconde saudades por Gilles
Cistac.
“Para além de deixar saudades, em parte pode haver outro
tipo de efeitos. Pode ser que alguns indivíduos, não só académicos, mas
cidadãos em geral, que tenham opiniões sobre o que está a acontecer no país, o
que acham sobre a arquitectura constitucional do nosso país, estejam a preferir
o silêncio, por estarem a temer alguma consequência porque o assassinato igual
àquele do professor Cistac é apenas o extremo, porquanto há tantas outras
formas neste país de coarctação e perseguição daqueles que pensam diferentes”,
disse, considerando o que apelidou de certo desfalecimento da intervenção da
academia que, mesmo reconhecendo que no geral é pobre, em momentos como o que
Moçambique atravessa actualmente, era suposto ser um pouco mais ousada a
contribuição de académicos.
Perguntamo-lo ainda qual seria, na sua opinião, a melhor
homenagem ao professor catedrático, um ano depois do seu assassinato. Respondeu
que a melhor deveria ser feita pelo próprio Estado.
“Aquele é um crime público, por excelência. Então, o
próprio Estado deveria tudo fazer para esclarecê-lo. No sentido contrário,
tinha de dar uma explanação pública de tudo o que foi feito, com todos os meios
possíveis e necessários e mostrar que o resultado é zero, do que a actual
situação que temos de ausência de explicação, de mutismo total, mesmo em face
de promessas de fórum político e operacional”, recomenda.
Mas entende que outra homenagem é continuar-se com a obra
do professor, nomeadamante, continuar-se a contribuir de forma isenta, séria e
transparente para o desenvolvimento da ciência no geral e para o
desenvolvimento do Direito, em particular.
Fonte: SAVANA – 04.03.2016
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