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domingo, outubro 27, 2013

O fim da Paz

Editorial do Savana

Não era preciso nenhum esforço para perceber o semblante carregado do Reverendo Dom Dinis Sengulane, quando apareceu nas câmaras de televisão na noite desta segunda-feira, para se pronunciar sobre os últimos desenvolvimentos em Satunjira, Gorongosa, onde comandos das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) arrasaram o local onde se encontrava o líder da Renamo, Afonso Dhlakama.
Para a sua própria consolação, procurando encontrar o menos mal de uma situação extremamente má, tentaria temperar o seu desconforto com algumas palavras que poderiam tranquilizar os que nunca acreditaram que os homens de Deus também se zangam.
Não era uma questão pessoal, terá dito. “Não pensem que estou assim porque estive pessoalmente envolvido em esforços para evitar que isto acontecesse”, estamos a citá-lo de memória.
Mas no fundo do coração, como se costuma dizer, estava um homem profundamente magoado, sentindo-se traído por aqueles que o encorajaram a lutar para ajudar a encontrar uma solução, mas que no seu íntimo sabiam que não era exactamente isso o que pretendiam.
O nome de Dom Dinis Sengulane está intimamente ligado aos esforços que conduziram ao Acordo Geral de Paz em 1992. E ciente das suas responsabilidades espirituais e patrióticas, voltou a envolver-se nessa missão por vezes inglória, quando a paz voltou a mostrar-se frágil a partir dos primeiros meses deste ano.
Juntamente com outras personalidades nacionais, a sua routina nos últimos meses resumia-se a um vai-e-vém entre a Ponta Vermelha e os sopés da Serra da Gorongosa, num exercício arriscado mas que teria como recompense conseguir um entendimento político entre o governo e a Renamo.
Nenhum deles podia contemplar um desfecho tão dramático como este; o ressurgimento de uma guerra que usaram toda a sua inteligência e sabedoriapara evitar a todo o custo.
Parece estarmos a ouví-los dizer, em uníssono, que “fomos enganados”! O governo, reiterando pela milésima vez que estava empenhado na preservação da paz, que não havia ninguém mais interessado no diálogo e no aprofundamento da democracia do que ele próprio, os encorajava a prosseguir nos seus esforços genuínos de tentar uma aproximação. Não obstante ao mesmo tempo estar a preparar-se para a guerra.
É uma aventura de grande risco, que pode vir a custar ao país mais do que os benefícios que dela se espera.
O envolvimento das Forças Armadas num desentendimento que estava a ser alvo de uma negociação revela claramente as intenções do governo de romper com o processo negocial e obrigar a Renamo a fazer aquilo que melhor sabe fazer: a guerra de guerrilha.
Vem confirmar aquilo que já há muito se suspeitava. Que o governo estava a assumir uma postura negocial que tornava claro que não estava nem tão pouco interessado em negociar. E os seus propagandistas já nos tinham anunciado da sua vontade de reduzir a Renamo à sua insignificância.
O que importa agora perguntar é, e daqui, para onde vamos? Há pessoas que acreditam que esta demonstração de força por parte do governo marca o início do fim da era de Dhlakama como líder da Renamo. Já vinham falando de uma “solução angolana”, em alusão à morte de Jonas Savimbi pelas forças governamentais em Fevereiro de 2002.
Mas esses que defendem essas ideias apocalípticas ignoram o facto de que Moçambique não é Angola; as condições que se obtinham em Angola em 2002 não são as mesmas que se obtêm em Moçambique hoje. Moçambique avançou muito na construção da sua democracia, e não pode ser obrigado a regredir nesses seus avanços por absurdas comparações que em nada se assemelham ao nosso modelo de vida.
E mesmo que se consiga matar Afonso Dhlakama, como parece ser o objectivo destas acções, continuarão na mesa os assuntos políticos que a Renamo colocou, e sem a resolução dos quais a democracia em Moçambique continuará a ser um projecto adiado.
Pode faltar clareza na forma como as coisas são colocadas, mas há muitos moçambicanos, se não mesmo a maioria, que se revêem nas reivindicações que a Renamo tem estado a apresentar. Não é só a Renamo que se tem batido pela necessidade de se despartidarizarem as instituições do Estado; não é só a Renamo que vem exigindo que os órgãos de administração eleitoral tenham capacidade de realizar as suas actividades obedecendo somente à Constituição e outras leis do país, sem qualquer tipo de interferência político-partidária. Não é só a Renamo que exige a participação justa de todos os moçambicanos no acesso às oportunidades económicas do país. Não é só a Renamo que exige a maior ampliação do espaço de debate nacional; não é só a Renamo que se insurge contra a repressão do pensamento livre.
Estas são questões pertinentes da nossa vida como cidadãos deste país, e só a partir do momento em que o governo aceitar abordá-las com a necessária frontalidade, estará a nação moçambicana bem posicionada para seguir o caminho de uma verdadeira democracia participativa. Uma democracia que não é só multipartidária porque existem no país mais de 40 partidos políticos, não importa qual é a utilidade de alguns deles para o processo político nacional.


Fonte: Savana – 26.10.2013

4 comentários:

  1. Pensamentos:
    1. Matar em vez de pleitar é próprio de quem não tem razão.
    2. Qual é o Estado não partidarizado que possa existir em todo o mundo?
    3. O Estado é uma força sempre ao serviço de alguém, de alguma coisa, de algum partido ou de alguma classe.
    4. Apoiar opressores não é próprio de oprimidos mesmo que se digam democráticos.
    Dom José Corvo



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  2. NGuiliche

    Entao nao resta nada senao nos rendermos! É isso?

    Esqueceu um pensamento
    5. No meio de tantas pessoas a chorarem, há uma pessoa a rir.

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  3. Bem dito concordo, so que este riridor ja nao esta a rir fugiu. E nos deixou orfaos

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