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sábado, janeiro 14, 2012

PRIMEIRA ACTA DO GRUPO DIÁLOGO SOBRE MOÇAMBIQUE

O QUE NOS ENSINA A VITÓRIA DOS “VÂNDALOS” E “MARGINAIS” EM QUELIMANE?

“Chegamos ao ponto onde temos as ideias amadurecidas. Somos todos filhos desta "pátria amada", com dever de contribuir para o seu crescimento e engrandecimento. A maior luta esta por vir: "mudar a mente de muitos compatriotas.” Um membro do Grupo Diálogo sobre Moçambique.

Antes de mais nada, convém fazer algumas apresentações, mesmo que breves. Apresentação sobretudo de termos. Termos novos e outros nem tanto. Os termos “vândalos” e “marginais” usados para qualificar alguns moçambicanos (senão mesmo a maioria) não são novos. Já ouvimo-los da boca dos mais altos dirigentes do nosso País referindo-se a nós. Portanto, não precisam de uma apresentação exaustiva. Apenas sublinhe-se um aspecto: esses termos são usados quando nós, os moçambicanos, deixamos, por algum tempo, de ser povo maravilhoso ou maravilhoso povo e quebramos o silêncio imposto pela nossa pobreza absoluta.
Quando votamos, somos maravilhosos. Quando calamos e consentimos, somos maravilhosos. Mas quando discordamos, quando reivindicamos, quando questionamos e, acima de tudo, quando criticamos e exigimos melhorias da nossa condição de pobres absolutos diante da ostentação da absolutíssima riqueza de quem nos governa, ai deixamos de ser maravilhoso povo e passamos a ser ou “vândalos” ou “marginais”, conforme se trate do Ministro do Interior ou do Presidente da República que fala. Isso está claro.

Outros termos vitória (a acção) e Quelimane (o lugar), obviamente, falam por si do ponto de vista de significado político á luz das recentes eleições autárquicas intercalares realizadas no dia 7 de Dezembro de 2011. Quando encadeados com os “vândalos” e “marginais” apresentados no parágrafo anterior, portanto, os sujeitos que praticaram a tal acção no tal lugar referenciados acima, fica totalmente claro o sentido e o alcance da questão levantada. Agora, só mais um termo novo: Grupo Diálogo sobre Moçambique – é um “mural” ou parede no Facebook onde cada cidadão moçambicano e não só, pode entrar e participar nos debates sobre os diversos temas de interesse nacional. É um lugar de expressão livre, sem censuras, sem as tais algemas nas palavras contras as quais o saudoso CC não se cansava de alertar. É um lugar onde elogiam-se, aplaudem-se e encorajam-se as acções positivas a todos os níveis da nossa sociedade. Mas como ultimamente no nosso seio a mediocridade venceu à excelência e essas acções positivas teimam em primar pela raridade, também e sobretudo, é um lugar de critica dura, crua, nua e desapaixonadamente construtiva. Proporcionalmente, neste momento, há mais críticas que elogios. Há tomada de posições e defesa de opiniões próprias, sim.

Por favor não nos perguntem a que partido político pertencem as pessoas que participam nos debates. Não o sabemos! Não nos perguntem se são do sul ou do norte ou do centro? E se forem do sul, se machanganas ou marongas; se forem do centro, massenas ou mandaus; e se forem do norte, macuas ou macondes. Não o sabemos! Não nos perguntem se são cristãos, muçulmanos, hindus etc; ou sendo muçulmanos, se xiitas ou sunitas assim como católicos ou protestantes, se forem cristãos? Se são mulheres ou homens, casados ou solteiros ou divorciados? Não sabemos! Não sabemos e nem é relevante saber isso. Apenas sabemos e acreditamos que são moçambicanos iguais a todos os outros que cumprem com o seu dever de contribuir com as suas ideias para o bem comum. Debatemos sobre Moçambique para que, de novo, as avessas tomem o seu devido lugar.

Feitas as apresentações segue-se o facto de que essas ideias expostas nos diversos debates que têm tido lugar no Diálogo sobre Moçambique no Facebbok, os argumentos, as sugestões, as conclusões e sobretudo, as recomendações não devem terminar e morrer ali. Por maioria de razões, essas contribuições devem continuar fora da Internet para que outros moçambicanos noutros quadrantes do País e do Mundo tenham acesso e, querendo, contribuam e enriqueçam com as suas opiniões, o diálogo sobre Moçambique.

Assim, o artigo sobre que o leitor se debruça neste preciso instante é, efectivamente, síntese do debate que o Grupo Diálogo sobre Moçambique teve à volta das eleições autárquicas intercalares, principalmente dos resultados destas, em Quelimane. Como forma de continuar os debate fora da Internet e visando despertar a consciência dos moçambicanos que ainda hesitam em exercer plenamente a sua cidadania responsável, o Grupo assume o compromisso, deste já, de partilhar regularmente os seus debates através deste tipo de publicações. Esta é a Primeira Acta, trazida pela gentileza da Direcção do Jornal a Verdade. Pode-se também perguntar porquê o Jornal a Verdade, mas isso é outro debate.

Como vê, o Grupo utiliza uma linguagem muito simples e acessível para comunicar as suas opiniões. As ideias, os argumentos e as conclusões são postas de uma forma espontânea, natural e de moçambicano para moçambicano.

Já é do domínio generalizado que no dia 7 de Dezembro de 2011, foram realizadas eleições autárquicas intercalares no município de Quelimane onde concorriam à sua presidência os partidos FRELIMO e o MDM, tendo o candidato do MDM, Manuel de Araújo, sido proclamado vencedor. Até aqui tudo bem.

Entretanto sabemos que, desde que o sistema eleitoral foi adoptado e ensaiado pela primeira vez em 1994 em eleições legislativas e presidenciais e, com a descentralização, com a introdução das eleições autárquicas em 1998, o partido FRELIMO sempre sagra-se vencedor. Formalmente, nunca perdeu nas presidenciais; tem ganho maioritariamente os assentos parlamentares; o maior número das vilas e cidades municipais; e, mais recentemente, os das assembleias provinciais por um lado. Por outro, o cenário político predominante desde então era a bipolarização entre a RENAMO e a FRELIMO, tendo alguns pequenos partidos políticos de permeio. Por sempre perder e ocupar o segundo lugar, a RENAMO veio a adquirir, e sustenta até hoje, o estatuto de maior partido de oposição do País. Entretanto, este cenário das “metades politicas” começa a mudar com o surgimento do MDM logo após as eleições de 2008, galvanizado pela vitória na presidência do município da Beira, de um independente: Deviz Simango – um jovem engenheiro, excluído pela RENAMO e imposto pelos munícipes da Beira, sendo por conseguinte temido por aquilo que ficou designado mais tarde por – FRENAMO (por os partidos FRELIMO e RENAMO partilharem o mesmo interesse de derrotar o candidato independente).

Agora, em Quelimane, acaba de ganhar outro jovem – Manuel de Araújo – do MDM. A primeira pergunta que o Diálogo sobre Moçambique procura responder imediatamente é: O Manuel de Araújo ganhou por ser jovem e pertencer ao MDM? Isto é, será que o senhor Bico perdeu por ser velho e da FRELIMO?

A resposta é: Não! A vitória do Manuel de Araújo do MDM e a derrota do Bico da FRELIMO resultou da percepção que os moçambicanos, jovens e velhos, mulheres e homens, já têm de que as sucessivas vitórias da FRELIMO em eleições anteriores, não conseguiram trazer, na sua maioria, resultados positivos com impacto directo nas suas vidas. Embora existam algumas poucas realizações aqui e acolá, a governação da FRELIMO caracteriza-se fundamentalmente pela exclusão, pela marginalização dos moçambicanos não militantes desse partido e pela instrumentalização de todo o povo, usando-se e abusando-se o nome deste para exclusivamente assegurar interesses particulares do partido e de um grupinho dos seus dirigentes. E dado que a RENAMO já demonstrou bastante letargia e moribundice políticas, por exclusão de partes, fica o MDM. Neste momento e por ora, a vitória eleitoral de Quelimane, mais do que votar-se no melhor, foi votar-se contra o pior.

Então, de onde veio todo o apoio ao MDM e seu candidato? De todos os que se sentem excluídos. De todos os que se sentem marginalizados. O MDM e o Manuel de Araújo não têm experiência de governação para dar em Quelimane. Mas ao menos tem o benefício de dúvida e, à semelhança do que aconteceu na Beira, demonstra que esta democracia pode funcionar e o tal do povo pode realmente votar contra quem não lhes serve. Se o Manuel de Araújo e o MDM claudicarem em Quelimane, agora, mais do que nunca, o povo moçambicano naquela parcela do País já tem a certeza absoluta que pode votar e eleger outro candidato.

Assim, começamos a ver aqui que a vitória eleitoral de Quelimane é a vitória dos que antes tinham medo. É a confirmação da Beira por via da verificação factual de que, afinal, o povo pode tomar, realmente, a rédea do poder nas suas mãos, escolhendo e destronando com urbanismo e civilidade, os seus dirigentes.

E onde é que entram os “vândalos” do senhor Ministro e os “marginais” do senhor Presidente?

Aquando das apresentações preliminares acima, ficou estabelecido que esses são o povo moçambicano. Ficou claro que, dependendo do estado emocional dos dirigentes deste País, o povo moçambicano pode ser chamado de vândalos e marginais ou pode ser chamado de maravilhoso. Ora, nós aqui no Grupo somos moçambicanos e como todos os restantes compatriotas, sentimo-nos profundamente atingidos com aqueles insultos de alto nível e repudiamo-los veementemente. Igualmente verificamos e concluímos que, de facto, no seu acto de governação do dia a dia, aqueles e os restantes dirigentes do nível de topo efectivamente, praticam a marginalização.

Outro aspecto: verificamos que dentre os vândalos e os marginais, existem jovens e velhos. O senhor Ministro e o senhor Presidente não distinguiram a que partidos políticos pertencem aqueles vândalos e marginais e nós também não iremos distinguir. Apenas concluímos que partilham em comum o facto de serem moçambicanos que ousaram pensar e dizer diferente; partilham em comum os sacrifícios de um elevado custo de vida; partilham em comum as deficiências do serviço nacional de saúde; a má qualidade de educação; o elevando nível de desemprego; as más políticas nos transportes e comunicações; a carência de habitação condigna; em fim, partilham em comum um enorme oceano de carências e dificuldades de uma pobreza absoluta de um povo cujos dirigentes nadam e sufocam-se na riqueza absoluta. Partilham em comum discursos ocos e promessas vãs que diariamente esses dirigentes proferem para justificar o trabalho que não realizam.

Então, os jovens e velhos excluídos decidiram questionar as iniquidades de uma forma diferente. Os jovens e os velhos, maravilhosos ou vândalos e marginais, tomaram a consciência de que todos somos moçambicanos e que merecemos viver felizes no nosso País. Existe a clareza de que tal felicidade é adiada apenas por uma questão de falta de liderança e de uma governação inclusiva e seriamente comprometida com o real desenvolvimento económico e social.

Da Beira, pela imposição dos beirense de um candidato da sua preferência, passando pelos protestos de 1 e 2 de Setembro de 2010 para desaguar na grande mobilização popular que votou contra os que sempre dirigiram o Município de Quelimane, nota-se que, finalmente, os jovens moçambicanos despertaram e decidiram liderar as mudanças que devem ser operadas; nota-se que os jovens moçambicanos, os verdadeiros continuadores da revolução moçambicana, quer sejam chamados vândalos ou marginais, não aceitam mais serem excluídos ou auto excluírem-se dos grandes processos democráticos de tomada de decisões.

Assim, a vitória de Quelimane, é a vitória de todos os moçambicanos que são chamados de vândalos e marginais quando discordam com Sua Excelência Senhor Presidente sobre o Estado da Nação estar bom. É a vitória daqueles que perceberam que se passarem a vida a votarem inadequadamente nas mesmas pessoas que fazem as mesmas coisas da mesma maneira todos os mandatos, passarão a ter igualmente os mesmos maus serviços públicos prestados por essas pessoas.

Essa vitória ensina-nos que a Nação está praticamente morta e precisa de drásticas medidas de reanimação, onde:

Pelo menos por enquanto, não precisamos de seguir os exemplos violentos da Tunísia, do Egipto, da Líbia ou Síria para operarmos as mudanças. No quadro do estado de direito democrático que estamos a construir, existe um aparato institucional que podemos usar para, eleger ou não eleger dirigentes e partidos; propor soluções no, e negar política nocivas ao interesse nacional; promover uma distribuição equitativa da riqueza nacional e uma política de inclusão social e construir realmente um País de Verdade.
Ensina-nos que em 2013 e em 2014, podemos e devemos votar realmente em quem nos demonstra que, de facto, vai servir os interesses dos eleitores. Não deveremos continuar a votar nas mesmas pessoas e nos mesmos partidos que mostraram estarem exaustos, sem ideias claras nem políticas coerentes, mas devemos dar oportunidade à novas mentes, à novas capacidades.
Ensina-nos que da mesma forma como cumprimos com todas as nossas obrigações, não podes ter medo de exercer os nossos direitos de cidadania consagrados na Constituição e nas leis. Se para cumprir as nossas obrigações alguém nos vigia, nós temos que vigiar a materialização dos nossos direitos.
Essa vitória ensina-nos que não somos obrigados a tolerar maus políticos e más políticas. Patrão aqui, somos nós! Chefe aqui, somos nós todos os moçambicanos que, com o nosso trabalho e os nossos rendimentos, pagamos os salários e as mordomias de todos os governantes através dos nossos impostos, mesmo aqueles mal agradecidos que depois de barriga cheia, chamam nos de vândalos e marginais.
Ensina-nos que, neste País, temos mecanismos que podemos usar para garantir que aqueles a quem elegemos para os cargos governativos comportam-se efectivamente como nossos servidores e nossos representantes sob pena de, não se comportando desse modo, elegermos outro para os cargos.
Em fim, ensina-nos muitas coisas, mas sobretudo constitui um apelo a todos os moçambicanos jovens e velhos, apartidários ou filiados em partidos políticos que não podemos tão-somente viver das lembranças do nosso passado glorioso e heróico e de um futuro melhor hipotético. Precisamos também de ter, em cada fase da nossa existência como um povo, um presente feliz, saudável, de paz e harmonia.
Grupo Diálogo sobre Moçambique no Facebook

201 membros em 12 de Janeiro de 2012

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