Por João Baptista André Castande
Moçambique bem pensado não pode ser Moçambique. Moçambique é o que é pela forma regressiva como ele é pensado pelos seus dirigentes. Pensar regressivamente, quando o mundo pensa progressivamente, é uma característica inata, uma marca indelével e uma identidade cultural própria. Esta a razão por que sinto saudades de um país no qual vivo e do qual nunca saí para viver fora dele. Parece um país habitado por loucos, em que as regras nunca são consideradas Já imaginaram um demente quando atravessa a estrada?" – Lázaro Mabunda, pp. 16 do jornal “O País”, edição de 6-5-2011.
Para a presente “miscelânea”, não encontrei melhor intróito do que o texto acima transcrito, que na minha opinião enquadra perfeitamente os assuntos adiante abordados.
I – Sobre a competência orgânica para aprovar a política interna e externa de Moçambique
Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa ”Dicionários Editora, 6.a Edição, corrigida e aumentada (Porto Editora)”, de J. Almeida Costa e A. Sampaio e Melo, a palavra “realizar” tem os seguintes significados, entre outros: tornar real ou efectivo; praticar; cumprir.
Neste contexto, e nos termos da alínea a), do artigo 40.o da Constituição da República Popular de Moçambique (CRPM), de 20 de Junho de 1975, do n.º 1 do artigo 135 da Constituição da República de Moçambique (CRM), de 30 de Novembro de 1990 e do n.º 1 do artigo 179 da CRM, de 16 de Novembro de 2004, ficou sempre bem claro que o único órgão do Estado exclusivamente competente para aprovar as bases da política interna e externa de Moçambique é a Assembleia da República.
Posto isto, há que recordar que nos precisos termos do corpo do artigo 54.o da CRPM, de 20 de Junho de 1975 e do artigo 151 da CRM de 30 de Novembro de 1990, a realização da política interna e externa de Moçambique é da competência do Conselho de Ministros, enquanto que a parte final do n.º 1 do artigo 203 da CRM, de 16 de Novembro de 2004, defere ao Conselho de Ministros a competência para realizar apenas a política externa de Moçambique.
Entretanto, sendo que tanto o Chefe do Estado assim como a Assembleia da República têm como braço executivo o Conselho de Ministros, não se compreende bem com que fundamentos é que a CRM de 2004 retirou a este órgão a competência para realizar a política interna do país.
Mas a constatação mais espectacular está no facto de que através da Resolução n.º 32/2010, de 30 de Agosto, publicada no 4.o Suplemento do Boletim da República n.º 34, 1.a Série, o Conselho de Ministros aprovou a “Política Externa da República de Moçambique”!
Ora, será mesmo verdade que o Conselho de Ministros é órgão do Estado constitucionalmente competente para aprovar a Política Externa de Moçambique? Como é que foi possível que um erro do tamanho deste tivesse escapado aos olhos “atentos” de todos os membros do Conselho de Ministros? Simplesmente incrível, pois não?!
Repare-se que a alínea e) do n.º 2 do artigo 205 da CRM diz expressamente que o Primeiro-Ministro só pode “presidir as reuniões do Conselho de Ministros destinadas a tratar da implementação das políticas definidas (...)”. E esta?...
Por conseguinte, confundir os significados das palavras “aprovar” e “realizar” constitui erro grave e inadmissível mesmo para seres humanos de média cultura!
Perante tamanha e descarada intromissão do poder executivo (Governo) em matéria da exclusiva competência do poder legislativo (Assembleia da República), o Presidente da República, a Presidente da Assembleia da República ou o Procurador-Geral da República, no âmbito das prerrogativas que lhes confere o n.º 2 do artigo 245 da CRM, deveriam accionar os mecanismos legais necessários à declaração da inconstitucionalidade da supracitada Resolução n. 32/2010, de 30 de Agosto, do Conselho de Ministros.
Durante a sessão plenária da magna Assembleia da República destinada à auscultação do informe anual do digno Procurador-Geral, ouvi algo que não esperava ouvir.
Segundo o editorial do semanário “MAGAZINE” de 11-5-2011 (página 7), “o Procurador-Geral da República, Dr. Augusto Paulino, disse ao Parlamento, em Abril último, que decorria, desde Junho do ano passado, um processo de averiguação dos factos, em território nacional, na sequência da designação, pelo Presidente dos Estados Unidos da América, de Momade Bachir Sulemane, como barão de droga. No dizer de Augusto Paulino, a equipa de investigadores toma em consideração que estamos em presença de um processo de averiguações, não dirigido, necessariamente, contra certa e determinada pessoa”.
Ainda de conformidade com o editorial do semanário em apreço, “paralelamente ao trabalho da equipa indigitada, o próprio Procurador-Geral escreveu e enviou cartas oficiais a cinco países (Estados Unidos da América, Inglaterra, Portugal, África do Sul e Alemanha), pedindo sua colaboração no rastreio do nome daquele cidadão nas suas várias malhas de segurança internacional. De todos esses países, incluindo a Interpol, nada veio ao encontro da designação americana (...)”.
Com base nos factos atrás relatados, eu questiono: com que direito é que o digníssimo Procurador-Geral da República de Moçambique esperava receber respostas positivas dos países destinatários das diligências por si encetadas, sabido que segundo as regras internacionalmente estabelecidas, designadamente nos termos do artigo 78 da Lei n.o 3/97, de 13 de Março, tais países só seriam obrigados a colaborar caso estivessem em causa diligências respeitantes à extradição, auxílio judiciário, execução de sentenças penais estrangeiras e transmissão de processos criminais?
Assim sendo, e salvo errada interpretação do dispositivo legal em alusão, quer parecer-me que o procedimento do digníssimo Procuradoria-Geral da República não passa de puro exercício absolutamente inútil e contraproducente.
Na verdade, que sentido faz a instauração de processo para averiguar factos que o Estado moçambicano, na pessoa do seu ministro do Interior, declarou publicamente ao país e ao mundo que tais nunca existiram, razão pela qual o cidadão Momade Bachir Sulemane tinha a sua folha limpa?
Sendo que contra factos não há argumentos, e sem prejuízo do devido respeito pelas opiniões dos outros, julgo que todas as conjecturas e conclusões até aqui tecidas tendo em vista desvalorizar os procedimentos recomendados pelas leis dos EUA sobre a matéria em questão, não passam de pura falácia para o boi dormir!
Já o havíamos dito, como disse-o recentemente o digno Procurador-Geral Adjunto da República, Dr. Afonso Antunes (pp. 2 do semanário “MAGAZINE” de 11-5-2011), que cabe ao concidadão Momade Bachir Sulemane desencadear “procedimentos legais face à Lei americana, para lavar a sua imagem (...)”.
A frequência com que dirigentes do Estado são acusados de cometerem irregularidades no exercício das respectivas funções, é sinal evidente de que os processos actualmente usados para a sua selecção e nomeação são bastante falíveis.
Aliás, constituiu tamanho espanto para muitos cidadãos quando, há bem pouco tempo, vimos altos dirigentes do Estado sentados nos bancos dum seminário a fim de lhes serem ministradas matérias tão básicas e/ou elementares como patriotismo, auto-estima, liderança e quejandos!
É que para muitos moçambicanos minimamente atentos e conscientes, elementos como patriotismo, liderança, auto-estima, entre outros, são requisitos que devem ser exigidos mesmo a um dirigente tradicional duma povoação, sendo que nomear para altos cargos do Estado cidadãos sem aquelas qualidades não é mais do que um insulto ao povo. Entendo que todos não somos demais para fazer de Moçambique um país de honra e de glória.
IV – Contratação de estrangeiros para a Função Pública
A abordagem do compatriota Lázaro Mabunda sobre este assunto, feita no seu artigo de opinião publicado na página 16 do jornal “O País” de 6/5/2011, superou sobremaneira a minha imaginação.
Todavia, devo acrescentar que falar hoje de contratação de estrangeiros para a Função Pública, volvidos que já lá vão mais de trinta e cinco anos da independência do País, e principalmente neste ano em que termina a implementação da Estratégia da Reforma do Sector Público, parece constituir um conhecimento implícito de que a referida estratégia foi um autêntico falhanço.
Perante esta realidade amarga, sugiro que independentemente da cor política de cada cidadão moçambicano, há que unirmos esforços para que a pátria não regrida por culpa de uns poucos!!!
Tenho dito.
Fonte: Notícias - 27.05.2011
Cordiais saudaçoes, caro concidadao. Com toda razao. " há que unirmos esforços para que a pátria não regrida por culpa de uns poucos!!!" Desde fora a gente vê isto como coisa simples, talves, mas a situaçao lá dentro é critica: Intimidaçao a todo o nivel, os adultos com memorias de anos idos, os jovens enganados com promessas de que com o batuque e maçaroca o harizonte vermelho trarà futuro melhor__, e mais ainda, com a triste realidade de que todos ficam expelidos do sistema que concede migalhas salariais se nao assinam cartao vermelho de membro de partido, (eu pessoalmente fui alvo de perseguiçao por ter escrito ulgum nome de "Reaccionario", esses homens que nunca deixarao de ser moçambicanos e nossos irmaos).
ResponderEliminarAgravado tudo com o facto de a informaçao ser coisa de luxo para a grande maioria... muito por dizer.
Estou querendo reforçar a ideia de "unirmos esforços para que a pátria não regrida por culpa de uns poucos", mas olho, nao sem tristeza, para onde estao levando um pais com grande grande potencial em quase tudo. Quem será o "salvador" e quando chegará a hora de acabar com a anestesia...?
Quem será o "salvador" e quando chegará a hora de acabar com a anestesia...?
ResponderEliminarÉ essa pergunta que cada um deve fazer para si mesmo, deixando de vir com o simplismo de que em Mocambique não oposição credível. Todos nós podemos salvar Mocambique e ainda pacificamente. É por meio de voto que Mocambique não deve atingir os níveis da Coreia do Norte porque isso é perigosissimo.
A informação é um luxo, mas se os poucos com acesso à informação trabalharem com seriedade salvaremos o país do caminho que um grupo de gente o querem levar.