Por Gento Roque Chaleca Jr, Bruxelas
“Combateremos energicamente o espírito de vitória, a auto-satisfação. Nada mais rídiculo e falso do que ouvir um camarada dizer que «tudo está bem, a situação é boa”. (Samora Machel, primeiro Presidente de Moçambique independente).
O Conselho de Ministros reunido em Dezembro último tomou a decisão de atribuir 2011 como o Ano Samora Machel, em homenagem ao 25° aniversário do desaparecimento físico de Samora Machel, primeiro Presidente de Moçambique independente e segundo Presidente da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
Não há dúvida que Samora Machel foi o presidente de todos os Moçambicanos, um homem cujo senso estético não há que pôr em causa. Era, ao mesmo tempo, um defensor acérrimo dos valores da liberdade dos povos oprimidos. Com o perigo de Moçambique cair nas mandíbulas caninas do antigo regime do“apartheid” na vizinha África do Sul e a conjuntura particularmente grave da guerra fria impunha ao “regime samoriano” uma certa rigidez na política doméstica é possível que, nestas circunstâncias, Samora Machel tenha cometido erros de palmatória na gestão do país, mas sobretudo, contra os “inimigos” do seu regime; todavia, não foi no meu franco entender um vilão do povo. De resto já dizia o político guineense, Bobo Keita que “há dois erros na vida: aquele em que se quer fazer bem, e se erra involuntariamente e aquele em que se quer errar deliberadamente, para se fazer mal. De qualquer modo, só não erra quem não está a fazer nada”.
Esperava no entanto que o Conselho de Ministros, mais do que decretar 2011 o Ano Samora Machel, se preocupasse também em desventar a morte misteriosa do seu companheiro de trincheiras. As constantes rajadas de inverdades que têm vindo à superfície em jeito de algas flutuantes do Grande Zambeze, quer através de memórias escritas dos antigos ‘pondhôlos’ (leões de África), quer através de discursos melancólicos proferidos por alguns ‘madalas’ (anciãos) da velha causa comunista, nenhum deles saceiam a curiosidade e o interesse do povo Moçambicano em saber a verdade.
E porque a mentira não se domestica, é fundamental que a verdade seja levantada e divulgada, para que se não construam edifícios da especulação. O grande problema da mentira é de ela ser construída num edifício com vigas de caniço, não dura para sempre. É tudo uma questão de apetites estomacais do dia. Quando as refeições e outras serventias do Estado começam a escassear nos palácios dos “camaradas revolucionários”, os mais afunilados pelas medidas de austeridades, zangados, mostram aos “camaradas capitalistas”, a força hercúlea dos tempos da luta armada. Nessa altura, os ‘candongueiros’ dos mercados informais são abastecidos de documentos históricos sensíveis.
É assim que vão parar, é assim que temos a oportunidade de ver (como meros telespectadores), os mais salientes segredos do Estado nas prateleiras das bancas desses mesmos mercados, em cassetes de áudio ou em papel, que ajudam, por outro lado, a quebrar o longo jejum estomacal dos ‘candongueiros’ dos famosíssimos ‘dumba-nengues’ (mercados informais) do país, como por exemplo, no mercado da ‘Estrela Vermelha’ na capital das manifestações, em Maputo; do ‘Goto’, baluarte da oposição (Beira); do ‘Kuatchena’, na capital do calor (Tete), do ‘Waresta’ na chamada capital do norte, em Nampula, do ‘Aquima’, na cidade das bicicletas, do coco e dos buracos, Quelimane, etc.
A decisão do Conselho de Ministros em homenagear Samora Machel teria sido mais sensata e mais colorida, se o actual secretário do Comité Central para Mobilização e Propaganda do partido Frelimo (Edson Macuácua) não tivesse reivindicado, em logro do seu partido, os “direitos de propriedade e de exclusividade” da efeméride que terá lugar no próximo dia 19 de Outubro. É bom que se diga que esta promiscuidade não é um “produto novo”, já anda nas prateleiras da sociedade moçambicana há duas décadas e alguns dedos de meses. Foi assim, também, em 2009, ano em que o governo atribuiu a Eduardo Mondlane. Vimos um Edson Macuácua, o mesmo de sempre, defender as causas e obras de Mondlane como se ele, o “pimpão” da Mobilização e Propaganda da Frelimo, alguma vez tivesse sido colega de carteira ou amigo muito próximo do obreiro da Unidade Nacional. Às vezes é preciso saber representar!!!
Nem por engano o partido “do batuque e da maçaroca” segue os ideais e valores morais de Eduardo Mondlane assim como manda para o caixote do lixo a filosofia de Samora Machel no que toca o combate à corrupção, mas, sobretudo, contra os dirigentes viciados na demagogia política. Temos um exército deles no país, aqueles que prometem travar o curso do Grande Zambeze com as próprias mãos. Da forma como estas duas figuras são tratadas pelos seus “camaradas” no activo, deixa transparecer a ideia de que o governo /partido Frelimo andam em busca de peixe ‘nıtchenga’ (que se refugia nas dunas de areia do Grande Zambeze) do que propriamente em zelar pelas suas almas e obras. Basta ver, por exemplo, o estado de limpeza que dão à estátua de Samora Machel, mais parece um vulto de barro que emerge de entulhos da imundice, que propriamente uma obra soberana. Samora gostava de flores mas o que lá está, não são nem flores nem plantas, são espinhosas venenosas. Ademais, aquela avenida é tao “insignificante” para colocarem ali a estátua e o nome de Samora Machel.
É cultural nos nossos dirigentes, quando o lema é arregaçar as mangas e vestir o fato-macaco nos lugares dos luxuosos fatos, surgem sempre pretexto de enxaqueca ou lotação de agenda, tantas desculpas são desenterradas dos arquivos daquelas memórias para, entre outros desígnios, justificar o injustificável: “hoje não posso, fica para a próxima ocasião”, “tenho tempo esgotado, estou com a agenda lotada”, “estou de viagem”, etc. Mas quando o pressuposto da cerimónia é festejos já não há quem arranje desculpas esfarrapadas. Não arranjam desculpas nenhumas para mostrar os seus dotes de bom comedor de bifes, de melhores dançarinos que são. Na alegria as dores de reumatismo ou de enxaqueca são resguardadas para a vez em que se é preciso sujar as mãos e o fato-macaco. É incrível!!! (x)
Fonte: Wamphula Fax - 28.01.2011
"Por acaso alguém anda a ler os jornais!? Desde os finais de 2009 qual foi o “espantalho” que levantaram? Alguém pode me explicar o súbito surgimento do samorismo nos finais de 2009 em género de música, Filmes, livros, camisetas, artigos carregados de uma suposta “mea culpa” exacerbado como se não tivessem feito parte do governo que cometeu atrocidades em nome da revolução. A quem eles dedicaram este ano? Preparem-se que nem diogos, nem mulembwes…"
ResponderEliminarLí lá no "O pais" este comentario e achei muito interessante para uma análise,
http://www.opais.co.mz/index.php/politica/63-politica/12010-ar-espera-contribuicao-russa-na-revisao-da-constituicao.html
A pergunta é porqué Samora aqui e ali?
ResponderEliminarCaro Maquiti
ResponderEliminarConcordo com o teu questionamento. Eu também questiono isto e aquilo que chamam de celebrar heróis.