Por Lázaro Mabunda
Os nossos governantes só pensam no seu direito de decidir, nunca no seu dever de proteger o cidadão do impacto das suas “nocivas” decisões.
Cada vez mais, convenço-me que este Governo se perdeu no tempo e no espaço. Cada pronunciamento de um dos seus membros é uma contradição e uma aberração, o que dá, cada vez mais, vontade aos jornalistas de os entrevistar, para terem manchetes nas edições seguintes dos seus órgãos de informação. Até me parece que todos foram seleccionados biometricamente para compor o Governo. Está, igualmente, a solidificar em mim a ideia de que dentro do Conselho de Ministros há projectos que são aprovados sem que haja estudos e discussões para que todos entendam efectivamente os seus conteúdos, e de que projectos se tratam. Confesso que nunca, na vida, havia assistido a um festival de pronunciamentos e ideias tão contraditórias, tão inconsistentes, tão incoerentes e tão gasosas de um governo, como aqueles que estou a ser obrigado a escutar nos últimos tempos. Na última quarta-feira, o ministro da Planificação e Desenvolvimento, Aiuba Cuereneia, veio a público assumir, definitivamente, que os preços dos passaportes são uma autêntica aberração e insuportáveis para o cidadão que apenas vive do seu salário.
Quando questionei os negócios do Governo com a Semlex, desde o processo de adjudicação – ajuste directo – até aos preços que seriam praticados, fui tido e achado como um anti-patriota a soldo de interesses externos e de algumas empresas que estavam interessadas no negócio. Esqueceram-se que eu sou povo, vivo o povo, com o povo, para o povo e os problemas do povo, no subúrbio, ou seja, sou porta-voz do povo. Quando durmo, sou acordado, à vezes, com o grito “amuyiveeee (ladrãããooo)”. Nunca se dorme tranquilo, nem se anda tranquilo ao anoitecer.
Com estes preços de passaportes, os guardas das quintas dos ministros e suas empregadas domésticas, em Boane, Matola-Rio, Tchumene, etc..., a minha camponesa mãe, no interior do posto administrativo de Nalaze, distrito de Guijá, o pastor de gado e o camponês de Milange ou Ngaúma não podem visitar os seus filhos ou familiares nos vizinhos Suazilândia, África do Sul e Malawi, respectivamente, porque não possuem 3 000 Mt para adquirir um passaporte, um documento de identificação.
Os nossos governantes só pensam no seu direito de decidir, nunca no seu dever de proteger o cidadão do impacto das suas “nocivas” decisões. Ignoram que cada direito corresponde a um dever, isto é, cada direito que nós temos por sermos seus governados corresponde a um dever deles por serem nossos governantes, reciprocamente. Se nos obrigam, por direito, a pagar tanto dinheiro por um documento de identificação, também são obrigados, por dever, a criar condições para que tenhamos acesso ao mesmo documento sem recorrer a vias ilícitas para o efeito.
Disse, o ministro Aiuba Cuereneia, que o governo equaciona reduzir o actual preço de passaporte, por ser inacessível ao pobre cidadão: “Se o cidadão não pode pagar o passaporte, onde é que o Governo vai obter dinheiro para o efeito, sabendo que os fundos do Governo provêm dos impostos pagos pelos cidadãos? Isto quer dizer que é preciso que todos nós trabalhemos e encontremos uma solução. Agora, talvez para aquelas pessoas que não podem pagar o valor exigido e que precisam do passaporte. Está, neste momento, a reflectir-se”. Ora, esqueceu-se Cuereneia que há sensivelmente sete, oito meses, quando eu mesmo levantei este assunto, em série de reportagens, o então ministro do Interior, ora ministro da Agricultura, o memorável José Pacheco, disse que o entendimento do Governo foi de que “quem procura passaporte não é um cidadão qualquer” e que este documento “não é para quem quer”, mas “para quem pode”. Como se explica que o mesmo Governo hoje chegue à conclusão de que passaporte é, na verdade, documento para qualquer cidadão? Agora, já nos pedem para trabalharmos juntos na busca de solução. Quando decidiram, o povo não foi consultado. Isto é boa governação.
Adiante, Cuereneia disse: “Agora, podemos pensar se o Governo pode fazer alguma coisa para podermos aliviar este preço. Mas este é o custo real para a emissão do passaporte”. Mais uma vez, Cuereneia faz-se de esquecido, que havia outras alternativas para a produção dos mesmos documentos a preços acessíveis. O problema é que o Governo não estava interessado em que houvesse um concurso público que atrapalhasse o fabuloso negócio que eles iriam fazer com a Semlex, cujo endereço (localização) é até aqui desconhecido. Porque os interesses de um grupinho se sobrepuseram aos de mais de 20 milhões de moçambicanos.
Aiuba Cuereneia revelou que há um trabalho que está a ser feito neste momento, no sentido de se reflectir sobre a matéria, sendo que dentro de algumas semanas o Governo vai divulgar os resultados. Está a dizer, na verdade, que o Governo avançou para este negócio sem nenhum estudo que indicasse os possíveis cenários para este fabuloso projecto, com uma empresa que iniciou a produção dos mesmos documentos ilegalmente – sem registo comercial. Obteve o registo a 29 de Julho deste ano, após ter começado a emitir documentos em Outubro do ano passado.
O mesmo governo já disse que não havia condições para subsidiar os preços de combustível e de bens de primeira necessidade, mas, quando foi sacudido por manifestações, mudou de versão e assumiu que havia condições para subsídios. O mesmo Governo disse, recentemente, que o prazo de registo de cartões pré-pago das telefonias móveis não seria prorrogado. Volta e meia, mudou de discurso e assumiu que não havia condições para cumprir os prazos...
Fonte: O País online - 26.11.2010
Excelente artigo este. Repito: excelente. Este Magunda, quando entende ESCREVE, pá. Sim senhor, parabéns.
ResponderEliminarZicomo
Sr Lázaro Mabunda,
ResponderEliminarHouve muita abstenção eleitoral, mas os que votaram, votaram na continuidade da "farra".
Tem toda razão e resumiu correctamente o imbroglio dos documentos, mas a culpa é sua e dos moçambicanos que acreditam no melhor entre os dois-digo guerrilheiros-Frelimo e Renamo.
Mas Moçambique não acaba nos dois.
Existe a sociedade moçambicana-boa gente, humilde e pobre- que assistiu aos dois "energúmenos" a destruirem a economia-seja, o que o colono construiu em 35 anos.
Porque antes de 1940, quase nada exisitia.
Cabe a sociedade moçambicana, "ABRIR OLHOS", basta de dormir, há mais partidos com gente de mãos limpas.
Dá para pensar , qual a razão de alto preço no documento.
O segredo é de que assim , mantém-se os 37% da população sem documentos e não votantes, que poderiam criar uma história diferente para o futuro de Moçambique.
SEMLEX é conspiração!
FUNGULAMASSO
Num pais Normal estes factoe levariam a demissoes, investigacoes da procuradoria, etc,mas Mocambique nao e' pais normal, por isso acontece isto. "e que sao levantados muitos factos em muitos assuntos e as pessoas que estao a frente dos asuntos publicos sem vergonha na cara aparecem a contar coisas sem sentido.Tudo indica que so a forca os nossos governates mudarao pois o Povo nunca esta nos seus planos e sim o seu estomago e bolsos
ResponderEliminarO povo moçambicano,particularmente os mais esclarecidos e que tem acesso as migalhas do regime, devem compreender que os governantes só desgovernam. E constantemente abusam os direitos dos cidadãos consagrados na constituição da República. De facto é triste ver os governantes a falarem sem ter feito o TPC necessário. É lamentavel. Devem ir à rua!
ResponderEliminarGostaria que se considerasse um pouco mais a "diaspora",
ResponderEliminarQue disponebelizassem os passaportes nas embaixadas, por forma que nao prejudicasse a vida e trabalho daqueles mocambicanos que mesmo vivendo fora do pais, contribuem para a diminuicao da pobreza,
Eu continuo 'a espera dos meus passaportes.
Estamos a falar de cerca de 67% do salario de um tecnico medio em Mocambique! portanto nao se fala dos que estao abaixo deste...
ResponderEliminarLazaro, Falando na incoerência, em Malhampswene as pessoas com posses estam a mudarem do Bairro, falo de directores nacionais e outras classes como Gestores de alto nível. Tudo por causa de uma lixeira que localiza-se logo ao lado da empresa DARLING.
Veja que este Bairro foi parcelado e atribuído a famílias que foram erguendo suas “casas” hoje vê se obrigados a conviverem com a imundice!
Quem parcelou o Bairro será que não teve em conta esse aspecto? Ou é simplesmente maldade por parte dos nossos governantes?
A outra coisa é dar maior prioridade a questões meramente económicas em detrimento do social, alguém já viu o acórdão do TA? Está claramente o Presidente a agir para agradar, porque está claro que a Mozal é uma indústria altamente poluidora, e com essa de “By passa” pior!
Mas os interesses económicos de sei lá quem estão comprometidos caso a Fábrica não seja autorizada a limpar-nos!!!