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domingo, setembro 19, 2010

A borracha de Pacheco que furou a cabeça de Hélio

Por Lázaro Mabunda

“Não consigo esquecer do Hélio. (...) vou viver com a incerteza de ter sido meu (tiro que matou Hélio). É uma marca que me vai perseguir até à cova. E pior é que não era alguém que estava na manifestação. Soube pelos jornais que se tratava de estudante. Como é que podes viver em paz quando as imagens mostram sangue e livros”, depoimentos de um agente da polícia no jornal “@ Verdade”

As borrachas de Pacheco foram tão duras quanto o aço ao ponto de furar fatalmente a cabeça do pequeno Hélio...

Hélio era um menino que, como todos os outros, tinha um sonho. Não sei qual, mas muitos meninos da sua idade sonham ser engenheiros, médicos, ministros, presidentes da República, jornalistas, advogados, entre outros. Creio que o sonho dele estava entre estes. A 1 de Setembro deste ano, Hélio não só viu o seu sonho ser desfeito como também viu a sua vida prematuramente interrompida por uma bala de borracha, do ministro do Interior, José Pacheco, que lhe furou a cabeça, quando regressava da escola, onde ia à busca dos sonhos. Juntamente com os seus livros e sonhos, Hélio caiu morto. O seu sangue escorreu sobre o chão e chocou o mundo. A sua imagem circulou na internet. Eu recebi-a. O que mais me chocou foi ter visto a abertura feita pela “bala de borracha” na sua cabeça.
Horas depois, José Pacheco, ministro que devia zelar pela segurança do menino Hélio, apareceu na Televisão de Moçambique a dizer que a polícia usava balas de borracha, negando que estivesse a recorrer às balas reais.

Hoje, os agentes envolvidos na manutenção da ordem (?) aparecem publicamente a assumir que não só usaram balas de borrachas como também as reais, sob ordens superiores, contrariando o ministro do Interior.

“AKM é uma arma muito traiçoeira. Um tiro para o ar pode, no caso de encontrar uma parede ou um objecto sólido, ganhar outra direcção e atingir uma pessoa mortalmente (...), o que não quer dizer que os polícias não tenham atirado em exclusivo para o ar. Houve colegas que dispararam para a população e até para pessoas indefesas”, confessa um dos agentes, no jornal “@ Verdade”.

No mesmo jornal, o mesmo agente refere que trabalhou nos pontos onde a manifestação popular foi mais violenta e que “a polícia não tinha como conter os ânimos, os manifestantes atiraram pedras. O carro da terceira esquadra ficou sem vidro traseiro. Alguns comandantes ficaram feridos. Não é verdade que usamos apenas balas de borracha. Em Xiquelene, por exemplo, o carro da polícia não voltou por causa dos manifestantes. Voltou porque já não tinha balas, tanto as reais como as de borracha”.

O erro de Hélio foi ter sonhado em ser o que os outros são hoje. Ir à escola a pensar que tinha um Governo que o protegia, um ministro que zelava pela sua segurança e pelos seus sonhos. Quando viu a polícia naquele tumultuoso dia, julgou que tivesse sido salvo de qualquer eventual assalto, a sua segurança estava garantida, não imaginou que era a polícia a principal ameaça à sua vida. Assim, encontrou uma morte violenta como se de um criminoso se tratasse.

Hélio não era manifestante. Era simples aluno. Uma flor que a família conservava com muito carinho, mas que uma simples bala de “borracha”, repito, de “borracha”, fê-la murchar muito cedo, deitando a baixo todo o esforço da família. Um esforço de longos anos, no meio de tantas dificuldades. As borrachas de Pacheco foram tão duras quanto o aço ao ponto de furar fatalmente a cabeça do pequenino Hélio.

Conta um dos elementos da polícia, entrevistado pelo “@ Verdade”, que eles (os polícias) são também povo. “Trabalhamos 30 dias e o salário só dura três ou cinco dias” e “Não é fácil estar por detrás da arma que dispara contra o povo. Até que esse povo é nossa imagem e semelhança”, desabafa um dos agentes que, por sinal, estava na viatura da polícia que disparou as borrachas que escolheram um menino que regressava da escola para interromper a sua vida.

“No fundo, nós estávamos a torcer para que tudo desse certo. Disparar para o povo foi um acto de dor. Não consigo esquecer o Hélio”, conta frustrado, acrescentando que “Éramos muitos e é difícil saber de quem foi o tiro nestas circunstâncias”.

Disse ainda em jeito de penitência que “vou viver com a incerteza de ter sido o meu (tiro que matou Hélio). É uma marca que me vai perseguir até à cova. E pior é que não era alguém que estava na manifestação. Soube pelos jornais que se tratava de estudante. Como é que podes viver em paz quando as imagens mostram sangue e livros? Talvez Hélio tivesse, um dia, a instrução que eu não tive”.

Não é só este polícia que vai ficar marcado pela morte de Hélio, como também o próprio ministro do interior, o rosto de balas de borrachas que furaram, mortalmente, a cabeça do menino Hélio. Aliás, não tenho mínimas dúvidas que enquanto continuar ministro do Interior – sempre que aparecer publicamente em televisões – o rosto de Pacheco será visto pela família como a bala de borracha que exterminou os sonhos e a vida do pequenino Hélio.

Matar Hélio e desejar condolências à família é demasiado ofensivo, sobretudo quando se sabe que quem tutela o órgão que o matou nega ter usado balas reais. Eu, o que desejo, no mínimo, é que o ministro do Interior apareça publicamente a pedir desculpas às famílias enlutadas pelas suas borrachas de aço e, no máximo, que repense no seu futuro na pasta que ocupa, em nome dos familiares das pessoas mortas pelas mesmas borrachas, sobretudo de Hélio.

Fonte: O País online - 17.09.2010

6 comentários:

  1. Quer comentar, Mutisse???

    Zicomo

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  2. Comentar?
    Acho que fugiu com o rabinho entre as pernas...

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  3. Espero por si, amigo Júlio Mutisse. Cadê o amigo???

    Zicomo

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  4. Neste tema eles vão fintar. Já os conheco.

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  5. V. Dias,

    Ja disse que a conveniencia retira a liberdade mental mas a conviccao pelo contrario, porque consegue reconhecer o erro.

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  6. Ora viva Chacate Joaquim,

    De facto...

    Simples e breve o seu débito.

    Esclarecido.

    Zicomo

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