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segunda-feira, agosto 16, 2010

Revisão da Constituição: A importância da participação popular

TRIBUNA DO EDITOR

Por Fernando Gonçalves

Multiplicaram-se nos últimos tempos pronunciamentos de dirigentes do partido Frelimo ou de indivíduos muito próximos desta formação, sobre a necessidade de revisão da Constituição da República, em vigor desde Janeiro de 2005.
Dado o curto espaço de tempo que nos separa desde a entrada em vigor da presente Constituição, levantam-se vozes que se interrogam sobre quais serão os objectivos a alcançar com a aludida revisão constitucional, e sobre que mudanças fundamentais teriam se operado em tão curto espaço de tempo na nossa sociedade para justificar tal acto. Tais inquietações adensam-se ainda mais surgindo, como é o caso, no seguimento de uma maioria qualificada obtida pela Frelimo nas eleições do ano passado.
Receios de que a Frelimo iria utilizar esta maioria qualificada para mudar a Constituição não são novos, e começaram a circular em reacção ao esforço titânico realizado por aquele partido para a obtenção da actual maioria durante a sua campanha eleitoral. O preço dos métodos menos ortodoxos utilizados para se alcançar esse nobre objectivo está a ser pago hoje pela vasta maioria da população pobre deste pais.
A constituição de um país não pode ser um documento imposto ao povo por um grupo de 250 homens e mulheres sentados numa sala em plenário. Deve ser um processo popular, profundamente enraizado na noção de que a soberania reside no povo.
Independentemente da sua maioria qualificada no parlamento, a Frelimo não pode recorrer ao uso abusivo dessa maioria para a prossecução de agendas cínicas que entram em confrontação com os mais amplos interesses do povo.
Certamente que se a Constituição constitui a plataforma a partir da qual o governo busca a sua legitimidade e poder para dirigir o Estado, logicamente que não pode ser esse mesmo governo a fazê-la. O governo não pode se criar a si próprio. Assim sendo, a Constituição não pode ser um acto de um governo que ele próprio deve a sua existência a essa mesma Constituição.
A questão da legitimidade da Constituição deve estar ligada à necessidade de ela merecer a lealdade e a confiança do povo. E para que uma Constituição mereça a lealdade e confiança do povo ela deve ser feita pelo povo, o que pressupõe que a sua aprovação deve ser antecedida de um amplo debate popular à escala nacional, a ser consagrado através de um referendo popular.
Por sua vez, e neste caso tratando-se de uma revisão, um amplo debate popular deve pressupor que o povo esteja devidamente informado das alterações e das motivações práticas que impõem a necessidade de uma tal alteração.
Obviamente que não é toda a Constituição que a Frelimo pretende ver alterada. Mas para que haja clareza junto do público quanto ao que se pretende fazer, é obrigação desta formação politica maioritária articular, de forma clara e despida de quaisquer ambiguidades, aquilo que são os aspectos da Constituição que pretende que sejam alterados.
Até aqui, o mais próximo que se pode ter percebido das possíveis intenções da Frelimo foram algumas propostas lançadas por um dos seus militantes “clandestinos”, e que nos últimos tempos tem se feito passar por um dirigente da oposição.
Tais propostas incluem a necessidade do Presidente da República passar a ser eleito pelo parlamento. É uma proposta razoável e racional, no sentido de que irá significativamente reduzir os custos de produção de um boletim e uma urna específicos para a eleição presidencial. Mas será preciso saber se a Frelimo estará culturalmente preparada a abraçar um modelo de governação que convencionalmente terá que sujeitar o seu presidente ao escrutínio parlamentar, incluindo uma presença regular na Casa do Povo para responder a perguntas dos deputados. Actualmente, o Presidente da República pode reduzir a sua interacção com o parlamento apenas ao seu informe anual sobre o Estado da Nação, mas a partir do momento em que ele é eleito por aquele órgão legislativo passa a prestar directamente contas a ele.
Outra proposta que veio da já referida figura iluminaria é o alargamento do mandato presidencial para sete anos. O argumento avançado foi de que o actual mandato de cinco anos não era suficiente para permitir que o Presidente da República leve a bom termo o seu programa eleitoral.
Mas se quisermos nos amarrar a esse tipo de argumentos, chegaremos à conclusão de que nenhum mandato é suficiente. Porque as tarefas nunca chegam ao fim. Atingem certas etapas, que depois devem ser continuadas por outros. A noção de que dirigentes têm missões infindáveis levou no passado muitos dirigentes africanos a entrincheirarem-se no poder por toda a vida, acabando por se tornarem traidores da mesma causa da liberdade por que durante muitos anos sacrificaram as suas vidas.
Ao longo do tempo o ser humano chega a um ponto em as suas capacidades de desempenho atingem um limite, e será perigoso se a nossa Constituição tiver que consagrar o princípio da insubstituibilidade.

Fonte: SAVANA in Diário de um sociólogo - 13.08.2010

Reflectindo: Para mim, qualquer mudanca nos moldes em que se fala, só poderá ser feita depois de um referendum. Sejamos claros, a Constituicão da República não deve ser alterada por um grupo de indivíduos que não têm cultura de respeito a essa lei mãe. 

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