Canal de Opinião
Por Noé Nhantumbo
Não se pode dizer que a cidade tenha parado no tempo e no espaço. Mas pode-se afirmar resolutamente que a Cidade da Beira, face a um confronto político profundo e avassalador, tem com frequência perdido de vista os seus mais legítimos interesses. A sua vida sócio-económica tem sofrido em função das suas tendências de voto. E aí temos de continuar a ter coragem como cidadãos de recusar imposições e condicionalismos que não mais serão do que adiar a realização daquilo que são os mais nobres interesses de todos.
Há uma tendência natural e política de “puxar a brasa para a sua sardinha” e com isso dizer que se encontrarão cidadãos descontentes com o rumo que as coisas estão tomando nesta cidade que também é sua.
As sucessivas reuniões dos órgãos municipais mostram claramente clivagens que não do interesse concreto dos cidadãos. E naqueles encontros, através de seus legítimos representantes, os beirenses devem aprender a utilizar essa possibilidade democrática de participação política.
Numa corrida que se afigura desenhada para fazer valer interesses políticos os cidadãos tem consistentemente votado na direcção contrária a determinados políticos. Já houve correntes que empurravam os beirenses para o voto étnico mas essa possibilidade foi logo descartada pelos cidadãos que cedo entenderam que ela era essencialmente contrária ao seus desejos e aspirações. Também o desejo de fazer valer supostas contradições de carácter religioso não vingaram.
Analisando friamente o panorama político nacional, é fácil verificar que Beira constitui a única autarquia que é governada por um executivo que não é filiado no partido Frelimo. E isso tem as suas consequências, especialmente se compreendermos que em Moçambique ainda reina muita intolerância política. Muitos projectos e orçamentos não foram aprovados devido a motivações puramente políticas embora com dolorosas consequências sociais. É coerência reconhecer que temos problemas.
Aqui e nestes termos Beira transformou-se em algo muito profundo e de significado histórico tremendo. Aqui foi possível mostrar aos moçambicanos e ao mundo que a Frelimo pode ser derrotada num processo democrático. Ficou claro que mesmo com a utilização abusiva e evidente de meios públicos para sustentar a sua campanha política rumo as eleições autárquicas, com o domínio completo dos órgãos eleitorais, isso não era suficiente para vencer numa autarquia que tinha já no passado colocado a faísca bastante alta para os políticos aspirantes a governar a cidade. A aspiração manifestada por certos segmentos políticos nacionais de obliterar a oposição não se realizou sobretudo porque a Beira resistiu aos ataques avassaladores e com suporte “bélico” bem superior.
Ao acabar de comemorar a 20 de Agosto mais um aniversário da sua elevação à categoria de cidade só podemos desejar a estes corajosos munícipes votos de progresso e desenvolvimento rumo a satisfação das suas necessidades. Que o futuro próximo desta sofrida cidade seja coroado de êxitos.
Que os pretendentes e aspirantes a políticos de todo o país aprendam sem vergonha como se governa uma cidade e sobretudo o que é coabitação política e quais são as potencialidades reais de uma situação política em que todos se respeitam e se aceitam na sua diversidade.
Alguns solavancos ocasionais têm travado projectos de investimento de grande vulto que decerto contribuiriam para a criação de tão necessários postos de emprego. Também faz falta a existência de uma política de fomento de actividades económicas que seriam o suporte para a criação dos necessários postos de emprego.
Alguma fobia na abordagem dos reais interesses dos cidadãos e uma cultura de aproveitamento ilícito dos cargos públicos ocupados por algumas pessoas tem sido evidente no tratamento de alguns processos e dossiers. Desde os tempos da governação da Frelimo que o dossier de terras municipais tem sofrido um tratamento que não passa de remendos sem nunca conseguir ultrapassar ou resolver as necessidades dos munícipes. Nesta altura de celebração convém não esquecer que este dossier ainda continua a constituir um autêntico “Calcanhar de Aquiles” para o desempenho municipal.
Importa abordar o assunto com coragem e utilizar todos os meios a disposição do Conselho Municipal da Beira para travar desordens e aproveitamentos ilícitos com algo que é de todos. Entanto que local de experimentação de uma salutar descentralização governativa convém que os dirigentes municipais assumam o significado histórico do que fazem hoje.
Tudo o que for mal feito hoje terá repercussões nos dias de amanhã.
Não se pode aceitar que o populismo tome conta da situação e que os governantes municipais tenham que evitar a Postura Municipal aprovada em benefício de actuações à margem clara da lei.
Temos que referir neste momento de comemoração, que esforços têm de ser envidados no sentido de travar a ruralização da cidade. Aqueles lugares em que a prática de actividades de venda mais ou menos fixa ou ambulante de bens está proibida pela Postura Municipal devem deixar de servir para isso. As normas devem ser cumpridas escrupulosamente.
Desenvolver a Beira tem de contar de facto com participação efectiva dos seus cidadãos. São os cidadãos que devem travar e contrariar tendências de intolerância política evidenciada por alguns políticos que não aceitam ou se recusam, a assumir que existem coisas bem feitas pelo CMB.
É necessário que aquela governação participativa seja real e isso só se pode concretizar quando os académicos, comerciantes, industriais, políticos saírem dos seus “casulos” e se dirigirem aos seus órgãos municipais para sugerir e manifestar discordância ou aceitação com alguma coisa. A participação ou governação participativa deve abandonar o campo dos “slogans” políticos e ser utilizada para a democratização da vida desta cidade.
É preciso estarmos atentos aos tempos e participar no desenho de soluções para os grandes problemas da nossa cidade. Se a erosão fizer ruir a cidade sofreremos todos. Se o porto está assoreado e pouco funcional, é dispendioso, se os caminhos-de-ferro que partem desta cidade para os países do hinterland funcionam com problemas, se o aeroporto é pouco amistoso e cobra taxas mesmo aos que lá não parqueiam, se as autoridades policiais de protecção e de trânsito bem como municipais são corruptas e prontas a “entrar no bolso dos cidadãos” para resolver qualquer problema, então é a cidade toda que se torna menos hospitaleira e atractiva aos turistas e potenciais investidores.
Esta é a altura propícia para vendermos uma imagem daquilo que queremos que a Beira seja. Devemos fazer isso tão cedo quanto possível.
Continuaremos a ter dificuldades orçamentais para concretizar os diversos projectos mas isso não pode travar o curso das actividades tendentes a trazer o tão almejado desenvolvimento a esta cidade.
Somos Beira e continuaremos a ser aquela Beira que dá lições de democracia política a todo Moçambique. Não somos melhores nem piores, não somos reaccionários como alguns políticos sem coerência se apressam a caluniar-nos. Somos simplesmente diferentes, moçambicanos que ao longo dos anos da história têm demonstrado possuir uma fibra e vontade próprias, acima de qualquer compromisso com imediatismos e prostituição política.
Força Beira. Parabéns ainda a todos aqueles que aceitaram sacrificar-se para fazer vingar um projecto de cidadania responsável e adulto...
(Noé Nhantumbo)
Fonte: CanalMoz - 2010-08-25
Apenas este ano não fui às festividades da Cidade da Beira. Recebi o convite, mas porque estou nas "minas", como sabem um mineiro nunca sabe ao certo quando é que vai abandonar o subsolo, fique, por isso, naturalmente, muito triste.
ResponderEliminarQuanto a crónica de Nhamtumbo (rabo em minha língua nhungue) acho sensacional. Este homem escreve e eu gosto. Parabéns. Pena é que está, como eu, do lado errado da história. Do lado de D. Miguel e não D. Pedro. Que pena.
Zicomo
Beira um pais dentro dum Pais, os lambebotas e escovinhas da Beira são do menor impulso dos que do maputo, na Beira não ha `´brincaBeiras´´
ResponderEliminarHá comentários que o Nelson Livingston, havia escrito aquando a reeleicão de Daviz Simango. Os beirenses escolhem conforme as suas avaliacões.
ResponderEliminarE não é verdade?