Culto da personalidade assalta a Assembleia da República

A título de exemplo, nesta terça-feira, todos os deputados do partido Frelimo aplaudiram de pé entusiasticamente quando o primeiro-ministro Aires Ali pediu para beber um copo de água, durante a apresentação do Plano Quinquenal do Governo

O culto da personalidade está a tomar proporções alucinantes na Assembleia da República, nesta VII Legislatura. Os deputados das bancadas do partido Frelimo e do partido Renamo são os que mais se destacam na maratona da bajulação. Longe de trazer intervenções que vão ao encontro daquilo que o eleitorado espera, os oradores, nos seus discursos, tratam de atribuir qualidades “excepcionais” aos líderes dos seus respectivos partidos.

É caso para dizer que, em vez de estarem na Assembleia para representar o povo, como seria de esperar, estão lá para representarem Armando Guebuza e Afonso Dhlakama, conforme o partido a que pertencem aqueles que ali são chamados “representantes do povo”.

No debate do Plano Quinquenal do Governo, praticamente quase nada está a ser dito em relação ao mesmo, sendo o debate substituído pelo louvor das alegadas capacidades e suposta sabedoria dos líderes partidários. Vive-se um autêntico endeusamento dos chefes, com discursos desenquadrados do tema da agenda desta sessão da Assembleia da República.

Ontem, quarta-feira, a divinização dos chefes e os discursos vazios tomaram conta do plenário, ao mesmo tempo que o sono tomava conta de alguns “representantes do povo”, pois a canção dos líderes sábios e belos já foi ouvida vezes demais.

Até há intervenções de insistência, diga-se para insistir no escovismo, apresentando os líderes dos dois partidos mais votados como sendo os seres humanos mais geniais que a Humanidade já conheceu.

A Frelimo vai na dianteira neste concurso do culto da personalidade, porque, durante as suas intervenções, os deputados, regra geral, começam por exaltar primeiro o seu partido, pela “vitória retumbante”, depois o Presidente da República, “pela forma sábia como tem conduzido os destinos do país”, segue-se o primeiro-ministro que, além de ser “sábio e iluminado”, foi nomeado “sabiamente” por outro sábio, e, neste caso, termina-se a ronda voltando ao PR. Na ronda de exaltação e de prestação de culto à personalidade, a seguir vem a presidente da Assembleia da República, que também é extraordinariamente elogiada, alegadamente porque é a mulher certa para ocupar o cargo, e foi uma decisão sábia colocá-la à frente da “Magna Casa do Povo”, portanto Guebuza volta a ser sábio mais uma vez.

Ainda na lista das lideranças iluminadas, segue-se a chefe de bancada do partido Frelimo que, também, segundo os deputados do seu partido, é muito sábia e foi nomeada sabiamente pela liderança do partido, isto é, de novo em primeiro plano Guebuza, o “Grande e Querido Líder”. Por fim, e sem apresentar dados estatísticos, chegou-se mesmo a dizer que Armando Guebuza é o moçambicano mais amado de todos, devido à sua “excepcional” sabedoria.

Já do lado da Renamo, o seu líder, Afonso Dhlakama, é também saudado e elogiado em quase todas as intervenções. Fala-se desde a sua sabedoria, até à sua coragem e humanismo.

Seria difícil imaginar um espectáculo como este, mas parece que se está a brincar com a vida do povo moçambicano na Assembleia da República, em vez de se debater o plano do Governo e demais assuntos que preocupam os cidadãos. Provavelmente os deputados são pagos para exaltarem os seus respectivos presidentes, usando o pretexto de servir um povo que, na verdade, está longe de ser servido. Tudo indica é que estão a servir-se do povo para fins exclusivamente pessoais.

(Matias Guente)

Fonte: CanalMoz - 01.04.2010

Reflectindo: ganharam mais tempo para o culto. O culto à personalidade é propocional ao tempo que cada bancada tem de direito.