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domingo, março 14, 2010

Recordo-te que o Presidente da CNE tem, para esses efeitos, o estatuto de ministro e os outros membros o estatuto de vice-ministro"

MARCO DO CORREIO

Por Machado da Graça

Olá, Celeste. Como estás tu? E a tua família?
Do meu lado vai tudo bem, felizmente.
Queria hoje falar-te de uma coisa que me preocupa bastante: a grande elasticidade com que o nosso Poder trata a obrigatoriedade do cumprimento das leis.
Lembras-te de que, no período eleitoral, os membros da Comissão Nacional de Eleições não sabiam dizer outra coisa senão que as leis deviam ser rigorosamente cumpridas? Aquilo parecia uma ladainha que eles rezavam sempre quando alguém protestava contra as decisões arbitrárias que eles tomavam no segredo dos seus gabinetes.
Mais tarde calaram-se quando alguém lhes chamou a atenção para o facto de a lei dizer que os membros da CNE deviam exercer esse cargo com exclusividade. E calaram-se porque, ao que suponho, até hoje nenhum deles abandonou os outros cargos que exerce noutras instituições e pelos quais recebem pagamentos. Nenhum deles, a começar no Presidente e a acabar no último vogal.
Isto já para não falar da decisão do Conselho Constitucional que coloca em causa a legalidade de algumas das decisões tomadas pela CNE em prejuízo da oposição.
Mas agora temos um novo exemplo.
A lei 8/2007, no seu artigo 10, parágrafo 2, determina que, em cada nova legislatura, deve ser nomeada a Comissão Nacional de Eleições até 60 dias depois do seu início.
Ora isso não aconteceu até à data-limite estabelecida por aquela lei que, neste caso concreto, era o dia 5 de Março. O que significa que a anterior CNE, isto é, o Dr. João Leopoldo da Costa e a sua equipa continuam em funções e auferindo os seus salários e outras regalias.
Recordo-te que o Presidente da CNE tem, para esses efeitos, o estatuto de ministro e os outros membros o estatuto de vice-ministro.
Portanto, mais uma vez a lei não é cumprida e esse não cumprimento vem beneficiar os membros da CNE, que acabam por ver prolongadas as suas mordomia$ para além da data em que a torneira se deveria ter fechado para eles.
Mas, poderíamos pensar, se fôssemos ingénuos, que a Assembleia da República (AR), que foi quem aprovou a tal lei, deverá estar furiosa por ela não estar a ser cumprida. Por a vontade soberana do povo, traduzida em forma legal pela AR, estar a ser desrespeitada.
Puro engano. A AR parece estar-se completamente nas tintas, se avaliarmos pelas palavras do porta-voz da sua Comissão Permanente, o deputado Mateus Katupha.
Segundo o ilustre parlamentar, citado pelo jornal Canal de Moçambique, “a inobservância da lei não é assunto relevante”. Segundo ele, há coisas mais importantes com que o Parlamento se deve preocupar.
E ficamos assim a saber que houve gente que propôs aquela lei, gente que a debateu na generalidade e na especialidade, provavelmente gente que fez propostas de alteração que posteriormente vieram, ou não, a ser aprovadas e tudo isto, para que agora não seja relevante a lei ser observada ou não.
Eu diria, minha boa amiga, que é uma situação bizarra se bizarrias destas não fossem o pão nosso do dia-a-dia de quem tem, entre nós, o martelo do Poder na mão. E quer continuar a ter, com ou sem leis.
E assim, sem praticamente nada para fazer neste período em que as próximas eleições ainda estão longe, o dr. João Leopoldo e os seus companheiros vão continuando a auferir salários e benesses à custa de todos nós.
Lembra um bocado aquele réu do julgamento dos Aeroportos de Moçambique que ganhava quase 2000 dólares por mês sem fazer absolutamente nada.
País rico e pródigo para uns e tão duro e miserável para muitos mais, este nosso.
Um beijo para ti do
Machado da Graça

Fonte: CORREIO DA MANHÃ – 12.03.2010 in Moçambique para todos

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