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sábado, junho 20, 2009

Comissão da verdade para o aparelho de Estado

Mas o patriotismo, a integridade, a entrega à causa de Moçambique e do Povo, e até a própria história, obrigam-nos a denunciar que tais ensinamentos de Mondlane não são inéditos. Para alguns (muitos) de nós eles foram anunciados no histórico dia 20 de Setembro do ano de 1974, aquando da tomada de posse do primeiro Governo da Nação Moçambicana, repetidos no Seminário Nacional que marcou o início do processo de escangalhamento do aparelho de Estado colonial e sua substituição por um outro de tipo novo, isto em 1976, e, rotineiramente, foram sendo invocados nas subsequentes etapas históricas marcadas sobretudo por ofensiva política e organizacional, ofensiva da legalidade nas forças de Defesa e Segurança, congressos, conferências e seminários nacionais, conselhos de ministros alargados, etc., etc.

Entretanto, julgo que mais do que a simples evocação dos nomes, a melhor forma de valorizar os nossos compatriotas tombados nas frentes do combate libertador e em defesa da Pátria consiste em aplicar no nosso dia-a-dia os valiosos ensinamentos que nos deixaram, fazendo com que estes produzam resultados palpáveis em tempo oportuno e de modo a acalentar as expectativas populares, ao invés de com eles alimentarmos discursos repetitivos, retóricos e absolutamente contraproducentes.

Então, que cada um de nós faça a sua parte o melhor possível, tendo em atenção que o bom dirigente é aquele que sabe fazer-se obedecer. Joaquim Alberto Chissano já o tinha dito: chega de discursos e lamentações, vamos aos actos. Sigamos o exemplo que é Ivo Garrido!

Ora, perante copiosos, ricos e tão clarividentes ensinamentos como os acima invocados, e admitindo a hipótese de que o nosso Estado sempre foi dirigido por moçambicanos patriotas, íntegros e com comprovada entrega à causa de Moçambique e do seu brioso Povo, talvez este seria o momento exacto para reflectirmos em conjunto, como povo, sobre a origem do matope que continua a emperrar o bom funcionamento da máquina administrativa do Estado:

Problema de mentalidades, de quem? Do simples funcionário cujo dever é cumprir leis e ordens superiores, ou de alguns dirigentes a todos os níveis da acção governativa, que aparentemente pouco ou nada fazem para imprimir métodos correctos e científicos de direcção, combater o burocratismo, o desleixo e sobretudo a incompetência, através da punição severa dos seus promotores e respectivos agentes?
Ou será que cometemos graves e imperdoáveis falhas no processo de selecção dos ditos patriotas, íntegros e devotos à causa de Moçambique e do Povo?
Constitui erro gravíssimo no âmbito da governação do país passarmos anos a fio a implorar que o funcionário público mude de mentalidade, quando a mentalidade deste não pode estar fora e muito menos ser diferente daquela que consta das respectivas leis laborais que as abraçou com o juramento solenemente feito no acto da tomada de posse.
Assim sendo, e se na verdade não queremos continuar a «saborear a palavra problema», então temos que, urgentemente, encontrar antídotos enérgicos e de rápida acção que nos salvem da interminável lamentação perante o já famoso espírito de “deixa-andar” e outras práticas indecentes que só persistem graças à nossa condescendência!

É que vezes sem conta recorremos ao uso e abuso da vozearia para transmitirmos a ideia ou a impressão de que há muita coisa que está a mudar, quando logo a seguir a realidade revela-nos precisamente o contrário, posto que contra factos não há argumentos. Os compatriotas que tiveram a ocasião de escutar as críticas populares feitas no programa radiofónico “Café da Manhã” sobre a Reforma do Sector Público, da semana de 1 a 7 de Junho de 2009, compreendem melhor a razão de ser do presente artigo de opinião. Os exemplos são ainda abundantes.

Senhora ministra da Justiça, será que a sua revelação estampada na primeira página do semanário “O País” de 28/5/2009 tem o significado de que durante este tempo todo alguém andou a enganar-nos que a PIC-Polícia de Investigação Criminal estava efectivamente a combater o crime, quando na verdade nunca esteve preparada para tal combate?

Então, fora da PIC, qual é o órgão do Estado que desde os primórdios da independência nacional nos vem defendendo dos criminosos?

E porque é que perante tamanha constatação cria-se o «Serviço de Investigação Criminal» quando, pela lógica, parece que melhor seria a criação de Serviço Anti-Crime, ou então Serviço de Investigação e Combate ao Crime (SICOCRIM)?

É que investigar por investigar, julgamos que tanto investiga a actual PIC da mesma forma que passará a investigar o futuro SICRIM. Aliás, foi o mesmo Samora que na década oitenta disse que era ingenuidade mudar a água duma garrafa suja para outra limpa e pensar-se que por causa dessa mudança a água torna-se limpa!

Mas seja como for, só esperamos que daqui a mais alguns anitos não apareça outro alto dirigente do Estado a afirmar publicamente que a extinta PIC e o SICRIM são, afinal de contas, duas faces da mesma moeda...

Reiterando: tudo isto resulta da falta do exercício correcto do poder como consequência da forma aparentemente errada e discriminatória como organizamos a sociedade em defesa dos seus legítimos interesses. Democracia não é sinónimo de exclusão de determinados cidadãos no processo de direcção dos destinos da Pátria. E, embora o artigo 35 da Constituição da República de Moçambique seja bastante claro sobre esta matéria, o que parece, porém, é que a nossa prática diária na área político-administrativa é frontalmente contrária.

Mudemos já, visto que agora tudo indica que aquelas qualidades a que Mondlane, referia só as encontramos em concidadãos das «nossas» opções político-partidárias. É imperioso que também hoje admitamos, em todas as esferas e sectores da vida nacional, que ideias divergentes continuam a ser o motor do desenvolvimento das sociedades modernas.

Só assim é que podemos afirmar, com honestidade e convicção, que em Moçambique pratica-se uma governação inclusiva!

Com muita e profunda tristeza recordo-me que, como forma de contornar os efeitos nocivos da inércia reinante no sector da Justiça, salvo o erro do Estado nosso irmão de São Tomé e Príncipe, o respectivo Chefe foi ao extremo de convidar estrangeiros a proferirem sentenças devidas em vários processos pendentes, por notória incapacidade dos juristas nacionais.

Imaginem, caríssimos compatriotas!!!

Por tudo quanto acima expus, eu imploro, querido Presidente da República de Moçambique, a criação de uma espécie de “Comissão da Verdade” de âmbito nacional, encarregue de proceder a averiguação geral acerca do funcionamento do aparelho de Estado e propor medidas tendentes a moralizar a sociedade, bem como fazer com que cada moçambicano venha a sentir-se filho legítimo da mesma mãe-Pátria.

P.S. - Seria imoral e até acto de cobardia da minha parte se concluísse o presente artigo de opinião sem me referir ao atentado macabro e a todos os títulos condenável do dia 9/6/2009, na cidade de Nacala-Porto, contra o Presidente do partido MDM, Daviz Simango.

Deixem-nos falar; deixem-nos escrever; deixem-nos sugerir, agir e trabalhar - na paz e plena tranquilidade - para este Moçambique que é pertença de todos nós, independentemente dos feitos do passado de cada um.

Quando estivermos errados, pedimo-vos que nos corrijam, usando vias pacíficas como as acima indicadas. Mas nunca as da humilhação e brutalidade.

VIVA A PAZ!

JOÃO BAPTISTA ANDRÉ CASTANDE

Fonte: Notícias

Comentário: Sou fascinante das opiniões de João Baptista André Castande e eu gostaria que um dia me encontrasse com este ilustre.

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