Li em algum lado um comentário referindo ao dito julgamento aos jornalistas do Zambeze que na verdade é intimidação à imprensa. Os jornalistas fizeram um esclarecimento com evidências ou pistas que a Procuradoria-Geral da República deveria seguir para apurar a verdade. Agora quer a PGR nos mostrar que no país da marrabenta não se questiona a identidade e postura dos governantes e políticos.
O comentário que li deu-me a entender que é de uma pessoa que repete palavras dos outros, dispensando assim pensar mais sobre o quer dizer. Neste caso, o autor parece insistir que ao denunciar-se o caso da Luísa Diogo, estava-se a fazer um atentado contra a segurança do Estado. Por essa razão decidi trazer para este blog a carta de Machado da Graça a Alberto, publicada no Correio da Manhã aos 14 de Agosto de 2008.
Bom dia Alberto
Como estás tu e a tua família? Nós cá em casa estamos bem.
Mas, tenho que dizer, estamos preocupados.
E estamos preocupados por causa da notícia,publicada por um jornal local, de que o director e mais dois jornalistas do Zambeze foram levados a julgamento acusados, nada mais, nada menos, de “atentado contra a segurança do Estado”.
Quando li o título fiquei a pensar que os meus colegas Veloso, Nhachote e Alvarito se tinham metido ao mato, com armas nas mãos, para iniciarem uma sublevação armada contra o Estado moçambicano.
No mínimo que estavam a armazenar em suas casas explosivos e outros instrumentos próprios para uma série de atentados contra locais escolhidos.
Mas depois percebi que não. O crime horrível que eles tinham cometido, de acordo com a acusação, tinha sido pôr em causa a nacionalidade moçambicana da Primeira-Ministra, Luísa Diogo.
Logo aí me ficou a enorme dúvida sobre se pôr em causa a nacionalidade da Primeira-Ministra é um atentado contra a segurança do Estado.
A que propósito? O artigo saiu no jornal Zambeze e, que eu tenha notado, nada aconteceu ao nosso Estado. Nem a mais pequena beliscadura. Não houve motins nas ruas, não foi preciso decretar o estado de emergência, em resumo, não aconteceu nada.
Quando muito a própria dra. Luísa Diogo poderia instaurar um processo, a título individual, por se sentir ofendida. E aí teria oportunidade de demonstrar qual é, realmente, a sua nacionalidade e, se fosse caso disso, exigir uma indemnização.
Agora via a Procuradoria a abrir o processo por atentado contra a segurança do Estado é, a meu ver, mais uma desgraçada prova de que o nosso sector judiciário anda a reboque do poder político. E, ainda por cima, de forma muito pouco inteligente...
A própria rapidez com que o processo foi preparado e julgado é mais do que suspeita neste país em que casos bem mais importantes continuam enterrados no poço sem fundo do esquecimento, que existe ao fundo dos quintais dos nossos tribunais.
No assunto em questão, sobre a nacionalidade real da Primeira-Ministra, o jornal esgrimiu argumentos jurídicos. Não sei se certos ou errados, porque para tal me falta a preparação adequada.
A resposta apropriada deveria ter sido no mesmo campo: a argumentação jurídica. Era debruçando-se sobre o conteúdo das Leis da Nacionalidade (a da época da Independência e a actual) que se deveria ter debatido o caso. E, através de doutos pareceres, chegar a uma conclusão.
No momento em que te escrevo ainda não sei qual vai ser a sentença lavrada pelo juiz, Dr. João Carlos Peixoto. Mas o simples facto de ele ter realizado o julgamento à porta fechada, isto é, sem a presença de público, já cheira muitíssimo mal.
A que propósito veio esta atitude?
Até onde sei, os julgamentos só são feitos à porta fechada quando se receia que o público possa protagonizar distúrbios na sala ou quando se pensa que vão ser feitas declarações sobre questões secretas que não podem vir a público sem perigo para o Estado.
Dado o tipo da acusação e a manifesta pacatez dos réus o argumento deverá ter sido o segundo. E, portanto, ficamos com a sensação de que poderiam ser apresentados no julgamento factos perigosos para o Estado.
Quais seriam esses factos, Alberto? Não tens curiosidade? Eu tenho...
De qualquer forma esta coisa de julgamentos por crimes contra a segurança do Estado lembram-me sempre a malfadada PIDE, de tenebrosa memória.
Será que estamos a voltar para esse tempo?
Gostaria de ver as nossas autoridades judiciais a voltarem-se mais para questões de interesse público, que as possam dignificar, em vez de andar a fazer fretes ao Poder, o que só as emporcalha.
Tu não achas?
Um abraço para ti do
Machado da Graça
O comentário que li deu-me a entender que é de uma pessoa que repete palavras dos outros, dispensando assim pensar mais sobre o quer dizer. Neste caso, o autor parece insistir que ao denunciar-se o caso da Luísa Diogo, estava-se a fazer um atentado contra a segurança do Estado. Por essa razão decidi trazer para este blog a carta de Machado da Graça a Alberto, publicada no Correio da Manhã aos 14 de Agosto de 2008.
Bom dia Alberto
Como estás tu e a tua família? Nós cá em casa estamos bem.
Mas, tenho que dizer, estamos preocupados.
E estamos preocupados por causa da notícia,publicada por um jornal local, de que o director e mais dois jornalistas do Zambeze foram levados a julgamento acusados, nada mais, nada menos, de “atentado contra a segurança do Estado”.
Quando li o título fiquei a pensar que os meus colegas Veloso, Nhachote e Alvarito se tinham metido ao mato, com armas nas mãos, para iniciarem uma sublevação armada contra o Estado moçambicano.
No mínimo que estavam a armazenar em suas casas explosivos e outros instrumentos próprios para uma série de atentados contra locais escolhidos.
Mas depois percebi que não. O crime horrível que eles tinham cometido, de acordo com a acusação, tinha sido pôr em causa a nacionalidade moçambicana da Primeira-Ministra, Luísa Diogo.
Logo aí me ficou a enorme dúvida sobre se pôr em causa a nacionalidade da Primeira-Ministra é um atentado contra a segurança do Estado.
A que propósito? O artigo saiu no jornal Zambeze e, que eu tenha notado, nada aconteceu ao nosso Estado. Nem a mais pequena beliscadura. Não houve motins nas ruas, não foi preciso decretar o estado de emergência, em resumo, não aconteceu nada.
Quando muito a própria dra. Luísa Diogo poderia instaurar um processo, a título individual, por se sentir ofendida. E aí teria oportunidade de demonstrar qual é, realmente, a sua nacionalidade e, se fosse caso disso, exigir uma indemnização.
Agora via a Procuradoria a abrir o processo por atentado contra a segurança do Estado é, a meu ver, mais uma desgraçada prova de que o nosso sector judiciário anda a reboque do poder político. E, ainda por cima, de forma muito pouco inteligente...
A própria rapidez com que o processo foi preparado e julgado é mais do que suspeita neste país em que casos bem mais importantes continuam enterrados no poço sem fundo do esquecimento, que existe ao fundo dos quintais dos nossos tribunais.
No assunto em questão, sobre a nacionalidade real da Primeira-Ministra, o jornal esgrimiu argumentos jurídicos. Não sei se certos ou errados, porque para tal me falta a preparação adequada.
A resposta apropriada deveria ter sido no mesmo campo: a argumentação jurídica. Era debruçando-se sobre o conteúdo das Leis da Nacionalidade (a da época da Independência e a actual) que se deveria ter debatido o caso. E, através de doutos pareceres, chegar a uma conclusão.
No momento em que te escrevo ainda não sei qual vai ser a sentença lavrada pelo juiz, Dr. João Carlos Peixoto. Mas o simples facto de ele ter realizado o julgamento à porta fechada, isto é, sem a presença de público, já cheira muitíssimo mal.
A que propósito veio esta atitude?
Até onde sei, os julgamentos só são feitos à porta fechada quando se receia que o público possa protagonizar distúrbios na sala ou quando se pensa que vão ser feitas declarações sobre questões secretas que não podem vir a público sem perigo para o Estado.
Dado o tipo da acusação e a manifesta pacatez dos réus o argumento deverá ter sido o segundo. E, portanto, ficamos com a sensação de que poderiam ser apresentados no julgamento factos perigosos para o Estado.
Quais seriam esses factos, Alberto? Não tens curiosidade? Eu tenho...
De qualquer forma esta coisa de julgamentos por crimes contra a segurança do Estado lembram-me sempre a malfadada PIDE, de tenebrosa memória.
Será que estamos a voltar para esse tempo?
Gostaria de ver as nossas autoridades judiciais a voltarem-se mais para questões de interesse público, que as possam dignificar, em vez de andar a fazer fretes ao Poder, o que só as emporcalha.
Tu não achas?
Um abraço para ti do
Machado da Graça
De facto, a celeridade com que a Impresa vai aos tribunais é surpreendente, ainda que tenho ouvido algures que a lei assim determina.
ResponderEliminarNesta historia, apreciei a postura da classe jornalistica que até se reuniu para debater a questão. Gostei da postura do presidente honorario da Misa Moçambique, Salomão Moyana, que aproveitou a ocasião para explicar aos colegas como interpretar a lei em relação aos factos por estes narrados.
A intervenção peca por tardia, mas como diz o velho ditado, antes tarde do que nunca.
Aproveito a ocasião para dar a minha força aos jornalistas que demonstram não ter medo da verdade e que mais Cardosos se façam presentes pela sua voz na nossa sociedade.
Cara Ximbitane
ResponderEliminarPodes nos dizer em poucas palavras como Salomão Moyana explicou?
A classe jornalista faz algo e isso é muito bom.
A que raio de classe pertencem os jornalistas?
ResponderEliminarBom, Reflectindo, um exemplo foi o de que nao se deve falar da vida privada das pessoas a nao ser que a conduta destas ponham em causa o papel que desempenham na sociedade como é o caso do jovem que se apresentou ébrio num debate importante.
ResponderEliminarFalou também do que se considera segredo de estado e dos cuidados que se deve ter quanto a divulgaçao do que esta no segredo da justiça. Um dos exemplos foi de que se poderia dizer que fulano esta detido mas nao se poderia falar do conteudo do processo antes que fosse levantado o despacho de pronuncia.
Lamentavelmente nao domino os termos juridicos, mas com a liçao dada creio que muitos jornalistas poderão não incorrer a riscos por falta de conhecimento e uma espreitada as leis também nao lhes fara nenhum mal!
Quanto a si, anonimo, classe refere-se a um grupo e, no caso em apenso, aos jornalistas. Se estiver enganada, corrija-me!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarXimbitane, obrigado. Podes acreditar que eu não tinha percebido. Corri para todos os lados e a pequenina explicação que vi no Jornal Notícias foi interpretar Salomão Moyana ao sabor deles ou criar mais confusão. Agora fica claro para quem perdeu de ouví-lo em directo.
ResponderEliminarÉ pena que seja difícil contribuir como cidadão em Moçambique, porque a tendência é de alguns ouvirem apenas as palavras que lhes agradam, dispensando as que não lhes agradam por mais boas que sejam. Muitos evitam reflectir sobre as suas próprias falhas. Por essa lição de Moyana, já tenho muitas reflexões que postarei brevemente no blog.
Pode ser que esteja enganada, Reflectindo, mas foi com essa percepçao com que fiquei da explanaçao do Moyana. Os exemplos foram claros e a explicaçao muito simples, mesmo eu que sou leiga na questao entendi muita coisa.
ResponderEliminarXimbitane, da maneira que explicas não estás nada enganada. Espero que o meu post em relacão ao assunto ajude-nos a encontrar onde reside o problema de desconhecimento das leis. Veja que se a maioria dos mocambicanos conhecessem as leis também saberiam das faltas dessas leis, daí, sua melhoria.
ResponderEliminarHá muitos que nos aproveitam por sermos leigos nas leis, inclusíve, idade. Vim algures um comentário a falar da questão em causa, baseando-se na Constituicão da República de 1990 da qual tive a sorte de debater/estudar o anti-projecto. O caso deve-se explicar na base da Constituicão da República Popular de Mocambique de 1975 ou pelo menos comecar-se daí.
E, penso que em Mocambique temos que comecar por debater sobre a conduta de um dirigente.