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quarta-feira, dezembro 20, 2006

Governo de Guebuza prepara-se para “esquartejar” Cidade da Beira

Em vésperas de celebrar 100 anos

Se as intenções do governo central forem avante, a cidade deixará de ser a segunda mais importante do país e poderá também deixar de ter aeroporto

Secretário Permanente na Província de Sofala, António Máquina, confirma que “há acções em curso”, mas diz que “ainda é prematuro” dizer como vai ser

Beira (Canal de Moçambique) – O «Canal de Moçambique» está na posse de informações que indicam que o Governo de Moçambique, liderado por Armando Guebuza, está a estudar uma forma de “esquartejar” a Beira quando esta se prepara para celebrar o seu primeiro centenário, facto que ocorrerá a 20 de Agosto do ano que vem (2007). Todos os esforços tendentes a confirmar essas intenções ou desmenti-las, permitiram o «Canal de Moçambique» concluir que isso vai mesmo acontecer, havendo já acções em curso. O figurino, para justificar esta “afronta” àquela que sempre foi a segunda cidade do País, está em aberto, sendo várias as hipóteses que o governo central está a engendrar. A “revolta” local não está posta de parte, sentindo-se já no pulsar das suas forças vivas o velho sentimento que sempre mexeu com as pessoas daquela urbe e que faz com que, até hoje, a Beira seja conhecida como uma terra de “teimosos” e “intransigentes”, onde ninguém passa sem a resposta adequada quando se atreva a ferir a sua génese ou os seus interesses mais directos.

Se a intenção do Governo central for avante, a Beira poderá inclusivamente vir a deixar de ter aeroporto. Muito provavelmente o aeródromo internacional passará a fazer parte de outro espaço administrativo que venha a ser definido pelo governo central, ou de ouro distrito, ou do distrito do Dondo.

Confrontado com a possibilidade de o governo querer dividir a Cidade da Beira, o «Secretário Permanente» na província de Sofala, António Máquina, diz que “ainda é permaturo” pensar-se que isso vai suceder, porque “não é a província que decide”. Por outras palavras, a decisão será tomada em Maputo pelo Governo Central.

Aquela mesma figura do Estado na província de Sofala confirmou ontem ao «Canal de Moçambique» que “há acções em curso”, sob alçada do “Ministério da Administração Estatal”, para redefinir os limites territoriais e jurisdicionais de “vários” espaços administrativos do país, designadamente municípios, e que na província de Sofala serão abrangidos Marromeu, Dondo e Beira. Apenas nesses três espaços administrativos há municípios na província de Sofala.

Relativamente à província de Sofala, o Dr. António Máquina só se referiu a alterações geo-administrativas em Marromeu, Dondo e Município da Beira.

Marromeu

Marromeu é um distrito, mas a sua capital é um Município. Nas primeiras eleições autárquicas continuou sob controlo do partido Frelimo com figuras eleitas pelos munícipes locais, já não nomeadas pelo governo central. Nas segundas eleições autárquicas, em 2003, o partido da feição do presidente da República – primeiro Joaquim Chissano e agora Armando Guebuza – que tem vindo a formar o governo central desde a independência – perdeu a edilidade de Marromeu a favor do candidato da Renamo. A assembleia tem igual número de membros pelas duas bancadas: Frelimo e Renamo.


Dondo

O Dondo também é um distrito. A sua capital é Município. Passou, tal como a Beira, pelo mesmo processo, mas ali a Frelimo mantém a presidência do município e a maioria na assembleia municipal. Nas primeiras e segundas eleições autárquicas a Frelimo sempre venceu no Dondo.


Beira

O que é hoje a província de Sofala, antes da independência chamava-se Distrito da Beira. No tempo colonial, os espaços correspondentes aquilo que são hoje as províncias, designavam-se por distritos. E o que são hoje distritos, eram Conselhos. Beira era o nome de um Conselho do Distrito com o mesmo nome da cidade que corresponde hoje ao Conselho Municipal da Beira. Até à independência nacional foi assim. Depois, o distrito da Beira passou a designar-se por província de Sofala. A capital de Sofala, desde a independência nacional deixou de ter administrador de distrito e passou a ser governada por um “Presidente do Conselho Executivo” (ex-Câmara Municipal da Beira), até se criarem as 33 autarquias para a primeira experiência de autonomia municipal que passou a vigorar no país com a introdução da Lei 2/97. Daí em diante passou a haver Conselho Municipal da Beira e o Edil passou a ser eleito, bem como o executivo municipal passou a prestar contas a uma assembleia municipal também eleita pelos munícipes em eleições directas. As primeiras eleições autárquicas foram ganhas pela Frelimo com quem ficou também a maioria na assembleia municipal. O edil era então Chivavisse Muchangage que é agora administrador do distrito da Angónia, em Tete. Desde as segundas eleições autárquicas, a Assembleia municipal da Beira passou a ter como maioria absoluta a Renamo e por presidente o engenheiro Daviz Simango, o primeiro moçambicano com formação superior a ocupar tal cargo.

O actual presidente eleito do Dondo, Manuel Cambezo, já foi presidente da Beira, antes do Conselho ser municipal. Foi presidente da Beira quando o Conselho era Executivo porque designado pelo governo central.


Secretário Permanente em Sofala

Segundo António Máquina, secretário permanente em Sofala – província que é a única do país cuja capital está a ser governada pela oposição na Assembleia da República – “estão já no terreno técnicos” a estudar quais o caso e os futuros limites «geo-administrativos». “Estão em Marromeu, depois vão para o Dondo e depois vão para a Beira”.

Maquina dizia ontem ao «Canal» que “ainda é permaturo” dizer-se quais os “novos limites” dos novos espaços distritais e municipais de Marromeu, Dondo e Beira.

Relativamente à Beira, António Máquina confirma que “vai haver um administrador” e insiste em dizer que “as suas funções não vão colidir com as do município”. De várias formas tentámos perceber daquela personalidade como poderia ele saber disso se ainda não se sabe como vão ser os limites territoriais e administrativos. O secretário permanente do governo provincial disse apenas que “tudo irá ser feito com base na Lei 2/97”.

O secretário permanente em Sofala diz-nos que não pode enviar-nos o calendário do trabalho de campo “em curso” e a cargo dos técnicos, “porque não estou na Beira, nem próximo de um computador”.

A percepção com que ficámos depois de falar com António Máquina é de que o governo central está a fazer as coisas em segredo, forma já tida por alguns munícipes como sendo “para evitar a todo o transe envolver a população local no debate de modo a não implicar com a decisão que o governo central está a preparar”.


A divisão vai mesmo acontecer

De acordo com informações na posse do «Canal de Moçambique», a intenção do governo de Armando Guebuza é mesmo dividir a Cidade da Beira, continuando uma parte do actual território municipal a ser Conselho Municipal da Beira. A outra parte será desanexada para ser designada administrativamente de outra forma.

O «Canal de Moçambique» perguntou a António Máquina se iria ser criado mais um distrito em Sofala. Ele foi peremptório: “Não! Não vai haver mais um distrito em Sofala”. Já quando lhe perguntámos se o distrito do Dondo deixaria de terminar em Inhamizua para passar a terminar na Munhava, foi evasivo: “Não é a província que decide”.

Máquina acrescentaria que a acção que o governo central está a empreender para estabelecer novos espaços territoriais baseia-se na Lei 2/97, que especificamente diz respeito aos municípios. Ele disse também que a iniciativa é do Ministério da Administração Estatal e que abrange vários outros espaços do país.


Hipóteses em aberto

A parte que poderá vir a ser desanexada do que é hoje o território do Município da Beira, passará a ser um novo distrito ou deixará de ser Município da Beira para ser parte do distrito do Dondo. As duas hipóteses estão em aberto.

Na hipótese que tudo nos indica que irá vingar, a Beira vai ficar sem parte de si para ser Dondo. Para parecer que não é só na Beira que se vai fazer mexidas no seu território, vão ser também ensaiados uns toques nos limites de Dondo e Marromeu.


Aspectos a considerar

Com o que o Governo Central se prepara para fazer, há vários aspectos a considerar: Entre mais, automaticamente a Beira deixa de ser a segunda cidade do país, que sempre foi. Deixa também de ter aeroporto. A parte da norte da Baía junto à foz do rio Púngué e na faixa do Vale do Mandruze, no actual bairro de Inhamízua, passa a ser do Dondo ou do outro distrito que venha a ser criado entre a Beira que sobrar, e o distrito do Dondo.

O projecto ainda está em estudo, como afirma o secretário permanente do governo de Sofala, mas tudo indica que não terá recuo, a menos que os beirenses discordem e façam das suas para obrigar o governo de Guebuza a recuar na sua senda seccionante.

Mais objectivamente, a ideia com que o «Canal de Moçambique» ficou nas suas aturadas investigações e confirmadas por várias fontes, é que o governo de Armando Guebuza quer dividir a Beira a partir da Av. Kruss Gomes, na Munhava, Chota e toda a zona do Aeroporto até à actual confluência geográfica com o distrito do Dondo, fundir toda essa área com o distrito actual do Dondo e passar a designar tudo por distrito do Dondo. A vingar essa ideia, todos os terrenos da Munhava, Vaz, Mananga, Maraza, Chota, Muave/Aeroporto Internacional da Beira, Manga Mascare-nhas, Nhangau, Savane, Ndunda, Nhaconjo, Mungassa, Chingussura, Vila Massano, Alto da Manga e Inhamizua, de acordo com as intenções que o governo central está a engendrar, deixam de ser do Município da Beira e passam a ser zonas inseridas num distrito novo a designar-se por Beira e a criar entre o Município da Beira o simplesmente passam a ser do distrito do Dondo.

Confirmando-se a hipótese de todas essas áreas municipais que correspondem aos distritos urbanos n.ºs 2, 3, 4 e 5 dos actuais limites do município virem a ser desanexadas do que foi sempre a Beira, o Município ficará limitado a Pioneiros, Chaimite, Ponta-Gea, Esturro, Matacuane, Chipangara, Macurungo e Macúti. Nem a Manga sobra. Em suma: adeus Beira.


Questão adicional

As intenções do governo são já para serem implementadas em princípios de 2007, sem qualquer consulta popular. A decisão será pura e simplesmente administrativa.

A Renamo e o seu edil Deviz Simango, que são poder na Beira, eleitos por muitos dos munícipes das áreas que deixarão de ser Beira e passarão a ser Dondo ou um distrito novo a criar-se caso nada do que está a ser preparado tenha recuo, deixam de ter autoridade sobre as vastas áeras referidas. Simultaneamente o partido Frelimo passa de novo a geri-las sem mandato popular autarquico.

A Renamo e Deviz Simango só têm mandato para gerir o Município da Beira. No Dondo distrito o administrador é da Frelimo e nomeado. O edil da Cidade do Dondo e a maioria municipal, são ambos da Frelimo. Se a parte extorquida à Beira actual for para se constituir um distrito novo na província de Sofala, também automaticamente a Frelimo passa a ter gente de sua feição a decidir nessas vastas áreas, porque os administradores são nomeados e não eleitos.

Fontes próximas do partido Frelimo confirmam que toda a estratégia já em marcha para dar a estocada na Beira e foi discutida no 9.º Congresso realizado entre 10 e 15 de Novembro, em Quelimane.

(Fernando Veloso)


Canal de Mocambique (2006-12-20)

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